Artigos e Opinião

Editorial

O sonho interrompido de MS e Três Lagoas

Que a UFN3 não se transforme de fato em um monumento ao desalento. E que o sonho não morra nos escombros do passado

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Sonhar grande tem seus custos. Essa verdade amarga é sentida de forma muito concreta por MS, especialmente pela cidade de Três Lagoas, onde a paisagem industrial abriga hoje o esqueleto de um sonho inacabado: a Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN3), da Petrobras. O projeto, que deveria transformar a região em um polo estratégico para a produção de fertilizantes, permanece como símbolo de uma ambição legítima que, por razões diversas – muitas vezes externas –, foi atropelada pela realidade.

A iniciativa começou com entusiasmo. Há mais de uma década, a direção da Petrobras e autoridades de MS vislumbraram uma revolução para o Estado. Com o gás natural importado da Bolívia, havia insumo, além de projeto e vontade. Tudo indicava que a UFN3 poderia funcionar como um catalisador de desenvolvimento regional e geração de empregos e, em uma escala maior, como peça-chave para dar mais autonomia ao agronegócio brasileiro, ainda hoje extremamente dependente da importação de fertilizantes.

O sonho quase se tornou realidade. Máquinas chegaram, estruturas foram erguidas e os investimentos avançaram. Porém, em 2014, a Lava Jato mudou os rumos do País e da Petrobras. A obra foi paralisada, arrastando com ela a esperança de uma nova era para Três Lagoas. É importante dizer: embora a fábrica estivesse dentro do guarda-chuva de investigação da estatal, nunca foi comprovada corrupção no projeto da UFN3. Ainda assim, a interrupção se deu de forma abrupta, com base em um ambiente generalizado de suspeição e freio de investimentos.

Os prejuízos foram múltiplos. Não apenas econômicos, mas sociais e estruturais. O Estado perdeu mais que uma fábrica: perdeu tempo e parte do futuro que estava sendo desenhado. O Brasil, por sua vez, perdeu a oportunidade de diminuir a sua dependência de fertilizantes importados, especialmente em um contexto global cujo acesso a esses insumos é cada vez mais sujeito a flutuações geopolíticas.

Com a mudança de governo em 2023 e o reposicionamento da Petrobras em direção a uma atuação mais alinhada ao interesse nacional, reacendeu-se a promessa: retomar a UFN3 e, enfim, concluir o que foi deixado para trás. Mas o tempo segue correndo e o canteiro de obras permanece em silêncio. O anúncio da retomada até agora não saiu do papel. E a esperança está lá, mas o cansaço da espera começa a pesar.

É inegável que se trata de uma obra de grande custo, mas a Petrobras tem plenas condições financeiras para bancar a sua conclusão. A empresa tem registrado lucros bilionários, apesar das oscilações da economia. O problema, talvez, esteja nas pressões do mercado financeiro, que prefere a distribuição imediata de dividendos a acionistas em vez de investimentos de longo prazo, ainda que estratégicos para o País. A decisão, no entanto, não pode ser apenas contábil, precisa ser política, no melhor sentido do termo: voltada ao bem coletivo.

O que se espera, portanto, é que a UFN3 não se transforme definitivamente em monumento ao desalento. Que o sonho não morra nos escombros do passado. A cidade de Três Lagoas e o Brasil merecem mais que promessas – merecem ação. Que a fábrica, um dia, fique pronta, e não só como reparação a uma década perdida, mas como símbolo maior de que ainda é possível ter grandes sonhos e realizá-los.

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EDITORIAL

É preciso passar um pente-fino na Cosip

O que a sociedade exige e com razão é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte

20/12/2025 07h15

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A deflagração da Operação Apagar das Luzes, nesta sexta-feira, pelo Grupo Especializado de Combate à Corrupção (Gecoc) do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), é mais um daqueles episódios que deixam claro que a iluminação pública de Campo Grande guarda muito mais sombras do que se imaginava.

E, ao que tudo indica, ainda há muito a ser revelado sobre contratos, cifras e responsabilidades envolvendo um serviço essencial para a cidade.

Campo Grande figura entre os municípios que mais arrecadam no Brasil com a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip). Trata-se de uma arrecadação robusta, bilionária ao longo dos anos, paga mensalmente pelo cidadão na conta de energia elétrica.

Ainda assim, a realidade vista nas ruas é contraditória: bairros inteiros convivem com postes apagados, avenidas mal iluminadas e áreas que se tornam vulneráveis à criminalidade justamente pela ausência de luz.

