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Crônica de Raquel Naveira: "Meninas de rosa e azul"

Crônica de Raquel Naveira: "Meninas de rosa e azul"

Redação

07/11/2017 - 08h00
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É belíssima a coleção do Museu de Arte de São Paulo! Entre os vários retratos, o mais lindo para mim é sem dúvida o célebre quadro “Meninas de rosa e azul”, uma pintura em óleo sobre tela de 1881, do artista impressionista francês Renoir.

São duas meninas, duas irmãs, Elisabeth e Alice, filhas de um rico banqueiro judeu. Quase gêmeas, seis e cinco anos, posam de mãos dadas, trajando elegantes vestidos de renda, com faixas na cintura, uma rosa, outra azul, sapatos estilo boneca pretos, meias coloridas. 

Que delicadeza soberba! Parecem vivas, cheias de graça instintivamente feminina. A tinta gorda, esticada com pincel chato, deu volume e textura aos babados, brilho lustroso ao cetim.

Os rostos polidos assemelham-se à porcelana. A técnica do pontilhismo, vista de perto, cobre de pequeninos furos o entremeio dos franzidos.

A menina maior, Elisabeth, é loira, cabelos cacheados, transpira vaidade em azul. Alice é morena, tímida, os olhos marejados de lágrimas, o polegar seguro na tira rosa. Atrás, a cortina de veludo vinho lembra um palco que poderá se abrir. Com frescor e candura de infância materializam-se diante de nós.

O quadro foi descoberto por marchands, no início do século XX, esquecido no 6º andar de uma misteriosa casa da avenida Foch, em Paris. Sabe-se que Alice viveu até 89 anos. Já Elisabeth teve destino trágico: morreu a caminho do campo de concentração de Auschwitz, aos 69 anos.

Duas meninas, duas irmãs. Como eu e minha irmã. Raquel e Rita. Elisabeth e Alice. Violeta e Margarida. Teriam sido unha e carne? Parceiras de risos, segredos e sonhos? Teriam vivido em união e amor? Teriam se apoiado em todas as situações com   generosidade sincera? Sentiram a dor e a felicidade uma da outra? Ou a distância, as limitações, os desencantos as separaram ainda na juventude?

Será que tinham medo de escuro, acendiam o abajur, faziam preces juntas? Terão feito passeios pela lua e pelos planetas, observando os astros da janela do quarto? Pequenas feiticeiras, rodopiaram em meio a luzes e bolhas de sabão? Precisaram desapegar-se uma da outra?

Renunciaram ao convívio de irmãs por outras pessoas, ideais e lugares? Concederam-se mútua liberdade? Dedicaram-se à paz e à alegria daqueles que as amaram? Aceitaram a todos, principalmente a seus pais, como eles eram, exaltando suas virtudes e escondendo com uma capa suas falhas e defeitos?

Tiveram compaixão uma da outra? Perdoaram-se sempre com integridade cristalina? Que terá sido feito dessas meninas? Por quais caminhos andaram? Que foi feito de mim e de minha irmã? O destino é cruel com as parcerias e afetos.

Olhando “As meninas de rosa e azul”, penso que tenho alma de donzela e que cada uma delas mora dentro de mim. E que, às vezes, ainda seguro de longe a mão de minha irmã.

EDITORIAL

É preciso passar um pente-fino na Cosip

O que a sociedade exige e com razão é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte

20/12/2025 07h15

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A deflagração da Operação Apagar das Luzes, nesta sexta-feira, pelo Grupo Especializado de Combate à Corrupção (Gecoc) do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), é mais um daqueles episódios que deixam claro que a iluminação pública de Campo Grande guarda muito mais sombras do que se imaginava.

E, ao que tudo indica, ainda há muito a ser revelado sobre contratos, cifras e responsabilidades envolvendo um serviço essencial para a cidade.

Campo Grande figura entre os municípios que mais arrecadam no Brasil com a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip). Trata-se de uma arrecadação robusta, bilionária ao longo dos anos, paga mensalmente pelo cidadão na conta de energia elétrica.

Ainda assim, a realidade vista nas ruas é contraditória: bairros inteiros convivem com postes apagados, avenidas mal iluminadas e áreas que se tornam vulneráveis à criminalidade justamente pela ausência de luz.

A investigação que apura fraudes estimadas em R$ 62 milhões lança uma pergunta inevitável: como é possível faltar iluminação em um município que arrecada tanto?

