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Independência financeira ou ilusão de liberdade?

Por Gregório José, Jornalista, radialista e filósofo

19 SET 2024 • POR Da redação • 07h45
Caminhos da vida   Arquivo

No mês da nossa tão celebrada Independência, a Serasa nos brinda com uma pesquisa fresquinha que traça um diagnóstico de nossa autonomia... ou a falta dela. O Instituto Opinion Box conversou com 1.200 brasileiros, de todas as regiões e faixas etárias, para entender como andamos no quesito independência financeira. A resposta? Só 35% se consideram independentes. E o resto? Bem, o resto está aí, lutando para pagar as contas no fim do mês e sonhando com o dia em que os boletos deixarão de ser assombrações recorrentes.

Pagar as contas em dia e planejar gastos são os primeiros passos, certo? Ao menos é o que afirmam 48% dos entrevistados, que veem o ato de quitar as dívidas como um dos pilares dessa tal independência. Mas a ironia do nosso cotidiano não falha: 46% dos que se consideram independentes confessam que esse “sonho” os estimulou a contrair dívidas. Para muitos, a independência financeira acaba sendo um troféu de vidro – bonito de longe, mas fácil de quebrar.

Estamos brincando de independência com as regras de um jogo de tabuleiro sabotado. O brasileiro entra no mercado de trabalho, sai da casa dos pais, comemora o primeiro emprego ou a promoção, mas aí as contas chegam. E junto delas, a surpresa: autonomia? Não. É um convite ao endividamento. Somos um País em que a independência não se alcança, tropeça-se nela. E quase sempre com a cara no chão.

O brasileiro não sabe poupar, ponto. No Sudeste, 75% dizem que a independência financeira está a anos-luz de distância. E por que será? Porque controlar os gastos e planejar o orçamento são vistos como obrigações chatas, reservadas a um futuro incerto. Investir, economizar, planejar? Ah, isso fica para depois, quando der tempo ou quando sobrar dinheiro (spoiler: não vai sobrar).

E a pesquisa ainda oferece uma pitada de comédia trágica. Dos que conseguem sair de casa, casar, ter filhos ou se aventurar no primeiro emprego, muitos acabam nas mãos da dependência financeira. Isso sem contar os 49% que sentem culpa por ainda depender de alguém para pagar as contas. Culpa? É quase uma piada, como se viver no Brasil já não fosse um desafio financeiro diário.

Enquanto lá fora as economias funcionam em ciclos de crédito conscientes, por aqui, a gente ainda acredita que um carnê de 12 vezes sem juros é a chave para a liberdade financeira. E a “educação financeira”? Essa vai muito bem, obrigado... nos discursos, nas planilhas que ninguém usa e nos APPs que ninguém baixa.

Os brasileiros continuam a lutar pela sua independência financeira, mas, na prática, estamos todos jogando um Monopoly com regras que ninguém explica. E como já diriam nossos avós, o barato sai caro. O caminho para a autonomia exige mais do que pagar contas em dia. Demanda disciplina, planejamento e, quem diria, um pouco de sorte. Afinal, no país do “jeitinho”, ser financeiramente independente é, por enquanto, apenas um sonho para muitos e uma realidade frágil para poucos.