Artigos e Opinião

OPINIÃO

Marçal Rogerio Rizzo:
"Pelo mundo com minha Monareta!"

Economista e professor da UFMS

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Faço minha caminhada sempre que posso! Faz muito bem para o corpo, mente e alma. Todo mundo deveria caminhar; aliás, caminhar por todos os lados e a toda hora. Mas isso não acontece. No Brasil, a violência impera em nossas ruas. Por todos os cantos, o medo cresce.  

Tocado pelas lembranças dia desses, caminhando, lembrei-me das ruas e estradas de antigamente, ou melhor, das décadas de 1970 e 1980, que, ao menos em Jales, eram tranquilas e seguras. Fui criado ali e vivi essa realidade. A cidade era ótima para viver a infância. Quando digo mais tranquilas e seguras, refiro-me à violência no trânsito e até mesmo às demais formas de violência que vemos hoje por todos os lados, como assalto, tráfico de drogas, roubos, homicídios e latrocínios.

Dá muita saudade desse tempo! À época, por existir um ambiente assim favorável, as crianças sonhavam em dominar as ruas com suas bicicletas. Esse era o sonho de consumo; era o presente que toda criança gostaria de ganhar. Havia até um comercial de televisão cujos dizeres todos de minha idade se lembram: “Não se esqueça da minha Caloi”.  Quando menores, e mesmo para aprender a andar de bicicleta, o sonho era ganhar a Caloi Berlineta. Após crescer um pouco mais e pensando em viver mais emoções, o interessante era ganhar a Monareta, que era um modelo de bicicleta produzido pela Monark.

De Monareta, já se criava a possibilidade de andar maiores distâncias, de sair do bairro onde se morava e ir para outro bairro; de atravessar a cidade; de sair do sítio e ir à cidade e voltar para o sítio. Essa era a bicicleta “da vez” para quem tinha até seus 12 anos de idade.

Enfim: ganhei de presente uma Monareta vermelha. Achei que era grande para mim, mas logo já estava achando o máximo. Saí andando por todos os lados. O único problema era atravessar os bancos de areia que, na linguagem do povo da roça, eram os “areiãos”, porém, com o passar dos dias, ganhei experiência e tirei isso de letra. Nada me segurava mais.

Escrevo este texto para destacar que eu era uma criança de oito anos de idade e, por mais curioso que pareça, à época, seguia sozinho pelas estradas de terra, carreadores e ruas. Parecia que tinha formiga nos pés, já que não parava no lugar. Percorria o trajeto de um sítio a outro sem problema algum. Ia ao campo de futebol do bairro rural do Córrego do Ribeirão Lagoa montado na minha super Monareta. Carros pelas estradas eram poucos, e a maioria que passava por ali era morador do próprio bairro e todos se conheciam. Às vezes, passava uma charrete, um carrinho de tração animal, um cavaleiro ou mesmo alguém de bicicleta, mas tudo na mais perfeita paz.

Hoje, pode parecer insano e irresponsável por parte dos pais deixar uma criança andar leve e solta por todos os lados. Talvez nunca houvesse passado pela cabeça de nenhuma pessoa que alguém fosse fazer algum mal para uma criança que estava andando de bicicleta pelas estradas ou ruas. Afinal, isso era comum à época. E não havia casos que ilustrassem histórias de horror contra crianças, como acontece hoje.

Existiam poucos brinquedos industrializados e normalmente eram caros, de modo que andar de bicicleta era mais uma brincadeira. Mas o bacana mesmo era andar em grupo. Às vezes, colocávamos pedaços de papelão presos com prendedores no garfo da magrela para fazer barulho. Outros montavam uma parafernália com lata de leite ninho e um elástico para fazer barulho de motocicleta. Cada pedalada na Monareta era uma alegria a mais. Minha relação com a Monareta era tão profunda, que combinava amizade, liberdade, autonomia e responsabilidade. Afinal, se fizesse algo de errado, a cinta entrava em ação. 

Hoje, vejo que isso durou pouco. A infância passou muito rápido. Os bons tempos se foram! Agora, sendo pai, afirmo que não daria uma Monareta para o meu filho andar pelas estradas, carreadores e ruas sem a companhia de um adulto de confiança. Parece que uma parcela da humanidade deixou de ser “humana” e se transformou em monstros. Basta ver os inúmeros casos de crianças que desaparecem e depois são encontradas mortas. 

Considero o assunto tão importante, que penso que caberia um debate amplo e estudos aprofundados para entender e identificar as causas da perda do direito de nossos filhos de andar de Monareta em segurança pelas ruas. 

Há, todavia, um outro aspecto que tem que ser posto em questão: as crianças de hoje querem andar de Monareta pelas ruas ou preferem o aconchego do sofá vendo televisão ou jogando videogames? Será que não criamos uma lógica de causa e efeito?

EDITORIAL

É preciso passar um pente-fino na Cosip

O que a sociedade exige e com razão é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte

20/12/2025 07h15

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A deflagração da Operação Apagar das Luzes, nesta sexta-feira, pelo Grupo Especializado de Combate à Corrupção (Gecoc) do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), é mais um daqueles episódios que deixam claro que a iluminação pública de Campo Grande guarda muito mais sombras do que se imaginava.

