Artigos e Opinião

OPINIÃO

Douglas Elemar: "Mulher no volante, preconceito distante!"

Professor e mestrando em Filosofia pela UFMS

Redação

16/03/2017 - 01h00
Continue lendo...

“Mulher no volante, perigo constante!” Quem nunca ouviu essa frase?  Eu, homem que sou, ouço-a desde pequenino. E o perigo de ouvir certas coisas desde pequeno é você crescer achando que o que ouviu é verdadeiro. Mas a vida, verdadeiro laboratório de erros e acertos, serve justamente para isso: pôr à prova coisas que se ouvem desde pequeno. 

Na semana em que se comemorava o Dia Internacional da Mulher, eu tive uma prova dessas – não que eu acreditasse nesse lugar-comum, “mulher no volante, perigo constante”, estúpido preconceito e erro mental, mas o fato que narrarei serviu como um tapa na cara com luva de pelica.

Era um sábado, meio-dia. E, como diria o velho Machado, “o sol estava a pino e o calor era de rachar passarinho”. Eu acabara de sair de uma valiosa reunião com professores e a direção de uma escola em que dou aulas de Filosofia e Sociologia para estudantes do Ensino Médio. Saio da escola, entro no carro e dou a partida. O telefone toca, era meu pai.

“Filho, me encontra aqui do lado de casa”. Meu pai, advogado aposentado, chamava-me para bebermos uma cerveja na conveniência que acabara de abrir ao lado da casa em que moramos. Presente também estava um tio meu, que, além de tio, é meu padrinho; ou seja, era eu à mesa com dois pais ao redor, o biológico e o voluntário. Conversávamos sobre coisas diversas. De repente, uma carreta gigante, um monstro motorizado, com placa de Cáceres, para ao lado da conveniência. A porta do motorista se abre. No banco do motorista, uma mulher com seus 30 anos, cabelos negros (como asa da graúna), shortinho jeans, blusa preta e, na boca, um rubro batom. 

Na hora, ficamos tão embasbacados como um gringo que visita o Pantanal pela primeira vez. A rotina colocaria ali um homem, 50 anos, rústico como um toco de curupaí, chapéu e bermudão jeans. Mas a rotina é traiçoeira. 

Ali estava uma mulher, exemplo mor de feminilidade. A impressão primeira era de que havia algo fora do lugar. “Como assim?”, perguntávamos dentro do nosso mais recôndito e profundo espanto (ou preconceito?). “Uma mulher? Na boleia de um caminhão?” – forçoso será dizer: doeu-nos o orgulho da costela removida.

Tudo foi muito rápido. Só deu tempo mesmo de ouvir a pergunta que ela nos fez. Queria saber onde ficava determinada rua. Dissemos onde ficava e como chegar. Ela agradeceu e fechou a porta do caminhão. Desceu rua abaixo levantando poeira. 

Os comentários foram inevitáveis. No fundo da nossa alma, chegávamos ao entendimento de uma frase que um escritor famoso dissera à época do atentado contra o World Trade Center: “Aquilo era real, mas não era crível”. O espanto se deu tão somente porque a experiência confrontou-nos com algo diferente daquilo que fomos induzidos a acreditar, a saber: mulher e direção não combinam. Mas o que não combina é o preconceito, o lugar-comum dos enunciados, que nada ensinam e só deturpam.

À parte a diferença entre o que se ouve e o que se vê, foi maravilhosamente divino ver uma mulher sentada à frente de um caminhão, símbolo mor da brutalidade e força, seguindo por esse Brasil de meu Deus. 

E como a vida gosta de esfregar em nossa cara, momentos depois passou uma outra mulher num carro. Mulher negra, professora guerreira. Era a diretora da escola onde dou aula. Acenei para ela. Ela olhou para mim, me reconheceu, levantou o braço esquerdo e acenou de volta.

EDITORIAL

Crises de fim de ano expõem falha na gestão

A raiz comum dessas crises é conhecida, embora frequentemente ignorada: mau planejamento, gestão ineficiente e falta de zelo por parte de quem executa

19/12/2025 07h15

Continue Lendo...

A virada para 2026 entra para a história recente de Campo Grande como uma das mais conturbadas dos últimos anos. Talvez desde meados da década passada não se via uma sucessão tão clara de crises financeiras e falhas na engrenagem dos serviços públicos locais justamente no momento em que a cidade deveria buscar estabilidade para atravessar o novo ano.

O problema não é pontual tampouco isolado: ele se repete em áreas essenciais e expõe fragilidades estruturais que vêm sendo empurradas com a barriga.

A greve do transporte coletivo, encerrada apenas no início da noite de ontem, é um retrato fiel desse cenário. Durante quatro dias, a população ficou refém de um sistema que parou porque o Consórcio Guaicurus não tinha recursos para pagar salários.

A solução não veio de uma gestão eficiente ou de um planejamento responsável, mas de um socorro emergencial do governo do Estado, que antecipou mais de R$ 3 milhões referentes a uma das parcelas do subsídio ao passe do estudante. Ou seja, o serviço só voltou a funcionar quando o dinheiro público entrou para tapar mais um buraco.

