Em meio a uma operação pente-fino com o objetivo de diminuir gastos públicos, Mato Grosso do Sul segue registrando aumento nos valores disponibilizados para pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), com um incremento de R$ 17,874 milhões neste ano. A estratégia de revisão de benefícios previdenciários é uma das principais apostas da equipe econômica para equilibrar as contas.
Dados do Portal de Transparência do governo federal mostram que, em janeiro deste ano, foram liberados R$ 141,875 milhões para pagamento dos benefícios no Estado, enquanto, em setembro, o valor saltou para R$ 159,750 milhões, um aumento porcentual de 13,11%, o que representa um montante de quase R$ 18 milhões.
Ao observar o painel, é possível verificar que, nos nove primeiros meses deste ano, o gasto com o BPC segue aumentando mês após mês.
De janeiro a setembro, não foi registrado nenhum decréscimo nos valores disponibilizados: em fevereiro, foram R$ 143,236 milhões destinados para os benefícios em Mato Grosso do Sul; em março, R$ 143,749 milhões; em abril, R$ 144,989 milhões; em maio, R$ 146,166 milhões; em junho, R$ 148,221 milhões; em julho, R$ 158,191 milhões em julho; e em agosto R$ 158,717 milhões.
No total, foi contabilizado R$ 1,344 bilhão de janeiro a setembro deste ano, ante R$ 1,125 bilhão no mesmo período do ano passado, um aumento de 19,46% ou R$ 219 milhões.
A advogada previdenciarista Juliane Penteado explica que o BPC é pago às pessoas acima de 65 anos, aquelas consideradas idosas, e também às pessoas com deficiência que estejam incapacitadas para exercer uma atividade laboral.
“As pessoas idosas, assim como as pessoas com deficiência, devem comprovar uma vulnerabilidade econômica, e essa renda deve ser calculada com base na renda familiar, então, se uma família tem quatro pessoas e uma delas já recebe uma renda, ela vai ser dividida por quatro pessoas, se a renda per capita, por cabeça, superar um quarto do salário mínimo, ela, em tese, estaria excluída do requisito”, detalha a advogada, ao esclarecer como é feita a análise para o acesso ao benefício.
Juliane pontua que a oscilação no número de benefícios pode ocorrer em função da variação de renda em uma mesma família.
“Dois idosos, por exemplo, podem receber, cada um, um valor de BPC, uma vez que a renda de um não pode impactar a renda do outro, desde que até um salário mínimo”, relata.
A advogada exemplifica ainda que pode acontecer de duas pessoas com deficiência na mesma residência também receberem o benefício no valor de um salário mínimo, mesmo que a de um deles seja uma aposentadoria ou uma pensão, desde que não ultrapasse um salário mínimo.
Juliane complementa destacando que, apesar de não poder afirmar com exatidão se a tática do governo de diminuir os gastos com o benefício está funcionando, acredita que o aumento das pessoas que se encontram em vulnerabilidade e a falta de condições de familiares em manter os gastos possa impactar o cenário.
“Provavelmente, a falta de emprego, a falta de trabalho bem remunerado é uma situação muito maior, muito mais ampla do que a questão da tática do governo. É uma questão social”, afirma Juliane.
Vale destacar que até julho deste ano, último dado divulgado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), havia um total de 105.779 benefícios registrados, entre benefícios temporários e BPCs, em Mato Grosso do Sul.
PENTE-FINO
Conforme publicado pelo Correio do Estado, em julho, o INSS instituiu um processo de revisão do Benefício por Incapacidade Temporária, o antigo auxílio-doença, e do Benefício de Prestação Continuada. Segundo o governo federal, a força-tarefa visa realizar perícias em todo o País até o fim deste ano, podendo impactar 105.779 beneficiários de Mato Grosso do Sul.
A ação, que foi anunciada pelo ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, no início de julho, com a pretensão de checar a validade dos benefícios, principalmente os que contam com vigência extensa, visa coibir fraudes, além de contribuir com a agenda de revisão de gastos obrigatórios.
Para este ano, a expectativa do governo é de economizar R$ 10 bilhões, principalmente com despesas do INSS. No entanto, a dois meses do fim do ano, a economia obtida com os benefícios previdenciários representa apenas cerca de 40% do total previsto no País. Para o próximo ano, o governo projeta uma redução de R$ 25,9 bilhões em gastos obrigatórios, com foco no INSS novamente.
Ainda conforme a Previdência Social, o chamamento será realizado de forma gradativa, visando não gerar filas nos pontos de atendimentos.
Ao Correio do Estado, Juliane Penteado explica que o pente-fino na verdade é uma tática que está prevista em lei, uma vez que o BPC é um benefício que a cada dois anos tem de ser revisto.
“Há uma previsão legal para essa situação. E o objetivo do governo é avaliar se as pessoas que estão recebendo ainda permanecem com esses requisitos. Então, se a concessão do BPC de uma pessoa foi a questão da deficiência, vai ser analisado se a deficiência permanece, se houve mudança na renda familiar, e tudo isso tem de ficar registrado no Cadastro Único”, frisa a advogada.
Economista-chefe da corretora Warren Rena e ex-secretário da Fazenda de São Paulo, Felipe Salto disse, em entrevista ao jornal O Globo, que o pente-fino é positivo e deve continuar para combater as fraudes, que são inaceitáveis. Mas pondera que essa agenda é permanente e está aquém do esperado este ano.
“Em 2024, colocar-se uma proposta a título de combate às fraudes que, a julgar pelos números realizados até agora, não se materializaram. A revisão de gastos é algo mais amplo para combater fraudes. Deveria se referir a revisões efetivas de programas ruins, que não estão gerando o resultado pretendido originalmente. Nisso, entendo que ainda há pouco avanço”, avalia Salto.
(Colaborou Súzan Benites)