Gestor interino da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul (FFMS), Estevão Antonio Petrallás falou ao Correio do Estado sobre os sete meses à frente do futebol sul-mato-grossense e deu um alerta para os presidentes de clubes: “O dirigente que vive como viúva vai ser ultrapassado”.
Interino no posto, o ex-presidente do Operário Futebol Clube assumiu a entidade após a saída de Francisco Cezário, investigado na Operação Cartão Vermelho e suspeito, junto de outros nomes, de desviar R$ 6 milhões da FFMS entre 2018 e 2023.
De lá pra cá, a tentativa da nova gestão é reformular o futebol local, seja esportivamente, seja economicamente, na missão de angariar novos patrocinadores, reestruturar o suporte aos clubes, os gramados e os estádios para reacender a paixão no coração dos torcedores sul-mato-grossenses.
“O dirigente que fica agindo como viúva, só olhando o que aconteceu para trás, não vai evoluir, vai ser ultrapassado”, disse.
Petrallás deve ficar no comando da FFMS, ao menos, até a próxima eleição, que acontecerá em abril. Confira.
O senhor pode falar um pouco sobre a sua entrada na Federação, fato que aconteceu após denúncias de corrupção envolvendo o ex-presidente Francisco Cezário? Como que a FFMS estava quando o senhor assumiu?
Inicialmente, para explicar um pouquinho esse processo, houve uma operação denominada Cartão Vermelho pelo Gaeco [Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado], e nós tivemos de uma forma muito surpreendente essa realidade do futebol. Essa discussão toda passava pelos dirigentes, mas a parte administrativa da federação os dirigentes não tinham o acesso.
Na sequência, enquanto um dos sete vice-presidentes eleitos, fui convidado para a CBF para conhecer a estrutura da CBF, não sabia qual era a missão a princípio, mas fomos para o Rio de Janeiro. Então, a partir de junho, de fato, volto para cá nomeado interinamente como vice-presidente em exercício da interinidade. E vou promover a eleição em breve, justamente para poder, se Deus quiser, legitimar esse mandato. Lógico que o que passou não contribuiu positivamente.
Nós sabemos que isso aí foi realmente um atraso, um prejuízo enorme, mas como eu falei ontem em uma reunião com os prefeitos em Aquidauana e Anastácio, é o momento da retomada, é o momento de nós buscarmos a credibilidade. É difícil? É. Mas eu acho que nesse momento todo mundo tem que imaginar uma somatória de ações. Nisso eu coloco um pouquinho do meu crédito. A Federação vive um outro momento, não tenha dúvida. Existia na chegada nossa à CBF primeiro um receio, que é esse período em junho, quando nós recebemos a incumbência de voltar para MS e encaixarmos de volta nos trilhos o futebol sul-mato-grossense.
Nesse período de seis meses, nós atendemos quase 386 jogos. Eu não gosto de fazer muita comparação com o que tinha antes, porque eu não participava como dirigente da Federação. Fui até o fim de 2022 presidente do Operário Futebol Clube, onde conseguimos ter a credibilidade, retirar as certidões do clube, deixei arrumadinho nessa situação. Também acho que isso me credenciou junto à CBF para que eu pudesse ser um dos possíveis escolhidos.
Nós somos sete colegas [vice-presidentes eleitos], e cada um foi criteriosamente avaliado por meio de um departamento que a CBF chama de compliance. E chegando lá, para a nossa surpresa, o convite era justamente para nos designar de forma interina, como estou até hoje, inclusive.
Quando você chega lá, essa decisão já está tomada?
Eu recebi um convite através do diretor jurídico [da CBF] para que me apresentasse para o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, eu não o conhecia. No fim da reunião, eu fui convidado para a sala dos presidentes das federações, onde eu fui nomeado interinamente.
No início, houve um manifesto de algumas pessoas que eu entendo como viúvas de um sistema que existia, e a gente não quer jamais ser unânime. Eu acho que aos poucos a gente vai construindo um trabalho solidificado, e você precisa aos pouquinhos cada vez mais se dedicar, principalmente para atender os clubes.
Os filiados tinham uma distância muito grande da gestão, da administração, e eu tenho justamente essa particularidade. Sem desprezar ninguém, mas com um pouquinho de falsa modéstia, eu passei as dificuldades que hoje os dirigentes passam. Então, buscando oxigenar, com reciclagem, com simpósio, com encontros, criamos aqui na FFMS uma academia que justamente pensa nessa evolução da gestão interna dos clubes.
