A relação de João Camargo com a televisão não é tão intensa quanto com os palcos. O ator, que atualmente encarna o divertido Haroldo em “Bela, a feia”, nunca teve vínculo longo com qualquer emissora. E, antes de ser escalado para a novela da Record, estava há sete anos marcando presença em quase todos os programas da linha de shows da Globo, mas sem um personagem fixo. “Eu não estava tão satisfeito com essa situação, mas aconteceu. Acho que essas fases são normais para quem não tem contrato longo”, minimiza. De volta ao ar, uma das coisas que mais surpreendem João é seu contato com os atores mais jovens que compõem, com ele, o núcleo do divertido salão de beleza Montezuma. “Dizem que os mais velhos têm de ensinar aos mais jovens, mas eu aprendo tanto com eles! São atores competentes e que trocam muito comigo”, elogia. “Bela, a feia” começou com um humor muito forte e agora já é considerada uma trama dramática com pitadas cômicas. Como você encarou essa mudança, tendo uns dos personagens mais engraçados da história? R – No início fiquei preocupado com essa transição, mas o Edson Spinello, que dirige a novela, conversou com os atores do núcleo do salão de beleza. No fundo, para nós, a mudança foi positiva. Funcionamos como um respiro para as cenas mais densas e, ao mesmo tempo, os personagens conseguiram ser ainda mais humanizados. No caso do Haroldo, por exemplo, a relação dele com a família aumentou. Passei a contracenar mais com o Bemvindo Sequeira, que faz o irmão do Haroldo, e com a Gisele Itié, que é o centro de tudo no papel da Bela. Isso foi bom. O Haroldo é um gay com características bem carregadas. Como é o retorno do público? R – É bem legal. A maioria das pessoas brinca com as situações cômicas que acontecem no Montezuma. Assim que recebi a sinopse, vi que não tinha como fazer o Haroldo diferente. A descrição dele era a de um homossexual cafona e deslumbrado, ele está ali para divertir as pessoas mesmo. E não acho que isso seja ruim para o público gay porque, ao longo dos capítulos, várias características humanas e admiráveis foram destacadas no personagem. Até mais do que a própria sexualidade, já que isso é só um dado, uma informação. Não existe um par romântico para ele ali, só a situação engraçada em relação a ele pegar no pé do Ícaro (interpretado por Rafael Primot). Você estava longe das novelas desde 2002, quando fez “Desejos de mulher”, na Globo. Como encarou voltar ao ar no papel de um gay? Tem medo que isso influencie escalações futuras? R – Não dá para dizer que não pensei nisso. Mas a gente não pode ficar com medo de trabalhar. Já fiz um homossexual antes, em “As noivas de Copacabana”, minissérie da Globo. Acho que isso é mais mito do que verdade. Logo depois que fiz os testes e estava praticamente fechado no elenco, a própria Record me chamou para fazer uma participação em “A lei e o crime” que não tinha nada a ver com gay ou com comédia. Não pude aceitar por uma questão de agenda, estava com outros compromissos no teatro, mas sei que pensaram em mim porque conhecem meu trabalho e não porque sou engraçado. Os produtores de elenco e diretores sabem o quanto sou capaz de representar papéis distintos e isso me tranqüiliza. O que fez você ficar fora dos folhetins por sete anos? Foi uma opção? R – Não. Durante esse período fiz muitas coisas na tevê, mas todas na linha de shows. Por exemplo, “Zorra total”, “Casos e acasos” e “Guerra & paz”, entre vários outros programas. Confesso que não estava muito satisfeito com isso, mas nunca tive contrato longo na televisão. Por isso, sempre me acostumei a batalhar por bons trabalhos nos palcos. E esse período rendeu frutos porque comecei a produzir espetáculos. Primeiro, com o “Fui”, junto com o Roberto Bataglin. Depois produzi e também dirigi “O filho da mãe”, da Regiana Antonini. Não fiquei tão preocupado em fazer novela porque já vivi sem ela, só cheguei à tevê depois de formado em teatro e com seis anos dedicados aos palcos. Mas é claro que a televisão traz uma segurança financeira e um reconhecimento que nem sempre o teatro dá.