Reportagem publicada pelo Correio do Estado no ano passado mostrou que a Cosip de Campo Grande superava, à época, a arrecadação de Curitiba – cidade com mais que o dobro da população. Mesmo assim, a capital sul-mato-grossense convive com um serviço precário e reclamações recorrentes da população.

O mais preocupante é que essas suspeitas de irregularidades surgem em meio a um discurso constante de crise financeira propagado pela administração municipal.

Se confirmadas, as fraudes não estariam ocorrendo em um cenário de escassez, mas sim em um verdadeiro manancial de recursos. Isso agrava ainda mais o quadro, pois revela que o problema pode não ser falta de dinheiro, mas falhas graves de gestão, fiscalização e zelo com o dinheiro público.

É legítimo esperar explicações detalhadas sobre os contratos firmados, os critérios de pagamento e a execução dos serviços. Mas isso, por si só, não basta. O que a sociedade exige – e com razão – é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte, que deveria retornar em forma de ruas iluminadas, mais segurança e melhor qualidade de vida.

Nesse contexto, o trabalho do Gecoc merece reconhecimento. Mais uma vez, o MPMS cumpre seu papel institucional de investigar, cobrar respostas e iluminar áreas em que a administração pública falhou.

Combater a corrupção não é apenas punir culpados, mas também criar condições para que os serviços públicos funcionem melhor e com mais eficiência.

Iluminação pública não é luxo. É segurança, mobilidade e dignidade urbana. Se há dinheiro sobrando e luz faltando, algo está profundamente errado – e precisa ser corrigido com urgência, transparência e responsabilidade.

ARTIGOS

Redes sociais: o "estacionamento" da reputação corporativa

Qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial

19/12/2025 07h45

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No ambiente corporativo contemporâneo, a fronteira entre opinião pessoal e responsabilidade profissional se tornou quase invisível. Com a hiperconectividade, qualquer manifestação nas redes sociais tem potencial para alcançar ampla visibilidade. Um único comentário ofensivo de um funcionário é capaz de comprometer a confiança interna, afetar a reputação da marca e desencadear litígios.

Quando as manifestações de funcionários ultrapassam o limite da crítica construtiva e se convertem em acusações ou declarações com potencial de impactar negativamente a imagem e a credibilidade da organização, abre-se espaço a um debate essencial: qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial?

A repercussão, em casos como esse, costuma ser imediata. Colegas, clientes, fornecedores e demais parceiros têm acesso ao conteúdo, potencializando seus efeitos e ampliando o risco reputacional.

Qualquer que seja o caminho de resposta, a análise jurídica deve ser cuidadosa. A Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, alíneas j e k) prevê a possibilidade de dispensa por justa causa quando o empregado pratica ato lesivo à honra ou à boa fama de qualquer pessoa “no serviço”, especialmente quando dirigido ao empregador ou superiores hierárquicos.

A jurisprudência tem entendido que publicações em redes sociais podem produzir efeitos equivalentes aos de condutas praticadas no ambiente físico de trabalho, legitimando a aplicação da penalidade.

A Constituição Federal (art. 5º, incisos IV, V e X) assegura a liberdade de expressão, mas estabelece limites claros quando essa manifestação viola direitos relacionados à honra, à imagem e à dignidade. Já o Marco Civil da Internet reforça mecanismos de responsabilização de plataformas mediante notificação, permitindo respostas mais ágeis a conteúdos ilícitos.

Com a evolução da sociedade, a linha que separa opinião de ofensa se tornou cada vez mais tênue. A liberdade de expressão é garantida, mas não é absoluta: quando a crítica se transforma em injúria ou difamação, há quebra de confiança, podendo configurar justa causa, inclusive quando a conduta ocorre fora do expediente.

O desafio, agora, reside na interpretação. A definição do que constitui “crítica legítima” ou “falta grave” ainda é variável entre diferentes julgadores, o que aumenta o risco de reversão de penalidades, pedidos de indenização e danos à reputação corporativa.

Em um ambiente empresarial cada vez mais exposto ao escrutínio público, sobretudo nas redes sociais, torna-se imprescindível que as organizações adotem políticas claras, protocolos seguros de apuração e documentação robusta para fundamentar suas decisões e que as decisões e a gestão de tópicos sensíveis considerem estratégia, cautela e respaldo técnico.

Condutas inadequadas de colaboradores podem gerar impactos relevantes, mas a resposta empresarial deve estar alinhada à legislação e às melhores práticas de governança.

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