Essa abertura, essa forma de estar mais disponível a todos, no primeiro momento, eu apanhei muito. A imprensa ainda não tinha isso claro, era uma expectativa do que eu fazia. Alguns clubes, de uma forma maldosa, diziam: “Ele é, ele é presidente do Operário e vai beneficiar o Operário”. O [clube] que menos tem benefício aqui hoje é o Operário. Porque a gente não está aqui pra provar contra ou a favor de A ou B, e eu trato da mesma forma todo mundo.
Essas viúvas foram, aos poucos, se distanciando, muitos perceberam que estavam sendo iludidos por uma história. Você administra a paixão das pessoas, do corintiano, do flamenguista, aqui do operariano, agora do Futebol Clube Pantanal, que é Portuguesinha, carinhosamente chamada. O Comercial poderia estar agora nessa Série A, seria com certeza um engrandecimento enorme para o futebol. A gente vai se preocupar com os filiados o tempo todo.
E aí vem uma promessa para a Série B deste ano, que é no segundo semestre praticamente, que este ano foi realizado com cinco, que eu cheguei e já tinham essas cinco equipes confirmadas, nós queremos fazer com doze [clubes], pelo menos, para que você possa fortalecer a Série A.
A minha ótica, em primeiro momento, é a categoria de base. Se não formar um atleta de base e dar mais minutagem, mais tempo para ele jogar, não é fazer competição, sexta, sábado, domingo e encerrar. Agora terminou recentemente o Sub-17, 106 jogos, cada jogo tem estrutura de ambulância, segurança privada, gandula, maqueiro. A ambulância eles [clubes] não pagam, têm um convênio com o governo do Estado por meio da Fundesporte [Fundação de Desporto e Lazer de MS]. A federação veio com essa mentalidade de desonerar os grupos.
Como você define sua chegada à FFMS? Cenário de terra arrasada?
Eu preferi sempre caminhar de forma paralela, não confrontar. O Operário me deu uma condição diferente, porque eu sou presidente do Clube Campestre e o Operário estava lá dentro. Então, tinha, pelo menos, um teto, mas no momento que você tem um trabalho próximo à Federação, você precisa acompanhar o trabalho, não é só pegar papel e assinar.
Eu não atribuo essa culpa essencialmente ao presidente anterior. Eu vejo que o dirigente tem que começar a se preocupar também, porque o futebol evolui. Você vê, nós vamos começar a discutir daqui a uns dias a Sociedade Anônima do Futebol [SAF] em MS.
O senhor é adepto da SAF?
Eu sou no sentido de você poder acompanhá-la pelo seu clube, não entregar o departamento de futebol para o seu clube. É mais ou menos o que o Botafogo fez.
O Vasco já não deu certo. Então, não é uma receita pronta que vai chegar e vai resolver, mas é um incentivo que o governador [Eduardo] Riedel está possibilitando, através do Julio Brant, que veio do Rio de Janeiro, para que justamente pudesse, aos poucos, fazer com que os clubes possam analisar a possibilidade de se transformar.
Porque se ficar do jeito que está, você já sabe o resultado que vai dar. É uma tentativa para que você mude do cenário contábil jurídico, aí tem que entrar um pouco a parte do advogado e o contador de cada clube.
Por isso que eu digo, o dirigente que fica agindo como viúva, só olhando o que aconteceu para trás, não vai evoluir, ele vai ficar, vai ser ultrapassado naturalmente.Hoje, o Pantanal é o único clube que se habilitou nesse momento, e nada mais chegou em relação a isso para a Federação. Já um manifesto posso até adiantar tranquilamente para você, não é segredo que o Comercial pensa nisso.
O Grêmio Santo Antônio já se manifestou interessado nisso, aos pouquinhos vai acontecer, talvez não na velocidade que está acontecendo fora do campo, mas se já chegou em MS, essa discussão está passando por nós também.
Quanto da dinastia da antiga gestão vocês já conseguiram afastar nesse período trabalhado?
Ninguém veio aqui para fazer esquecer o passado, mas eu optei por olhar para frente, e tem gente que não quer avançar, tem gente que não vai mudar, tem gente que evolui, tem gente que sai fora do sistema. Eu quero trabalhar pelos que querem, com certeza, vencer, avançando para o lado positivo.
Vocês vão perceber algumas mudanças no [estádio] Jacques da Luz, no [estádio] Noroeste, em Aquidauana, e em breve lá em Coxim. A Federação está pondo a mão nos estádios para poder ajudar, ou é no vestiário, ou é no gramado, ou é na estrutura do estádio.
Eu estou andando, e não é política, é o mínimo que nós temos que fazer. Os que não querem, que eu chamei de viúvas, é o direito deles fazer a oposição. Agora, algumas vezes até de forma leviana, com comentários desagradáveis, inventando matérias, mas eu sou muito forte nisso, meu couro é grosso, não tenho receio de trabalhar, eu acho que o que vai desconstruir essa imagem que eles tentam colocar é justamente a construção pelo meu trabalho.
