Sempre aprendemos a conceituar o meio ambiente como o conjunto do que nos rodeia, compreendendo o solo, o ar, a água, o espaço, os recursos naturais, a fauna, a flora, o homem, os animais e suas relações. Essa era mais ou menos a completa definição de meio ambiente. Nunca, em um passado não tão longínquo, imaginamos que um dia a evolução criaria um outro tipo de ambiente, e criou o ambiente on-line.
Esse novo ambiente desenvolveu uma inter-relação com os seres humanos no planeta de tal forma que o mundo ferveu, no bom sentido, e surgiu uma nova cultura, a cultura digital, que faz parte do cotidiano de quase todos os seres humanos, de grandes corporações, desde um simples vendedor ambulante, um catador de reciclável até a maior indústria da Terra, passando por religiões, política, governos, povos, enfim, em tudo e em todo lugar a cultura digital tomou o seu lugar e parece que nunca mais se afastará de nós. Então, cabe uma primeira pergunta, a cultura digital, o ambiente on-line, trouxe grandes benefícios ao homem? São indiscutíveis os benefícios. Basta dizer que o mundo mudou completamente depois da internet, das redes sociais, das plataformas, etc.
Tudo ficou mais fácil, mais ágil, e as demandas são resolvidas em um piscar de olhos. No solo, na água, no ar, no espaço sideral, a tecnologia ajuda o ser humano em todas as suas necessidades e, em muitos casos, um pequeno aparelho, geralmente de proporções de tamanho de menos de 5 cm de largura por menos de 20 cm de comprimento, usado basicamente de qualquer lugar na Terra, pode salvar vidas, agilizar grandes negócios, mover qualquer coisa interligada, acessar informações, conectar pessoas, enfim, o celular se tornou uma ferramenta tão importante para as pessoas que parece mais uma extensão de suas mãos. A psicanalista Vera Yaocomelli diz que “a internet é maravilhosa” e a compara com a capacidade que o homem “teve de produzir o fogo”. O fogo transformou a vida do homem depois que o conheceu.
Particularmente, não acho que o homem “produziu” o fogo. Acho que ele o descobriu, pois o fogo sempre veio do céu em forma de raios, desde a fundação do mundo, e um dia o homem descobriu. Mas, brindando a grande psicanalista, é realmente fantástica a internet. A gente já não vive sem ela. Ainda nas assertivas de Vera Yacomelli, uma segunda pergunta: o fogo fez e faz tão bem à humanidade, mas ele também queima, como ela diz em seu artigo para a FSP, e será que o queima vale a pena existir? A internet é o fogo que salva e que queima. Sim. Vale a pena esse fogo. Vale a pena a internet, a tecnologia, as redes sociais, os blogs, as plataformas, a cultura digital. Valem muito a pena. O que não vale a pena são as contradições verificadas na utilização do ambiente on-line. Essas contradições são o fogo que queima os benefícios da cultura digital.
Em meu livro “Adições & Contradições” (Life Editora, 2024), abordo a questão de como o homem produz tantas coisas boas em sua evolução, mas não consegue se livrar das contradições de suas criações, às vezes por inércia, outras vezes por imbecilidades, maldades e até mesmo por ingenuidades. Por exemplo, usar a internet para praticar fraudes, determinar assassinatos de dentro de presídios, usar o computador para disparar mísseis nas guerras, produzir fake news, semear violência, praticar a pedofilia, etc. A maldade não tem limites.
A cultura digital também fabricou zumbis humanos, que só seguem o que veem nas redes sociais. Já não raciocinam, não leem livros, trabalham com o olho no celular, dormem com o aparelho embaixo do travesseiro e até morrem, muitas vezes, na busca do melhor ângulo para a selfie. A dependência das redes sociais é tamanha que se assimila à de uma droga, e isso, evidentemente, não é bom.
As pessoas já quase não se reúnem fisicamente, já não sabem o valor de uma reunião em família, o valor de tomar um café e conversar amenidades, e, quando se reúnem, lá estará o celular, nas mãos e nos olhos, como um protagonista entre todos. Cidadãos digitais todos somos, mas deveríamos antes de tudo sermos cidadãos humanos, nessa cultura que transformou nosso meio ambiente em ambiente digital. Devemos voltar a viver no nosso antigo ambiente, ser gente!