Situação semelhante se repete na Saúde. A Santa Casa, há anos em crise, agora está sob determinação judicial para apresentar um plano capaz de enfrentar um deficit que parece não ter fim. No transporte coletivo, a Justiça foi além e determinou uma intervenção no consórcio responsável pelo serviço.

Quando decisões judiciais passam a ditar os rumos da gestão, fica evidente que algo falhou muito antes, seja na formulação dos contratos, seja na fiscalização ou na condução cotidiana desses serviços.

A raiz comum dessas crises é conhecida, embora frequentemente ignorada: mau planejamento, gestão ineficiente e falta de zelo por parte de quem executa e, principalmente, de quem deveria fiscalizar contratos milionários. Não se trata apenas de escassez de recursos.

Trata-se de como esses recursos são utilizados, de modelos que se mostram esgotados e de contratos que não resistem ao primeiro choque mais sério.

O mais preocupante é que, mesmo após a injeção de milhões de reais do poder público na Santa Casa e no Consórcio Guaicurus, o dinheiro continua insuficiente. Isso deixa claro que o problema é estrutural.

As verbas estão, de fato, mais apertadas neste ano, mas a crise não nasceu agora. Ela é fruto de anos de escolhas erradas, de ausência de transparência e de tolerância com resultados ruins.

A virada de ano conturbada serve, portanto, como um alerta. Não basta apagar incêndios com aportes emergenciais, é preciso rever modelos, refazer contas, cobrar responsabilidades e, sobretudo, planejar com seriedade.

Caso contrário, Campo Grande corre o risco de transformar crises excepcionais em rotina permanente, e isso, definitivamente, a cidade não pode mais aceitar.

ARTIGOS

O combalido Congresso Nacional

A prática do corporativismo, dos conchavos, da legislação em causa própria, com um "orçamento secreto" que nada mais é do que um passaporte para a impunidade, aprovado na calada da noite

18/12/2025 07h45

Continue Lendo...

Para falar sobre o tema, não poderia deixar de citar uma frase célebre do ilustre brasileiro Ruy Barbosa, que foi político, jurista, advogado, diplomata e jornalista, nascido em 1849 e falecido em 1923.

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”.

Uma frase com cerca de um século de sua criação nunca foi tão atual, se comparada com os mórbidos acontecimentos vividos neste último período pela Câmara dos Deputados.

Fica evidente a prática do corporativismo, dos conchavos, da legislação em causa própria, com um “orçamento secreto” que nada mais é do que um passaporte para a impunidade, aprovado na calada da noite, propiciando a prática de atos ilícitos e imorais, travestidos de legalidade.

Deputados processados pelos mais variados tipos de crime, inclusive de lesa-pátria, incitando nação poderosa a invadir nosso país e a causar enormes prejuízos às classes produtoras e trabalhadoras, que geram as receitas que proporcionam a força necessária ao bom funcionamento da roda da economia.

Pior: parece que tudo o que vem acontecendo é encarado como fato corriqueiro pelo comandante da Câmara dos Deputados, que até chegou a ser deposto de sua cadeira por um grupo de parlamentares desordeiros e, até o momento, sem qualquer punição.

As telecomunicações alcançaram níveis impensáveis em termos de transmissão de dados, como imagens e sons de alta precisão, e, com isso, o planeta Terra tem assistido às barbáries ocorridas no plenário da Casa de Leis, habitada por um seleto grupo de homens e mulheres escolhidos pelo voto e que lhes proporciona os mais variados tipos de privilégios, consumindo recursos bilionários oriundos de pessoas físicas e jurídicas pagadoras de impostos, que não veem o necessário retorno em obras e serviços essenciais, como saúde, segurança pública e transportes.

Um fator preponderante para a continuidade desses desmandos é a hereditariedade nos cargos políticos, em que os ungidos não precisam provar capacidade técnica ou profissional para exercer um mandato.

Basta ter QI de força para manter em cabrestos os seus apaniguados, com nomeações que os tornam fiéis aos seus patrões e que, quase sempre, só deixam o cargo aposentados, com gordos salários, diferentemente do trabalhador brasileiro aposentado pelo famigerado INSS.

No ano que vem, teremos eleições majoritárias. É evidente que quem está lá não quer sair, mas está passando da hora de o cidadão consciente valorizar o poder de sua arma, qual seja, o Título Eleitoral, para promover a varredura necessária no Poder Legislativo, tanto federal como estaduais.

Por uma questão de justiça, a exceção se faz em relação aos parlamentares que reconhecidamente prestam bons serviços à comunidade.

NEWSLETTER

Fique sempre bem informado com as notícias mais importantes do MS, do Brasil e do mundo.

Fique Ligado

Para evitar que a nossa resposta seja recebida como SPAM, adicione endereço de

e-mail [email protected] na lista de remetentes confiáveis do seu e-mail (whitelist).