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ARTIGO Lazer saudável como alternativa às bets Promessa de ganhos fáceis pode parecer atraente, mas comportamento ao longo do tempo gera ciclos de endividamento, agravando a situação de vulnerabilidade 11 OUT 2024 • POR Mariana Cerone Head de Marketing e Produtos da Up Brasil • 07h06

O lazer sempre ocupou um espaço central na vida humana, atuando como válvula de escape e uma maneira de expressar nossas identidades culturais. 

Na visão de Pierre Bourdieu, o gosto por determinadas formas de entretenimento reflete não só preferências individuais, mas também posicionamentos sociais e culturais, influenciados pelas estruturas de poder e classe.

Essa análise é relevante quando observamos o crescimento alarmante das apostas on-line no Brasil.

O interesse cada vez maior da população por jogos de azar, como as bets, não é apenas uma questão de entretenimento.

Trata-se de um reflexo de um cenário social e econômico que empurra milhões de pessoas para uma busca desesperada por soluções rápidas para seus problemas financeiros.

A promessa de ganhos fáceis pode parecer atraente, mas a realidade é que esse comportamento ao longo do tempo gera ciclos de endividamento, agravando a situação de vulnerabilidade.

E vamos lembrar que, mais ou menos um ano atrás, estávamos aqui discutindo sobre as lives NPC e agora o que vemos nos jornais é o nível de endividamento por conta dos jogos de azar. Coincidência? Diria que não.

Mas tem algum jeito de revertermos isso? Antropologicamente, o lazer saudável deveria contribuir para a coesão social, promovendo bem-estar e fortalecendo os laços comunitários.

O filósofo e sociólogo Roger Caillois reforça a ideia de que o jogo, quando em sua forma mais pura, deve ser uma experiência lúdica, em que o prazer e o desenvolvimento cognitivo e social estão no centro.

No entanto, 
o lazer transformado em uma busca incessante por lucro, como vemos no caso das bets, desvirtua esse propósito, levando ao isolamento e à angústia.

O impacto desse fenômeno de curto prazo já é evidente nos números crescentes de endividamento, porém, a médio/longo prazo, as consequências se espalham por diversos setores da sociedade: desde a redução do consumo em áreas essenciais até o aumento da pressão sobre os sistemas de saúde mental e assistência social.

De acordo com informações divulgadas pelo Banco Central sobre o mercado de jogos de azar e apostas on-line no Brasil, aproximadamente 24 milhões de pessoas físicas participam de jogos de azar e apostas no País e 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família destinaram R$ 3 bilhões às casas de apostas virtuais somente em agosto.

Dados como esse mostram que a espiral de dívidas não afeta apenas o indivíduo, mas compromete também 
o futuro das famílias e do próprio tecido social.

Promover um lazer saudável que privilegie a cultura, o esporte e atividades que gerem valor a longo prazo é fundamental para mudar essa trajetória.

Em vez de buscarmos saídas rápidas e arriscadas, precisamos refletir sobre como nossos padrões culturais de consumo de entretenimento podem ser repensados, a fim de fomentar uma sociedade mais equilibrada e menos suscetível a armadilhas financeiras.

O entretenimento tem o poder de libertar ou destruir, dependendo de como escolhemos vivê-lo.

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