Artigos e Opinião

ARTIGO

Maria Angela Coelho: "Quem tem tempo aí para vender?"

Professora Doutora em Comunicação e Semiótica

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Levanta a mão quem tenha um tempinho pra escambiar com alguém. Ninguém o tem. Moeda igualitária que todos recebemos, vale mais do que o dólar, do que o euro ... do que o Palácio de Versalhes! O tempo é a única moeda que, incompatível com o mercado, nos pertence; nos é dada e nos é tomada, muito além de qualquer possibilidade de interferência, gerência, pretensão e ganância de nossa parte. Moeda essa que costumamos desperdiçar, dia-após-dia; noite-após-noite, ao longo do nosso curto tempo de vida. Não, nós não temos tempo; é o tempo quem nos tem.  Belo-dia... bela-noite ... bela-hora, sem aviso prévio, sem mais nem menos – totalmente fora dos nossos propósitos – nossa sacola quedará vazia.

Hoje, consigo ver, em cada coisa que faço, um pedaço do meu tempo que se esvai; parte significativa das moedas que recebi; pedaços insuperáveis da minha vida. Tudo nos custará o desperdício e o desgaste de nosso valioso tempo.  Serão os filhos - cujos cuidados terceirizamos – que crescem, se criam ao largo e ao longe de nós; ausência, cuja consequência,  moeda nenhuma será capaz de resgatar, enquanto colocamos nossa única e real riqueza, ao pregão do mercado.

Há um filme fantástico, lançado em 2011, que nos faz refletir sobre os significados dos pequenos segundos com os quais se esvaem nossas moedas. Seríamos mesmo pessoas donas e senhoras do nosso tempo, e, por consequência, do nosso destino? Seríamos realmente livres e capazes de gerir esse único e legítimo capital depositado, diariamente, em nossa conta bancária da vida?

O filme Os Agentes do Destino (The Adjustement Bureau) foi baseado num conto de ficção científica, do gnóstico escritor Philip K. Dick (a.k.a PKD). O protagonista (Matt Damon) é um derrotado candidato ao senado. Enquanto amarga sua derrota, tem um encontro fortuito com Elise (Emily Blunt); vivem uma noite esplêndida, e, apaixonam-se. Toda a trama decorrerá com o intuito de demonstrar a luta que terão de travar, para se tornarem senhores do próprio tempo, e, por conseguinte, dos próprios destinos.

Os protagonistas não farão outra coisa do que tentarem enganar os agentes do destino; uma espécie de anjos, que farão de tudo para que esse romance não interfira no planejamento divino estipulado para que Davis venha a cumprir o que lhe era propósito de vida.  Fogem... fogem... fogem, tentando ludibriar a ação desses emissários divinos.  Capturado, descobre que a vida - nas mais comezinhas ações - é um percurso já traçado segundo os planos determinados. Assim, esses agentes seriam os responsáveis por impedir que seus tutelados tomem caminhos distintos do que já fora planejado .

Sem dar spoiler, o filme procura abordar a ideia de que, por não sabermos utilizar bem o nosso tempo, gerenciar nosso destino, necessitamos, ainda, de tutores, planejadores e supervisores que não nos deixem fugir do programa elaborado por, e, em instâncias maiores.

Buscando trazer, também, a mensagem de que sempre será possível obter-se uma abertura para  o (tão falado) livre-arbítrio, o filme não nos deixa pessimistas; muito pelo contrário, proporciona-nos bela reflexão. Valerá, inclusive, muito a pena refletir: (1) Porque, nos habituamos a gastar nossas moedas, dia após dia, esvaziando nossas próprias sacolas todas as noites, sem que nos perguntemos o que fizemos com o tempo que desperdiçamos? (2) Ou, o que fizemos com nossa única riqueza no dia que passou?

Fica a dica (do filme e do tema abordado): o tempo se esvai silenciosa e inexoravelmente, a cada segundo que passa. Afinal, quantas moedas ainda temos em nossas sacolas? Isso também ninguém sabe. Reflitamos, por conseguinte, se estamos tentando, inutilmente, vender nossas próprias moedas, trocando-as pelo vil metal!

EDITORIAL

É preciso passar um pente-fino na Cosip

O que a sociedade exige e com razão é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte

20/12/2025 07h15

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A deflagração da Operação Apagar das Luzes, nesta sexta-feira, pelo Grupo Especializado de Combate à Corrupção (Gecoc) do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), é mais um daqueles episódios que deixam claro que a iluminação pública de Campo Grande guarda muito mais sombras do que se imaginava.

E, ao que tudo indica, ainda há muito a ser revelado sobre contratos, cifras e responsabilidades envolvendo um serviço essencial para a cidade.

Campo Grande figura entre os municípios que mais arrecadam no Brasil com a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip). Trata-se de uma arrecadação robusta, bilionária ao longo dos anos, paga mensalmente pelo cidadão na conta de energia elétrica.

