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Ônus e bônus Ônus e bônus 20 AGO 2010 • POR • 05h22

Quando fazem alguma abordagem de suspeitos ou até mesmo quando trocam tiros na rua com bandidos, policiais militares são obrigados a ostentar o nome na farda, sob pena de sofrerem alguma punição. Se um professor não comparece ao trabalho, todos os alunos sabem seu nome e podem denunciá-lo às autoridades responsáveis para que as devidas medidas sejam adotadas, principalmente desconto no salário e reposição da aula perdida. Jornalistas, ao publicarem denúncias sobre corrupção, narcotráfico, má gestão de recursos públicos ou qualquer que seja o assunto ou quaisquer que sejam os envolvidos, normalmente colocam seus nomes ou sua imagem nas matérias. Engenheiros ou arquitetos colocam seus nomes em enormes placas responsabilizando-se por construções, pois se alguma delas ruir, terão de assumir as consequências. E, nenhum destes profissionais certamente está satisfeito com seus salários.
    Guardadas as devidas proporções e as características únicas de cada profissão, alguns médicos, porém, parecem que não estão dispostos a assumir o ônus de sua profissão, somente o bônus, que é a boa remuneração. Prova disto é o repúdio que o sindicato, a associação e  o Conselho de Medicina publicaram ontem contra projeto aprovado na Câmara da Capital no dia anterior prevendo que o nome de todos os profissionais de saúde que estiverem de plantão nos postos 24 horas da cidade sejam expostos ao público. A medida foi proposta e votada, segundo os vereadores, porque são comuns as faltas de médicos plantonistas no horário que deveriam estar no trabalho. As entidades alegam que a medida é desnecessária e expõe os profissionais à violência, já que alguns deles chegaram a ser alvo de pacientes e familiares insatisfeitos com a má qualidade ou a falta de atendimento em postos da cidade.
    No repúdio, as entidades alegam que a responsabilidade pela má qualidade deve ser assumida pelas autoridades das esferas federal, estadual e municipal, e não pelos médicos. Disto não restam dúvidas e tanto os vereadores quanto a população que procura os postos certamente sabe distinguir muito bem a diferença entre um problema crônico e estrutural de uma simples falta de um trabalhador que estava escalado e não compareceu. E, se não houver ninguém escalado em determinado horário, a lista certamente deixará isto claro, o que permitirá que os cidadãos consigam identificar se a responsabilidade pela lacuna é de algum profissional ou das autoridades que não estão dispostas a pagar salário condizente para que haja médicos dispostos a assumir a função. Porém, se o médico simplesmente não vai ao trabalho, é estranho que seus representantes queiram protegê-lo. Quem está insatisfeito com a remuneração deve pedir  as contas. E isto não chega a ser incomum, pois a maioria é responsável e cumpre  com seus compromissos.  Os constantes pedidos de exoneração são prova  disto. O temor com a medida aprovada na Câmara certamente atinge apenas uma parcela dos médicos. E, é a estes profissionais que conselho, sindicato e associação tentam, estranhamente, proteger. Se continuam no cargo e não vão ao trabalho, é impossível a contratação de substitutos. E, se simplesmente não comparecem, nada mais natural que a população tome conhecimento, pois são servidores públicos e não podem ficar acima do bem e do mal.