“Apenas mais um capítulo”. Assim é tratada, pelo presidente da seccional sul-mato-grossense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Mansour Elias Karmouche, a tentativa do presidente do conselho federal do órgão, Felipe Santa Cruz, de conceder pensão vitalícia para um ex-chefe de gabinete da entidade, no valor de R$ 17 mil por mês.
“Não foi só isso. É uma série de posições tomadas pelo presidente Felipe Santa Cruz que vem causando essa situação. Ele tem claro alinhamento político, e questões básicas, como colocar em discussão a escolha direta para presidente da OAB, ele não faz”, disparou Karmouche. “É uma entidade que representa 1,3 milhão de profissionais”, completou.
As divergências, que vêm se agravando cada vez mais na OAB nacional, foram expostas recentemente na Coluna Cláudio Humberto, no Correio do Estado, apontando que, entre os principais nomes do conselho federal, Santa Cruz e Beto Simonetti são favoráveis à concessão da pensão, enquanto outros três são contra.
Os três advogados contrários ao privilégio são: o vice-presidente da OAB, Luiz Viana Queiroz; o diretor José Augusto Noronha; e o sul-mato-grossense Ary Raghiant Neto. “É só uma questão envolvendo um funcionário antigo. É uma discussão jurídica apenas, não tem racha, apenas uma discussão”, disse Raghiant Neto.
Contudo, o presidente da seccional sul-mato-grossense da OAB é mais incisivo nas críticas. “Essas divergências vêm se agravando porque o Felipe faz manifestações de cunho político. Me diz quando a OAB fez esse tipo de crítica que o Santa Cruz faz? A OAB não é nem de direita nem de esquerda”, afirmou Karmouche.
O presidente da OAB-MS ainda complementou: “Eu não vou ficar o dia inteiro criticando ou aplaudindo alguém porque não gosto ou gosto do gestor. Quando tem de fazer a crítica ou o elogio, você faz, mas dentro do que disciplina nosso estatuto. A OAB tem de se manifestar em pontos fora da curva e em defesa da ordem democrática, não entrar em discussões o dia inteiro”.
Felipe Santa Cruz é um ferrenho opositor do presidente Jair Bolsonaro, usando suas redes sociais para, constantemente, criticar o comportamento e o posicionamento de Bolsonaro e demais seguidores dele, denominados bolsonaristas.
O “duelo” entre Santa Cruz e Bolsonaro ganhou notoriedade em julho de 2019, quando o presidente reclamou da atuação do OAB para que o sigilo do advogado de Adélio Bispo, autor da facada em Bolsonaro, não fosse quebrado.
“Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto para ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Conto para ele”, afirmou Bolsonaro na época. Felipe é filho de Fernando Augusto Santa Cruz, desaparecido em 1974, após ter sido preso com Eduardo Collier por agentes do DOI-Codi.
VÍSCERAS EXPOSTAS
Mansour Elias Karmouche lamentou que toda essa situação fosse exposta da forma como foi, em razão do comportamento do presidente nacional da OAB e de seu posicionamento a favor da concessão de pensão para o ex-funcionário Paulo Guimarães, chefe do gabinete do ex-presidente Marcus Vinícius Furtado Coelho.
Alguns trataram a situação de Guimarães como a de um “arquivo vivo”. “Como presidente regional da OAB, lamento que vísceras da instituição tenham sido expostas, em razão da concessão de um benefício que já se revelou ilegal e inconsistente e que acabou indo para escrutínio da sociedade”, destacou Mansour.
Ele ainda reclama que não há embasamento nenhum para que, qualquer que seja o benefício, ele seja pago sem fundamento legal. “A própria OAB, inclusive, já tomou providências contra administradores públicos que tentaram criar algo semelhante”, explicou.
A reportagem tentou contato por telefone com Felipe Santa Cruz, contudo, nenhuma das três ligações realizadas foram atendidas. Também não houve retorno de nenhum dos contatos feitos até o fechamento do texto.