Ainda assim, a realidade vista nas ruas é contraditória: bairros inteiros convivem com postes apagados, avenidas mal iluminadas e áreas que se tornam vulneráveis à criminalidade justamente pela ausência de luz.

A investigação que apura fraudes estimadas em R$ 62 milhões lança uma pergunta inevitável: como é possível faltar iluminação em um município que arrecada tanto?

Reportagem publicada pelo Correio do Estado no ano passado mostrou que a Cosip de Campo Grande superava, à época, a arrecadação de Curitiba – cidade com mais que o dobro da população. Mesmo assim, a capital sul-mato-grossense convive com um serviço precário e reclamações recorrentes da população.

O mais preocupante é que essas suspeitas de irregularidades surgem em meio a um discurso constante de crise financeira propagado pela administração municipal.

Se confirmadas, as fraudes não estariam ocorrendo em um cenário de escassez, mas sim em um verdadeiro manancial de recursos. Isso agrava ainda mais o quadro, pois revela que o problema pode não ser falta de dinheiro, mas falhas graves de gestão, fiscalização e zelo com o dinheiro público.

É legítimo esperar explicações detalhadas sobre os contratos firmados, os critérios de pagamento e a execução dos serviços. Mas isso, por si só, não basta. O que a sociedade exige – e com razão – é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte, que deveria retornar em forma de ruas iluminadas, mais segurança e melhor qualidade de vida.

Nesse contexto, o trabalho do Gecoc merece reconhecimento. Mais uma vez, o MPMS cumpre seu papel institucional de investigar, cobrar respostas e iluminar áreas em que a administração pública falhou.

Combater a corrupção não é apenas punir culpados, mas também criar condições para que os serviços públicos funcionem melhor e com mais eficiência.

Iluminação pública não é luxo. É segurança, mobilidade e dignidade urbana. Se há dinheiro sobrando e luz faltando, algo está profundamente errado – e precisa ser corrigido com urgência, transparência e responsabilidade.

ARTIGOS

Redes sociais: o "estacionamento" da reputação corporativa

Qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial

19/12/2025 07h45

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No ambiente corporativo contemporâneo, a fronteira entre opinião pessoal e responsabilidade profissional se tornou quase invisível. Com a hiperconectividade, qualquer manifestação nas redes sociais tem potencial para alcançar ampla visibilidade. Um único comentário ofensivo de um funcionário é capaz de comprometer a confiança interna, afetar a reputação da marca e desencadear litígios.

Quando as manifestações de funcionários ultrapassam o limite da crítica construtiva e se convertem em acusações ou declarações com potencial de impactar negativamente a imagem e a credibilidade da organização, abre-se espaço a um debate essencial: qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial?

A repercussão, em casos como esse, costuma ser imediata. Colegas, clientes, fornecedores e demais parceiros têm acesso ao conteúdo, potencializando seus efeitos e ampliando o risco reputacional.

Qualquer que seja o caminho de resposta, a análise jurídica deve ser cuidadosa. A Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, alíneas j e k) prevê a possibilidade de dispensa por justa causa quando o empregado pratica ato lesivo à honra ou à boa fama de qualquer pessoa “no serviço”, especialmente quando dirigido ao empregador ou superiores hierárquicos.

A jurisprudência tem entendido que publicações em redes sociais podem produzir efeitos equivalentes aos de condutas praticadas no ambiente físico de trabalho, legitimando a aplicação da penalidade.

A Constituição Federal (art. 5º, incisos IV, V e X) assegura a liberdade de expressão, mas estabelece limites claros quando essa manifestação viola direitos relacionados à honra, à imagem e à dignidade. Já o Marco Civil da Internet reforça mecanismos de responsabilização de plataformas mediante notificação, permitindo respostas mais ágeis a conteúdos ilícitos.

Com a evolução da sociedade, a linha que separa opinião de ofensa se tornou cada vez mais tênue. A liberdade de expressão é garantida, mas não é absoluta: quando a crítica se transforma em injúria ou difamação, há quebra de confiança, podendo configurar justa causa, inclusive quando a conduta ocorre fora do expediente.

O desafio, agora, reside na interpretação. A definição do que constitui “crítica legítima” ou “falta grave” ainda é variável entre diferentes julgadores, o que aumenta o risco de reversão de penalidades, pedidos de indenização e danos à reputação corporativa.

Em um ambiente empresarial cada vez mais exposto ao escrutínio público, sobretudo nas redes sociais, torna-se imprescindível que as organizações adotem políticas claras, protocolos seguros de apuração e documentação robusta para fundamentar suas decisões e que as decisões e a gestão de tópicos sensíveis considerem estratégia, cautela e respaldo técnico.

Condutas inadequadas de colaboradores podem gerar impactos relevantes, mas a resposta empresarial deve estar alinhada à legislação e às melhores práticas de governança.

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