A investigação que apura fraudes estimadas em R$ 62 milhões lança uma pergunta inevitável: como é possível faltar iluminação em um município que arrecada tanto?

Reportagem publicada pelo Correio do Estado no ano passado mostrou que a Cosip de Campo Grande superava, à época, a arrecadação de Curitiba – cidade com mais que o dobro da população. Mesmo assim, a capital sul-mato-grossense convive com um serviço precário e reclamações recorrentes da população.

O mais preocupante é que essas suspeitas de irregularidades surgem em meio a um discurso constante de crise financeira propagado pela administração municipal.

Se confirmadas, as fraudes não estariam ocorrendo em um cenário de escassez, mas sim em um verdadeiro manancial de recursos. Isso agrava ainda mais o quadro, pois revela que o problema pode não ser falta de dinheiro, mas falhas graves de gestão, fiscalização e zelo com o dinheiro público.

É legítimo esperar explicações detalhadas sobre os contratos firmados, os critérios de pagamento e a execução dos serviços. Mas isso, por si só, não basta. O que a sociedade exige – e com razão – é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte, que deveria retornar em forma de ruas iluminadas, mais segurança e melhor qualidade de vida.

Nesse contexto, o trabalho do Gecoc merece reconhecimento. Mais uma vez, o MPMS cumpre seu papel institucional de investigar, cobrar respostas e iluminar áreas em que a administração pública falhou.

Combater a corrupção não é apenas punir culpados, mas também criar condições para que os serviços públicos funcionem melhor e com mais eficiência.

Iluminação pública não é luxo. É segurança, mobilidade e dignidade urbana. Se há dinheiro sobrando e luz faltando, algo está profundamente errado – e precisa ser corrigido com urgência, transparência e responsabilidade.

ARTIGOS

Redes sociais: o "estacionamento" da reputação corporativa

Qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial

19/12/2025 07h45

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No ambiente corporativo contemporâneo, a fronteira entre opinião pessoal e responsabilidade profissional se tornou quase invisível. Com a hiperconectividade, qualquer manifestação nas redes sociais tem potencial para alcançar ampla visibilidade. Um único comentário ofensivo de um funcionário é capaz de comprometer a confiança interna, afetar a reputação da marca e desencadear litígios.

Quando as manifestações de funcionários ultrapassam o limite da crítica construtiva e se convertem em acusações ou declarações com potencial de impactar negativamente a imagem e a credibilidade da organização, abre-se espaço a um debate essencial: qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial?

A repercussão, em casos como esse, costuma ser imediata. Colegas, clientes, fornecedores e demais parceiros têm acesso ao conteúdo, potencializando seus efeitos e ampliando o risco reputacional.

Qualquer que seja o caminho de resposta, a análise jurídica deve ser cuidadosa. A Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, alíneas j e k) prevê a possibilidade de dispensa por justa causa quando o empregado pratica ato lesivo à honra ou à boa fama de qualquer pessoa “no serviço”, especialmente quando dirigido ao empregador ou superiores hierárquicos.

A jurisprudência tem entendido que publicações em redes sociais podem produzir efeitos equivalentes aos de condutas praticadas no ambiente físico de trabalho, legitimando a aplicação da penalidade.

A Constituição Federal (art. 5º, incisos IV, V e X) assegura a liberdade de expressão, mas estabelece limites claros quando essa manifestação viola direitos relacionados à honra, à imagem e à dignidade. Já o Marco Civil da Internet reforça mecanismos de responsabilização de plataformas mediante notificação, permitindo respostas mais ágeis a conteúdos ilícitos.

Com a evolução da sociedade, a linha que separa opinião de ofensa se tornou cada vez mais tênue. A liberdade de expressão é garantida, mas não é absoluta: quando a crítica se transforma em injúria ou difamação, há quebra de confiança, podendo configurar justa causa, inclusive quando a conduta ocorre fora do expediente.

O desafio, agora, reside na interpretação. A definição do que constitui “crítica legítima” ou “falta grave” ainda é variável entre diferentes julgadores, o que aumenta o risco de reversão de penalidades, pedidos de indenização e danos à reputação corporativa.

Em um ambiente empresarial cada vez mais exposto ao escrutínio público, sobretudo nas redes sociais, torna-se imprescindível que as organizações adotem políticas claras, protocolos seguros de apuração e documentação robusta para fundamentar suas decisões e que as decisões e a gestão de tópicos sensíveis considerem estratégia, cautela e respaldo técnico.

Condutas inadequadas de colaboradores podem gerar impactos relevantes, mas a resposta empresarial deve estar alinhada à legislação e às melhores práticas de governança.

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