Artigos e Opinião

ARTIGO

Fausto Matto Grosso: "Paixão, política e cegueira"

Engenheiro civil, professor aposentado da UFMS

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Ultimamente, tenho ficado surpreso e assustado com a radicalização das pessoas. Todas são donas da sua verdade e ficam cegas à complexidade do mundo e das situações. Nesse contexto, a sociedade passa a ser dominada pela lógica amigo/inimigo.

Será que o brasileiro deixou de ser o “homem cordial” de que nos falava Sérgio Buarque de Holanda em “Raízes do Brasil”? 

A expressão “cordial” é comumente mal interpretada. Não significa, ao contrário do que se pensa, apenas bons modos e gentileza, virtudes muito elogiadas pelos estrangeiros. Cordial vem do radical latino cordis, isto é, relativo a coração. Ou seja, somos pessoas que, de fato, orientam-se mais pela paixão do que pela razão. 

Talvez a palavra mais adequada devesse ser sentimental e não cordial. O próprio Buarque chamava a atenção: “A inimizade bem pode ser tão cordial como a amizade, visto que uma e outra nascem do coração”.

A rapidez com que o brasileiro passa do caráter amável para a hostilidade seria uma das fortes características do nosso povo. As reações de amor e ódio têm provocado nas ruas e nas redes atitudes que desconhecem os limites do que é civilizado.

Para ampliar nosso entendimento, talvez devêssemos nos socorrer, também, em Zygmunt Bauman, especialmente em “O Mal-Estar da Pós-Modernidade”. Segundo o sociólogo, vivemos com uma sensação de que algo está errado com a humanidade. O mal-estar social é resultado de algo instalado na consciência do homem atual como uma angústia, que o faz viver como um peregrino sem rumo histórico.

Assinala ainda que a sociedade contemporânea vive um sentimento de fracasso por não alcançar a tão almejada felicidade. As utopias se desmancharam no ar, as ideologias coletivas se fragmentaram em aspirações individuais. 

As questões da nossa identidade enquanto povo, combinadas com os sinais dos novos tempos, talvez expliquem os fenômenos políticos que temos assistido no Brasil.

Nos últimos anos, especialmente após a campanha presidencial, temos convivido com uma onda de ódio e discriminação jamais vista em nossa história. Fake news, calúnias injúrias e todo tipo de palavrões marcaram esse período. Esse tempo está mostrando os sentimentos “cordiais” de intolerância e de falta de polidez no nosso convívio social.

Quem seguiu as redes sociais e os programas eleitorais se deu conta dos níveis baixíssimos de respeito mútuo e de falta de sentido democrático de convivência com as diferenças. 

Após as eleições, o clima não se desanuviou, muito pelo contrário. O pior é que o próprio presidente, e seu entorno familiar e ideológico, milita diretamente nessa radicalização. 

O reposicionamento internacional do Brasil tem sido feito de maneira desastrosa, implicando em potenciais prejuízos para a nossa economia. A questão ambiental das queimadas na Amazônia demonstrou a insensibilidade do governo com a questão ambiental. A poluição das nossas praias mostrou um governo despreparado para lidar com crises. As reações quanto às mudanças políticas e eleitorais na América Latina têm sido desastrosas e apontam para o nosso isolamento. 

As ações políticas do governo normalmente tem se processado fora da institucionalidade, com o uso irresponsável das redes sociais, que lhe conduziram, inclusive, a um vergonhoso puxão de orelha pelo Supremo. 

Enquanto isso, o País vive sobressaltado à espera do que pode vir a acontecer com a institucionalidade democrática. Essa preocupação parece se estender, também, à cúpula das Forças Armadas, que aparentemente não está seduzida pelo entorno ideológico do presidente Jair Bolsonaro. Nesse clima, tem predominado a teoria da conspiração que tem induzido seus seguidores a posições extremadas e ingênuas.

Hoje, cada um tem a sua própria narrativa, o que lhe é de direito, mas é impossível cada um ter seu próprio fato. A paixão política tem conduzido o brasileiro à cegueira e o País à incerteza.

EDITORIAL

Santa Casa refém da própria má gestão

A Santa Casa precisa de mais do que socorros emergenciais: precisa de coragem para mudar, responsabilidade na gestão e respeito por quem sustenta sua missão

23/12/2025 07h15

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A situação vivida pela Santa Casa de Campo Grande ao fim de mais um ano é, infelizmente, a repetição de um roteiro conhecido – e previsível.

Há, pelo menos, uma década, o maior hospital filantrópico do Estado é vítima não apenas de um sistema público de saúde subfinanciado, mas, sobretudo, de escolhas administrativas equivocadas, da falta de planejamento e de uma gestão que parece incapaz de romper com seus erros históricos.

Neste fim de ano, o cenário chega a um ponto simbólico e constrangedor: a instituição depende, literalmente, de um milagre para pagar o 13º salário de seus funcionários.

Profissionais que sustentam o atendimento diário de milhares de pacientes, que enfrentam plantões exaustivos, superlotação, escassez de insumos e pressão constante, agora convivem com a angústia de não saber se receberão um direito básico. Isso não honra o nome “Santa Casa”.

Não há justiça social, não há moralidade administrativa e tampouco humanidade em deixar esses trabalhadores à mercê da incerteza.

É evidente que o problema não se resume à gestão interna. O subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é uma realidade nacional, e a Santa Casa, como tantas outras instituições filantrópicas, sofre com valores defasados, repasses insuficientes e atrasos frequentes.