E, ao que tudo indica, ainda há muito a ser revelado sobre contratos, cifras e responsabilidades envolvendo um serviço essencial para a cidade.

Campo Grande figura entre os municípios que mais arrecadam no Brasil com a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip). Trata-se de uma arrecadação robusta, bilionária ao longo dos anos, paga mensalmente pelo cidadão na conta de energia elétrica.

Ainda assim, a realidade vista nas ruas é contraditória: bairros inteiros convivem com postes apagados, avenidas mal iluminadas e áreas que se tornam vulneráveis à criminalidade justamente pela ausência de luz.

A investigação que apura fraudes estimadas em R$ 62 milhões lança uma pergunta inevitável: como é possível faltar iluminação em um município que arrecada tanto?

Reportagem publicada pelo Correio do Estado no ano passado mostrou que a Cosip de Campo Grande superava, à época, a arrecadação de Curitiba – cidade com mais que o dobro da população. Mesmo assim, a capital sul-mato-grossense convive com um serviço precário e reclamações recorrentes da população.

O mais preocupante é que essas suspeitas de irregularidades surgem em meio a um discurso constante de crise financeira propagado pela administração municipal.

Se confirmadas, as fraudes não estariam ocorrendo em um cenário de escassez, mas sim em um verdadeiro manancial de recursos. Isso agrava ainda mais o quadro, pois revela que o problema pode não ser falta de dinheiro, mas falhas graves de gestão, fiscalização e zelo com o dinheiro público.

É legítimo esperar explicações detalhadas sobre os contratos firmados, os critérios de pagamento e a execução dos serviços. Mas isso, por si só, não basta. O que a sociedade exige – e com razão – é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte, que deveria retornar em forma de ruas iluminadas, mais segurança e melhor qualidade de vida.

Nesse contexto, o trabalho do Gecoc merece reconhecimento. Mais uma vez, o MPMS cumpre seu papel institucional de investigar, cobrar respostas e iluminar áreas em que a administração pública falhou.

Combater a corrupção não é apenas punir culpados, mas também criar condições para que os serviços públicos funcionem melhor e com mais eficiência.

Iluminação pública não é luxo. É segurança, mobilidade e dignidade urbana. Se há dinheiro sobrando e luz faltando, algo está profundamente errado – e precisa ser corrigido com urgência, transparência e responsabilidade.

ARTIGOS

Redes sociais: o "estacionamento" da reputação corporativa

Qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial

19/12/2025 07h45

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No ambiente corporativo contemporâneo, a fronteira entre opinião pessoal e responsabilidade profissional se tornou quase invisível. Com a hiperconectividade, qualquer manifestação nas redes sociais tem potencial para alcançar ampla visibilidade. Um único comentário ofensivo de um funcionário é capaz de comprometer a confiança interna, afetar a reputação da marca e desencadear litígios.

Quando as manifestações de funcionários ultrapassam o limite da crítica construtiva e se convertem em acusações ou declarações com potencial de impactar negativamente a imagem e a credibilidade da organização, abre-se espaço a um debate essencial: qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial?

A repercussão, em casos como esse, costuma ser imediata. Colegas, clientes, fornecedores e demais parceiros têm acesso ao conteúdo, potencializando seus efeitos e ampliando o risco reputacional.

Qualquer que seja o caminho de resposta, a análise jurídica deve ser cuidadosa. A Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, alíneas j e k) prevê a possibilidade de dispensa por justa causa quando o empregado pratica ato lesivo à honra ou à boa fama de qualquer pessoa “no serviço”, especialmente quando dirigido ao empregador ou superiores hierárquicos.

A jurisprudência tem entendido que publicações em redes sociais podem produzir efeitos equivalentes aos de condutas praticadas no ambiente físico de trabalho, legitimando a aplicação da penalidade.

A Constituição Federal (art. 5º, incisos IV, V e X) assegura a liberdade de expressão, mas estabelece limites claros quando essa manifestação viola direitos relacionados à honra, à imagem e à dignidade. Já o Marco Civil da Internet reforça mecanismos de responsabilização de plataformas mediante notificação, permitindo respostas mais ágeis a conteúdos ilícitos.

Com a evolução da sociedade, a linha que separa opinião de ofensa se tornou cada vez mais tênue. A liberdade de expressão é garantida, mas não é absoluta: quando a crítica se transforma em injúria ou difamação, há quebra de confiança, podendo configurar justa causa, inclusive quando a conduta ocorre fora do expediente.

O desafio, agora, reside na interpretação. A definição do que constitui “crítica legítima” ou “falta grave” ainda é variável entre diferentes julgadores, o que aumenta o risco de reversão de penalidades, pedidos de indenização e danos à reputação corporativa.

Em um ambiente empresarial cada vez mais exposto ao escrutínio público, sobretudo nas redes sociais, torna-se imprescindível que as organizações adotem políticas claras, protocolos seguros de apuração e documentação robusta para fundamentar suas decisões e que as decisões e a gestão de tópicos sensíveis considerem estratégia, cautela e respaldo técnico.

Condutas inadequadas de colaboradores podem gerar impactos relevantes, mas a resposta empresarial deve estar alinhada à legislação e às melhores práticas de governança.

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