As instituições filantrópicas, maioria no atendimento no País, funcionam à beira do precipício por motivos que passam por ingerência e problemas de repasse financeiro
Saúde é direito de todos, preconiza a Constituição. Infelizmente, é notório o quanto isso está longe da realidade. Embora haja mecanismos que, na teoria poderiam ser eficientes, na prática, vê-se o colapso do sistema público e como a conta é cada vez mais difícil de se fechar. As instituições filantrópicas, maioria no atendimento no País, funcionam à beira do precipício por motivos que passam por ingerência e problemas de repasse financeiro. Gestores e governo federal não chegam a um consenso sobre o impasse despesa/receita e, enquanto isso, é a população quem agoniza.
A Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) estima que aproximadamente 1,7 mil dos 2,1 mil hospitais operem no vermelho. A principal reclamação das administrações das entidades é que o Ministério da Saúde paga valor defasado pelos procedimentos via SUS. O deficit estimado é de R$ 5,1 bilhões por ano. A dívida que em 2005 era de R$ 1,5 bilhão, atualmente passa dos R$ 15 bilhões. Em entrevista ao jornal O Globo, o presidente da CMB reconheceu que a defasagem da tabela do SUS não é o único problema das entidades: há anos, as instituições têm dívidas altas e recorrem a empréstimos bancários para pagar salários e fornecedores. Como a verba proveniente do governo federal é carimbada, não pode ser usada para quitar os bancos.
Em Mato Grosso do Sul, a situação não é diferente. A Santa Casa de Campo Grande está na indesejável lista dos que gastam mais do que recebem. São R$ 160 milhões em dívidas. Segundo a gestão atual, o valor quadruplicou no período em que o hospital ficou sob intervenção judicial, de 2005 a 2013. Na tentativa de minimizar a situação, iniciou plano de contenção: desde o dia 10 de fevereiro, não atende mais à demanda espontânea, mas somente os pacientes encaminhados via Central de Regulação. Até o fim do ano, tem a meta é mudar os porcentuais entre privado e particular. Hoje, 90% dos atendimentos são por meio do SUS e os 10% restantes, privados (particular e plano de saúde).
A intenção é que o SUS represente 40% e o privado, 60%, mais ou menos o que é feito na Santa Casa de Maceió, tida como referência por não ter dívida milionária. Na capital alagoana, o hospital filantrópico não tem pronto-socorro e tenta equilibrar o deficit com convênios e consultas particulares. A cada dez pacientes, quatro são particulares ou plano de saúde, representando cerca de 65% da receita da instituição. Os outros 35% são bancados pelo SUS.
Deixar de atender via SUS, uma proposta que têm força entre administradores das Santas Casas pelo país, representa o colapso no sistema público. Para a população, qual seria a vantagem de se ter hospital que prioriza o paciente da rede privada e deixaria à mercê da sorte àqueles que não tem condições de arcar com os custos? Postos de saúde já demonstraram que não tem capacidade e, principalmente, não são destinados a atendimentos de alta complexidade. Negar o direito constitucional pode ser tiro no pé dessas entidades que pretendem dar primazia às contas do que ao atendimento.