Como você vê a credibilidade da FFMS durante esse processo? De alguma maneira a credibilidade da Federação ficou abalada, seja com o governo do Estado, seja com as prefeituras municipais?
Eu vejo muito claro isso. No momento em que você passa a ter uma imagem ruim, ninguém quer bater foto do seu lado. Se a sua imagem está manchada, ninguém quer ficar com você. E ontem eu ouvi isso de um prefeito, especificamente o Mauro do Atlântico, em Aquidauana, dizendo: “Olha, eu percebo que o senhor passa segurança e credibilidade, o que nós não tínhamos antes”.
Ele não está falando do Estevão, ele está falando dos projetos que eu quero colocar com ele. Ele tem a intenção de reformar o Noroeste, como o prefeito de Anastácio tem a intenção de continuar construindo o estádio que ele já iniciou, e dessa forma, levar para todos os filiados, abrindo novas frentes, uma gestão diferente.
Particularmente acho que existe uma desculpa muito grande do empresariado de MS. Muitos vieram de fora, tornaram-se potências econômicas dentro do Estado, mas ficam com desculpas de não poder ajudar. Aqui ninguém pede dinheiro particular.
O apoio que a gente precisa para os clubes, principalmente da base e dos projetos sociais, norte que eu estou dando, é um outro caminho, que não são filiados, eles estão sendo credenciados pela Federação, são projetos de criança que não tem um cone, não tem um colete, não tem uma bola. Então, esses empresários precisavam ter um olhar um pouco mais social, não preocupado com a Federação, mas sim com os grupos. E eu tô emprestando essa credibilidade, não tenha dúvida disso.
A Federação adotou durante esse período ou vai adotar a partir de agora uma linha de compliance, justamente para garantir a lisura dos próximos contratos?
Até dezembro já está fechado, mês a mês é colocado ali [no site] à disposição. Agora, temos o estatuto da Federação, temos regra das assembleias. Muitos daqueles grupos que existiam hoje estão esfacelados, e a grande maioria já veio entendendo que é um outro cenário.
Se nós ficarmos reclamando, que não dá, que não vai mudar, que as coisas estão difíceis, aí nós temos que largar a mão do futebol, vamos cuidar da peteca, sem ofensa a outra modalidade, mas o futebol mexe com a paixão do povo, é uma responsabilidade muito grande.
Você imagina um dirigente, deixar a sua casa, deixar a sua família, para começar a trabalhar pelo clube dele, de maior ou menor expressão, mas com a responsabilidade social, porque ele já reúne filhos de outras pessoas. É esse sentimento e entendendo a dificuldade individual desse dirigente, essa aí é a bandeira principal nossa.
Como está a montagem do campeonato deste ano em relação à estruturação dos clubes, aos patrocínios recebidos pela FFMS para a realização do Estadual? O campeonato terá transmissão?
Dia 14, terça-feira, às 9h, no Bioparque Pantanal, nós vamos receber todos os dirigentes, tanto de ligas, de clubes amadores, clubes que estão na Série B e principalmente os 10 que vão fazer, com certeza, a maior competição dos últimos anos do futebol profissional. Estou muito animado.
[Sobre a transmissão], a TV Morena quer transmitir [com exclusividade]. Eu poderia simplesmente chegar aqui e falar nós vamos permitir, [mas] ninguém mais permite. É o contrário, você tem que abrir [para mais interessados]. A gente respeita a dimensão da Rede Globo, mas nós entendemos que, nesse momento, nós vamos de todos unidos. E não vejo a TV Educativa honestamente como uma ameaça na audiência da Rede Matogrossense de Comunicação. Não vejo, acho que cada um tem o seu público. A TVE vai transmitir os jogos de Campo Grande e provavelmente ao vivo, com um televisionamento normal pela rede da TV.
A Globo vai fazer pelo GE, pelo menos na proposta, vai transmitir alguns treinos, fazer alguma reportagem, vai divulgar a tabela, é importante que todos venham. Já estou há 30 dias negociando, ainda não formulei uma proposta para os dirigentes, porque eles vão ter que assinar junto comigo. Nós não chegamos nos últimos termos, que é permitir que alguns outros instrumentos possam transmitir os jogos.
Perfil - Estevão Antonio Petrallás
É um economista e servidor público aposentado. Durante sua carreira, desempenhou o cargo de diretor-presidente do Instituto Municipal de Previdência de Campo Grande (IMPCG). No âmbito esportivo, Petrallás foi presidente do Operário Futebol Clube entre 2014 e 2022.
Foi nomeado pela CBF como presidente interino da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul em maio do ano passado, após processos de corrupção envolvendo a gestão de Francisco Cezário.