Concorrem à vice-prefeitura nove mulheres e sete homens. Mesmo com a maioria sendo feminina, o número ainda é equilibrado – duas pessoas de diferença. Distância que se torna gritante em relação aos candidatos à prefeitura: são duas mulheres contra 13 homens.
Em Campo Grande, porém, elas são a maioria do eleitorado. São mais de 50 mil mulheres a mais que homens. A Capital tem 331.490 eleitoras (54%) e 280.997 eleitores (46%).
Entre intendentes nomeados e prefeitos eleitos democraticamente, a cidade teve cerca de 64 governantes em seus 121 anos de história. Somente uma dessas pessoas, Nely Bacha (MDB), que foi prefeita entre 14 de março e 20 de maio de 1983, era do gênero feminino.
No cargo de vice-prefeita, houve duas em Campo Grande. A primeira foi Marisa Serrano (PMDB), em 2005, e a segunda foi Adriane Lopes (PSD), em 2017, que concorre à reeleição neste ano, com Marcos Trad (PSD).
Apesar do baixo número, a taxa de mulheres candidatas aumentou no decorrer dos anos. Em 2008, Campo Grande teve duas mulheres e três homens como candidatos à vice-prefeitura; para prefeito foram quatro homens para uma mulher.
Em 1996, antes da popularização da internet e da criação das redes sociais e ainda das leis de incentivo que garantem a participação feminina na política, não houve candidatas aos cargos máximos no município. Foram cinco concorrentes à prefeitura, com seus respectivos vice-prefeitos, todos homens.
O mais longe que uma mulher chegou em uma eleição para prefeitura (Nelly Bacha foi nomeada) foi em 2016, quando a atual deputada federal, Rose Modesto (PSDB), perdeu no segundo turno para Marcos Trad.
REPRESENTATIVIDADE
O doutor em Ciência Política e professor na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) Daniel Estevão Ramos considera que a procura dos partidos por rostos femininos para ocupar o cargo de vice-prefeita pode ser uma tática para conquistar votos, pautados em um discurso de representatividade.
“Mas, por outro lado, duas observações precisam ser feitas. A primeira é de que a presença de mulheres não implica, necessariamente, em maior empoderamento ou autonomia. Nesse sentido, há situações nas quais a mulher está na chapa ou está concorrendo porque foi lançada pelo marido”, apontou.
Ramos argumenta que, nesses casos, trata-se mais de uma estratégia interna de expansão da influência de determinadas lideranças masculinas sobre os partidos e instituições do que um fortalecimento efetivo das causas sociais femininas.
Contudo, o pesquisador ressalta que não é possível afirmar que a única razão é expandir partidos e manter o poder sem haver preocupações ideológicas sobre igualdade de gênero ou respostas aos anseios e pressões sociais.
“Um segundo ponto é de que as mulheres candidatas a prefeita estão em partidos pequenos, com poucos recursos. O que realmente será necessário ficar de olho nessas eleições é a destinação e uso do fundo partidário, para evitar candidatas laranjas, como ocorreu em 2018”, completou.
PALAVRA DELAS
Cris Duarte (Psol) é uma das candidatas à prefeitura. Ela argumenta que não existe democracia sem a participação das mulheres e que Campo Grande repete o perfil dos candidatos do resto do Brasil.
“Para que as mulheres se interessem pela política institucional, elas precisam entender que esse também é um lugar para elas. Atualmente, elas não estão na gestão. Campo Grande, com 121 anos, não tem nenhuma deputada estadual, somente duas vereadoras, e na prefeitura não tem nenhuma mulher eleita. Somos a maioria da população, que anda de ônibus, que utiliza as Unidades Básicas de Saúde, somos nós que andamos nas ruas e sabemos quais não têm iluminação”, apontou.
A chapa de Duarte é totalmente feminina. Sua vice, Val Eloy, é indígena e, segundo o partido, se eleita, ocupará uma posição de coprefeita.
“Queremos mostrar para as mulheres que elas podem vir para a política institucional, podem e devem. Se melhorarmos as questões para as mulheres, vamos conseguir melhorar para toda a cidade”, concluiu Duarte.
Delegada Sidneia Tobias (Podemos) completa o quadro feminino na disputa à prefeitura da Capital nas eleições municipais de 2020. Ela defende que a falta de representatividade nos cargos do Executivo ocorre porque as mulheres possuem maiores dificuldades de entrar no ambiente político e que deveria haver mais estímulos.
“Creio que hoje nós temos mulheres capacitadas em condições de assumir qualquer posto, tanto no Legislativo quanto no Executivo. Mas a cota ainda não é suficiente, porque a mulher não foi despertada para a política ainda”, ressaltou.
A candidata disse que já percebe, nessas eleições, maior representatividade, mas que ainda é necessário maior participação feminina.
“Tudo se define na política: moradia, luz, segurança, alimentação, saúde e até o futuro dos nossos filhos. Então as mulheres precisam acordar para isso, é fundamental. Somos 54% do eleitorado e quase não temos mulheres eleitas”, acentuou.
INTERESSE?
O cientista social argumenta que não é possível acarretar a falta de participação das mulheres na política somente ao desinteresse.
“Se há um número baixo de mulheres na política, talvez não seja necessariamente desinteresse, mas falta de perspectiva. Por que se engajar em uma atividade sem recursos, sem treinamento, etc.? Penso que a participação das mulheres é o resultado de tudo isso, ideologia, interesse eleitoral e resposta à sociedade. Interesse não é algo natural ou inato”, relatou Ramos.
Ele concluiu dizendo que os partidos têm recursos, em sua maioria públicos, e organizações, como as fundações que são obrigados a criar e a manter para preparar seus quadros eleitorais. “O problema é que os partidos geralmente querem recrutar potenciais candidatos mais ‘prontos’, em vez de formá-los”.
LEGISLAÇÃO
A Lei nº 9.504 assegura que cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada gênero.
A mesma lei garante que o Tribunal Superior Eleitoral, no período entre 1º de abril e 30 de julho dos anos eleitorais, promoverá propaganda institucional em até cinco minutos diários em rádio e televisão, destinada a incentivar a participação feminina, dos jovens e da comunidade negra na política.
O TSE também obriga os partidos a direcionarem 5% do Fundo Partidário para as campanhas de mulheres. Em 2019, o órgão estabeleceu que a presença de candidatas laranjas – mulheres cadastradas como candidatas somente para alcançar as cotas separadas por lei – deve levar à cassação de toda a chapa.
Em Valença do Piauí (PI), por exemplo, seis mandatos de vereadores foram cassados em 2019 por terem sido eleitos em coligação com a presença de cinco candidatas mulheres que tiveram votação inexpressiva, não promoveram atos de campanha e não tiveram gastos declarados em suas prestações de contas.