O poder público tem, sim, parcela relevante de responsabilidade nesse quadro. Ignorar isso seria desonesto. No entanto, usar essa realidade como justificativa permanente para a ineficiência interna é igualmente inaceitável.

O que salta aos olhos é a aparente falta de disposição da administração do hospital em buscar eficiência, especialmente no campo financeiro.

Os números mostram que apenas o serviço da dívida – os juros e encargos pagos anualmente aos bancos – seria suficiente para quitar não apenas o 13º salário e evitar o acúmulo de outras obrigações em atraso, mas também de quitar quase toda a folha anual. Isso revela um modelo de gestão que prioriza a manutenção de passivos bancários em detrimento do compromisso com seus trabalhadores.

Mais uma vez, a saída apontada parece ser recorrer a novos empréstimos ou aguardar aportes emergenciais do poder público. Trata-se de um ciclo perverso. Endividar-se para cobrir despesas correntes, como folha de pagamento, não é uma estratégia de sustentabilidade; é um atalho para o colapso.

Empréstimos deveriam servir para investimentos, modernização, ganho de eficiência e redução de custos futuros – não para tapar buracos mensais de um caixa cronicamente desequilibrado.

O resultado é uma dívida cada vez menos saudável, maior dependência externa e nenhuma solução estrutural. Enquanto isso, a transparência sobre gastos, contratos e decisões estratégicas segue insuficiente, o que apenas aprofunda a desconfiança da sociedade e dos funcionários.

É lamentável que um hospital com tamanha importância social, histórica e simbólica chegue a esse ponto ano após ano. A Santa Casa precisa de mais do que socorros emergenciais: precisa de coragem para mudar, de responsabilidade na gestão e de respeito por quem sustenta a sua missão.

Sem isso, continuará sobrevivendo de milagres – e milagres, como se sabe, não fazem planejamento financeiro.

ARTIGOS

Terrorismo e religiosidade

Fundamentalismo dos terroristas de todos os matizes é antissemita, anticristão e anti-hislamista, porque se vale da inimizade aos valores religiosos para disseminar o ódio

22/12/2025 07h45

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A propósito do recente e trágico ataque ocorrido na Austrália, que vitimou diversas pessoas – algumas delas fatalmente – durante a pacífica celebração do Hanukkah, a festa das luzes da comunidade judaica, impõem-se algumas reflexões sobre os motivos e as consequências de tal ato.

À falta de definição mais apropriada, e sem entenderem bem o que teria motivado os ataques, aparentemente praticados por pessoas isoladas, os analistas chamaram a atenção para a facilidade com que se adquirem armamentos hoje em dia, fenômeno que ocorre também em nosso País.

É simbólico que a festa das luzes seja muito próxima dos festejos de Natal. Também no Tempo do Advento as luzes da coroa vão sendo acesas em crescente até que a Luz do Mundo venha a nascer na noite tão esperada pelos cristãos.

Jesus Cristo não selecionava ninguém. Qualquer pessoa seria bem acolhida por Ele, bastando que professasse o único mandamento propriamente cristão: ama o próximo como a ti mesmo. Aliás, o Cristo ia além e dizia: amai vossos inimigos, o que revela, igualmente, o modelo mais aberto de compreensão da pessoa do próximo.

Na verdade, o fundamentalismo dos terroristas – de todos os matizes – é antissemita, anticristão e anti-hislamista, porque se vale da inimizade aos valores religiosos para disseminar o ódio, a cultura de morte a que já se referia São João Paulo II.

Trata-se, portanto, do mesmo tipo de fundamentalismo que outros grupos de terroristas praticam para excluir as minorias de todo o tipo, mesmo as que não professem nenhuma crença.

É simbólico que tenha sido Ahmed, o sírio, a desarmar um dos terroristas, o que lhe custou dois ferimentos.

Esses terroristas disparam, inclusive pelos meios de comunicação virtual, contra todos aqueles que não pensam como eles. Eis quem são, em certo sentido, os verdadeiros fundamentalistas do ódio. Por que teriam escolhido a reunião do Hanukkah, tão plena de simbolismos?

Não nos prendamos a esse vetor. Basta atentar para os recentes ataques a uma mesquita e a uma feira natalina para que se ponha foco na essência do que está em jogo.

A enorme confusão ideológica e doutrinal do terrorismo revela, antes de tudo, mentes perturbadas, incapazes de discernir entre o bem e o mal. Ou, se quisermos embaralhar ainda mais as cartas, incapazes de discernir a esquerda da direita.

A confusão ideológica, aliás, não é apenas um sintoma de desordem mental, mas a estratégia consciente de aniquilar a pluralidade inerente à condição humana.

O extremismo, ao se apropriar de símbolos sagrados e transformá-los em bandeiras de exclusão, trai a própria essência de qualquer fé que pregue a transcendência e o amor ao Criador, pois desumaniza a criatura feita à sua imagem.

Desta forma, o verdadeiro combate ao terrorismo não se limita à repressão policial ou militar, mas passa necessariamente pela defesa intransigente da educação e do diálogo inter-religioso.

É a luz da razão e da tolerância que deve ser acesa para dissipar a escuridão do fanatismo, provando que a diferença de crença jamais pode ser motivo para a guerra, mas sim o motor para um enriquecimento mútuo da civilização.

Urge que os homens de boa vontade se ergam, em uníssono, em favor de uma cultura de paz e de liberdade religiosa, e que todas as luzes se acendam em alerta contra toda e qualquer manifestação terrorista.

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