Artigos e Opinião

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Do verniz da paz ao cotidiano do ódio

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Não sou o tipo de pessoa que vive nas redes sociais. Mas, como parlamentar, compreendi que estar presente nesse espaço faz parte do compromisso com a vida pública. Tenho me esforçado para estar mais presente e espero que quem me acompanha esteja percebendo isso.

O que mais me desafia é a exposição constante. A sensação de que cada pensamento precisa virar um post, cada opinião um conteúdo, de preferência impactante, para viralizar. Parece que o mundo exige uma atualização de feed por hora. Mas a vida real não funciona assim.

É nesse esforço de equilibrar o real e o virtual, o público e o privado, que os domingos se tornam um respiro. É quando assisto ao jogo do Botafogo, aproveito a família, leio as notícias com calma. Coisas simples. Com sorte, consigo olhar as redes sociais com mais leveza.

Ontem, por exemplo, com as homenagens às mães inundando as redes, o dia ganhou um peso diferente. Afeto por todos os lados. Palavras sobre amor, cuidado, gratidão... Foi impossível não pensar que toda pessoa pública também é filha ou filho de alguém. Por trás de cada nome de perfil há uma história, uma família, uma mãe que sente orgulho, medo, dor.

Nesse clima de afeto, algo me tirou o sossego. Como muitos sabem, a última semana foi difícil. Minha amiga e companheira de bancada, Camila Jara, compartilhou uma notícia dura: seu diagnóstico de câncer. Nos comentários das notícias repercutidas por jornais e sites, a solidariedade apareceu, mas também surgiu uma avalanche de comentários cruéis, desumanos, recheados de ódio. Não se trata de divergência política. Trata-se de uma falência ética.

A gente já sabe que toda comunicação é uma escolha. Podemos julgar ou compreender, atacar ou acolher, reagir com raiva ou responder com empatia. A paz não é um ideal distante, reservado a tratados internacionais. Ela começa no comentário que decidimos não fazer, na escuta que oferecemos, na empatia que cultivamos.

Não há justificativa para o ódio. Nem mesmo quando ele vem de quem já o propagou. O ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, foi um dos principais responsáveis por institucionalizar o discurso de ódio no Brasil. Mesmo diante disso, não acredito que o caminho seja retribuir na mesma moeda. Sou crítico de quem tripudiou do seu estado de saúde porque ódio não se paga com ódio. Nesse caso, eu desejo justiça, não vingança.

Não dá para lamentar a morte do papa Francisco, como vimos em tantas homenagens recentes – inclusive de setores que antes o criticaram por defender os pobres, os migrantes, os marginalizados – e, dias depois, ser capaz de tanta crueldade diante da dor de uma jovem com câncer. Ou diante de um protesto do MST. Ou de uma escolha política onde primeiro se agride para só depois tentar dialogar.

Essas contradições revelam algo profundo da nossa sociedade. Há quem use a linguagem da paz como verniz, mas continue alimentando o ódio no cotidiano. A paz não é um discurso bonito. É uma escolha diária. É o que fazemos quando ninguém está olhando. É a humanidade que preservamos, mesmo diante da divergência.

A crítica política é legítima, necessária. Mas precisa ser feita com responsabilidade. Quando atacamos alguém em um momento de vulnerabilidade, não estamos exercendo cidadania. Estamos abrindo mão da nossa própria humanidade. Se queremos um país mais justo, mais seguro, mais digno, precisamos começar por nós mesmos. A paz não virá de cima. Ela nasce nas nossas escolhas cotidianas.

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EDITORIAL

Santa Casa refém da própria má gestão

A Santa Casa precisa de mais do que socorros emergenciais: precisa de coragem para mudar, responsabilidade na gestão e respeito por quem sustenta sua missão

23/12/2025 07h15

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A situação vivida pela Santa Casa de Campo Grande ao fim de mais um ano é, infelizmente, a repetição de um roteiro conhecido – e previsível.

Há, pelo menos, uma década, o maior hospital filantrópico do Estado é vítima não apenas de um sistema público de saúde subfinanciado, mas, sobretudo, de escolhas administrativas equivocadas, da falta de planejamento e de uma gestão que parece incapaz de romper com seus erros históricos.

Neste fim de ano, o cenário chega a um ponto simbólico e constrangedor: a instituição depende, literalmente, de um milagre para pagar o 13º salário de seus funcionários.

Profissionais que sustentam o atendimento diário de milhares de pacientes, que enfrentam plantões exaustivos, superlotação, escassez de insumos e pressão constante, agora convivem com a angústia de não saber se receberão um direito básico. Isso não honra o nome “Santa Casa”.

Não há justiça social, não há moralidade administrativa e tampouco humanidade em deixar esses trabalhadores à mercê da incerteza.

É evidente que o problema não se resume à gestão interna. O subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é uma realidade nacional, e a Santa Casa, como tantas outras instituições filantrópicas, sofre com valores defasados, repasses insuficientes e atrasos frequentes.

O poder público tem, sim, parcela relevante de responsabilidade nesse quadro. Ignorar isso seria desonesto. No entanto, usar essa realidade como justificativa permanente para a ineficiência interna é igualmente inaceitável.

