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Aos Papa Doc da América Aos Papa Doc da América 27 JAN 2010 • POR RAPHAEL CURVO • 22h28

O evento Haiti demonstra bem a situação do Estado brasileiro e sua reação ante os acontecimentos que exigem imediatas atitudes e ações. Atolado há anos no Haiti em busca de cadeira no Conselho de Segurança das Nações Unidas, sonho de gente vaidosa, o Brasil está colhendo conhecimentos de que não se brinca com coisa séria. Está claro que o amontoado de homens do nosso Exército e de outros países não representam eficiência na recuperação de povos politicamente e socialmente desestruturados. A nossa experiência mal dá conta de nossas favelas nos morros cariocas. A situação do povo haitiano mostra, de forma nítida e incontestável, que, na realidade, nada avançou. Mesmo com a presença da ONU como assistencialista, a desorganização social lá ainda impera. Isto acontece porque o planejamento desta organização está calcada em ações militares, de força e raras ações de qualificação de um povo, de desenvolvimento de culturas via educação e de técnicas agrícolas, industriais e comerciais via treinamento especializado. A agilidade da ONU deixou a desejar. Esta é a razão da rápida intervenção americana como forma de redução do eminente caos que se desenhava e de intensidade ainda maior que o próprio sinistro, dada a fragilidade de comando dos militares das Nações Unidas. O próprio piloto de uma aeronave militar brasileira disse, em noticiário, que o espaço aéreo estava um risco de enormes proporções, sem controle. O vexame de oferecer ajuda de 15 milhões de dólares foi de arrasar. Minutos após o evento sinistro, só de ver pela TV a situação de horror já se percebia que o Haiti tinha sido literalmente destruído. A nossa chancelaria não viu e menos ainda, não sentiu a imagem da desgraça. Somente após dias e percepção de que os Estados Unidos chegaram para valer é que o Governo brasileiro começou a entender que apenas discursos não resolvem. Chegou a ser tétrica a fala do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, anunciando que estava, após 6 dias do funesto evento, conseguindo liberar cinco milhões de reais dos US$ 15 mil. prometidos. Do momento que Barack Obama falou em doar 100 milhões de dólares, 24 horas depois 70 milhões já estavam disponíveis e 34 horas após, 10 mil homens a caminho do Haiti junto com dezenas de aeronaves, navios, equipamentos de resgate e por aí vai. Não quero falar da ridícula questão de “ocupação americana” alegada pela vaidade dos governantes de vários países, incluso o nosso. A verdade é que a ONU pisou no tomate. Foi frágil e inoperante no comando e na rapidez nas tomadas de decisões que o momento exigia. Da mesma forma agiram todos os países que formam o contingente de pessoas que estão lá para desenvolver ações de recuperação daquele país. E olha que o Haiti não é um Afeganistão, muito pelo contrário, na sua quase totalidade é formado por um povo pacífico, mesmo com todas as adversidades que vivem ao longo da história. A cena daquela criança resgatada foi de significado gigantesco em todos os sentidos. Ao sair daqueles escombros abriu os braços com alegria em sinal de vitória e louvação a vida, o que poucos sentem e menos ainda, compreendem. Parecia o Cristo que saiu da cruz. É bem provável que Ele estivesse com aquele menino naquele momento. Mostrou ao mundo que a vida vale muito, seja lá em que situação for. Será uma imagem inesquecível e purificadora. A imagem desse menino diz que ainda há esperança quando se quer ser solidário. Não é preciso existirem escombros para ter sentimento de cooperação e ajuda. Não é preciso desgraças como essa para fazer valer a chama da vida, da irmandade entre homens e povos. O Haiti é resultado de políticos populistas e personalistas. Eles é que deixaram a nação haitiana nessas condições paupérrimas. Este povo é o resultado das políticas de doação de bondades e pouca preocupação com a formação cultural e educacional da população. É o resultado do estímulo a ociosidade e a inércia de atitudes pelos donativos financeiros e o exercício de domínio pela propaganda e desrespeito as normas que devem vigir em uma sociedade bem estruturada e organizada. É o resultado deixado pelos governantes populistas à muitas gerações. É o preço pago pelos haitianos hoje e latinos americanos em breve, ao culto aos Papa Doc antigos e aos modernos da vida que lotam a América do Sul, de forma dissimulada e perigosa, principalmente nas suas falas. Ante o resultado da educação brasileira, 88º na avaliação da UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura, é de se pensar o que nos espera no momento em que começarmos a perceber que não estamos tão longe de um Haiti. Sinais já estão as claras em vários lugares. Alta porcentagem das mortes violentas no Brasil são praticadas por jovens entre 16 e 29 anos. Isto nada mais é que o resultado do sistema educacional brasileiro que não consegue romper, há décadas, com a inoperância e o marasmo. Não existe o fator inovação. Estão jogando gerações no lixo, assim como o Haiti jogou...