O que salta aos olhos é a aparente falta de disposição da administração do hospital em buscar eficiência, especialmente no campo financeiro.

Os números mostram que apenas o serviço da dívida – os juros e encargos pagos anualmente aos bancos – seria suficiente para quitar não apenas o 13º salário e evitar o acúmulo de outras obrigações em atraso, mas também de quitar quase toda a folha anual. Isso revela um modelo de gestão que prioriza a manutenção de passivos bancários em detrimento do compromisso com seus trabalhadores.

Mais uma vez, a saída apontada parece ser recorrer a novos empréstimos ou aguardar aportes emergenciais do poder público. Trata-se de um ciclo perverso. Endividar-se para cobrir despesas correntes, como folha de pagamento, não é uma estratégia de sustentabilidade; é um atalho para o colapso.

Empréstimos deveriam servir para investimentos, modernização, ganho de eficiência e redução de custos futuros – não para tapar buracos mensais de um caixa cronicamente desequilibrado.

O resultado é uma dívida cada vez menos saudável, maior dependência externa e nenhuma solução estrutural. Enquanto isso, a transparência sobre gastos, contratos e decisões estratégicas segue insuficiente, o que apenas aprofunda a desconfiança da sociedade e dos funcionários.

É lamentável que um hospital com tamanha importância social, histórica e simbólica chegue a esse ponto ano após ano. A Santa Casa precisa de mais do que socorros emergenciais: precisa de coragem para mudar, de responsabilidade na gestão e de respeito por quem sustenta a sua missão.

Sem isso, continuará sobrevivendo de milagres – e milagres, como se sabe, não fazem planejamento financeiro.

ARTIGOS

Terrorismo e religiosidade

Fundamentalismo dos terroristas de todos os matizes é antissemita, anticristão e anti-hislamista, porque se vale da inimizade aos valores religiosos para disseminar o ódio

22/12/2025 07h45

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A propósito do recente e trágico ataque ocorrido na Austrália, que vitimou diversas pessoas – algumas delas fatalmente – durante a pacífica celebração do Hanukkah, a festa das luzes da comunidade judaica, impõem-se algumas reflexões sobre os motivos e as consequências de tal ato.

À falta de definição mais apropriada, e sem entenderem bem o que teria motivado os ataques, aparentemente praticados por pessoas isoladas, os analistas chamaram a atenção para a facilidade com que se adquirem armamentos hoje em dia, fenômeno que ocorre também em nosso País.

É simbólico que a festa das luzes seja muito próxima dos festejos de Natal. Também no Tempo do Advento as luzes da coroa vão sendo acesas em crescente até que a Luz do Mundo venha a nascer na noite tão esperada pelos cristãos.

Jesus Cristo não selecionava ninguém. Qualquer pessoa seria bem acolhida por Ele, bastando que professasse o único mandamento propriamente cristão: ama o próximo como a ti mesmo. Aliás, o Cristo ia além e dizia: amai vossos inimigos, o que revela, igualmente, o modelo mais aberto de compreensão da pessoa do próximo.

Na verdade, o fundamentalismo dos terroristas – de todos os matizes – é antissemita, anticristão e anti-hislamista, porque se vale da inimizade aos valores religiosos para disseminar o ódio, a cultura de morte a que já se referia São João Paulo II.

Trata-se, portanto, do mesmo tipo de fundamentalismo que outros grupos de terroristas praticam para excluir as minorias de todo o tipo, mesmo as que não professem nenhuma crença.

É simbólico que tenha sido Ahmed, o sírio, a desarmar um dos terroristas, o que lhe custou dois ferimentos.

Esses terroristas disparam, inclusive pelos meios de comunicação virtual, contra todos aqueles que não pensam como eles. Eis quem são, em certo sentido, os verdadeiros fundamentalistas do ódio. Por que teriam escolhido a reunião do Hanukkah, tão plena de simbolismos?

Não nos prendamos a esse vetor. Basta atentar para os recentes ataques a uma mesquita e a uma feira natalina para que se ponha foco na essência do que está em jogo.

A enorme confusão ideológica e doutrinal do terrorismo revela, antes de tudo, mentes perturbadas, incapazes de discernir entre o bem e o mal. Ou, se quisermos embaralhar ainda mais as cartas, incapazes de discernir a esquerda da direita.

A confusão ideológica, aliás, não é apenas um sintoma de desordem mental, mas a estratégia consciente de aniquilar a pluralidade inerente à condição humana.

O extremismo, ao se apropriar de símbolos sagrados e transformá-los em bandeiras de exclusão, trai a própria essência de qualquer fé que pregue a transcendência e o amor ao Criador, pois desumaniza a criatura feita à sua imagem.

Desta forma, o verdadeiro combate ao terrorismo não se limita à repressão policial ou militar, mas passa necessariamente pela defesa intransigente da educação e do diálogo inter-religioso.

É a luz da razão e da tolerância que deve ser acesa para dissipar a escuridão do fanatismo, provando que a diferença de crença jamais pode ser motivo para a guerra, mas sim o motor para um enriquecimento mútuo da civilização.

Urge que os homens de boa vontade se ergam, em uníssono, em favor de uma cultura de paz e de liberdade religiosa, e que todas as luzes se acendam em alerta contra toda e qualquer manifestação terrorista.

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