Artigos e Opinião

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Odilon de Oliveira: "Confisco de propriedades rurais"

Juiz federal aposentado, advogado

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A Justiça Federal acaba de reconhecer e declara a prescrição do direito de a União Federal desapropriar as áreas rurais componentes do Parque Nacional da Serra da Bodoquena, criado por decreto presidencial de 21 de setembro de 2000 e englobando os Municípios de Bonito, Miranda, Porto Murtinho e Bodoquena. A justiça, nos autos de ação declaratória movida por diversos proprietários, representados pelo Escritório Adriano Magno e Odilon de Oliveira – Advogados Associados, assim decidiu porque a União não ajuizou ação de desapropriação no prazo de cinco anos.

De 2000 para cá já se foram 19 anos, e nada. Sequer a União elaborou, no prazo, o plano de manejo, documento que especifica métodos e procedimentos operacionais para uso sustentável, de modo a garantir a perenidade da biodiversidade e dos demais atributos ambientais inerentes. Em síntese, nada se fez dentro dos cinco anos, a não ser a geração de enormes prejuízos econômicos para os proprietários e até para as propriedades do entorno, cujas atividades também passaram a sofrer determinadas limitações em seu uso habitual. 

Sequer a área foi delimitada. Não bastam as coordenadas geográficas constantes de memoriais descritivos. É indispensável a demarcação física, com a colocação de marcos ou sinais outros. A evolução da tecnologia impõe, hoje, a qualquer proprietário rural, uma prática inconfundível quanto à identificação de limites: o georreferenciamento. O resultado dessa omissão da União está também na aplicação de multas contra “expropriados” e lindeiros. Se não está demarcada a área, como é que a fiscalização ambiental vai saber onde começa e onde termina a base territorial do Parque Nacional da Serra da Bodoquena? Pior ainda é a União insistir no exercício da posse e do domínio sem ser proprietária. A propriedade somente lhe seria transferida com a efetivação da desapropriação, no prazo, e o registro no cartório de imóveis. 

Com certeza, os proprietários cujas terras formariam o Parque e os do entorno também buscarão, na justiça, indenização por perdas e danos, visto que a destinação econômica de todas essas propriedades foi prejudicada ao longo de quase duas décadas. Isto sem falar na insegurança jurídica e nos dissabores experimentados enquanto o Poder Público sapateava sobre propriedades privadas. Só a área do Parque mede 76.481 hectares e menos de 20% dos proprietários recebeu indenização. 

A Constituição Federal, repudiando o confisco, garante o direito de propriedade e também prévia e justa indenização, em dinheiro, em caso de desapropriação para fins de reforma agrária ou por necessidade ou utilidade pública. Em qualquer desses casos, identificada a área para ser desapropriada e reunida a documentação necessária, o Presidente da República, por decreto, declara-a de utilidade pública ou de interesse para fins de reforma agrária. A partir daí, se não houver acordo com o proprietário, o Poder Público entra com ação de desapropriação, mas dentro do prazo. Se não o fizer no tempo marcado, ocorrerá a chamada prescrição ou caducidade do decreto declaratório de interesse social (reforma agrária) ou de utilidade pública. Essa prescrição tem que ser declarada pela justiça. Há outros motivos ensejadores de anulação de desapropriação. 

O caso em comentário cuidou de desapropriação para fins de criação de unidade de conservação ambiental. 
A Constituição Federal dedica um capítulo inteiro ao meio ambiente e a União Federal, numa comunhão universal, tem a incumbência de criar áreas de preservação em cada Estado, dentro dos ditames da lei, pois “ninguém será privado ... de seus bens sem o devido processo legal”, garante a Carta Magna. O direito de propriedade e sua garantia são princípios da ordem econômica e esta, por sua vez, ao lado da dignidade da pessoa humana, é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. 

Ninguém é contra a criação de unidade de preservação ambiental, mas na forma da Constituição Federal e da lei. É público e notório que o Brasil mal cuida de evitar e reprimir o desmatamento clandestino, especialmente por madeireiros da região amazônica. O INPE, criado há 60 anos, atuante na área de pesquisas científicas e de tecnologias espaciais, divulgou recentemente o aumento dessa destruição, que leva consigo o patrimônio genético e toda a diversidade biológica, atributos naturais de que dependem as gerações presentes e futuras. 

EDITORIAL

Santa Casa refém da própria má gestão

A Santa Casa precisa de mais do que socorros emergenciais: precisa de coragem para mudar, responsabilidade na gestão e respeito por quem sustenta sua missão

23/12/2025 07h15

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A situação vivida pela Santa Casa de Campo Grande ao fim de mais um ano é, infelizmente, a repetição de um roteiro conhecido – e previsível.

Há, pelo menos, uma década, o maior hospital filantrópico do Estado é vítima não apenas de um sistema público de saúde subfinanciado, mas, sobretudo, de escolhas administrativas equivocadas, da falta de planejamento e de uma gestão que parece incapaz de romper com seus erros históricos.

Neste fim de ano, o cenário chega a um ponto simbólico e constrangedor: a instituição depende, literalmente, de um milagre para pagar o 13º salário de seus funcionários.

Profissionais que sustentam o atendimento diário de milhares de pacientes, que enfrentam plantões exaustivos, superlotação, escassez de insumos e pressão constante, agora convivem com a angústia de não saber se receberão um direito básico. Isso não honra o nome “Santa Casa”.

Não há justiça social, não há moralidade administrativa e tampouco humanidade em deixar esses trabalhadores à mercê da incerteza.

É evidente que o problema não se resume à gestão interna. O subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é uma realidade nacional, e a Santa Casa, como tantas outras instituições filantrópicas, sofre com valores defasados, repasses insuficientes e atrasos frequentes.

O poder público tem, sim, parcela relevante de responsabilidade nesse quadro. Ignorar isso seria desonesto. No entanto, usar essa realidade como justificativa permanente para a ineficiência interna é igualmente inaceitável.

O que salta aos olhos é a aparente falta de disposição da administração do hospital em buscar eficiência, especialmente no campo financeiro.

Os números mostram que apenas o serviço da dívida – os juros e encargos pagos anualmente aos bancos – seria suficiente para quitar não apenas o 13º salário e evitar o acúmulo de outras obrigações em atraso, mas também de quitar quase toda a folha anual. Isso revela um modelo de gestão que prioriza a manutenção de passivos bancários em detrimento do compromisso com seus trabalhadores.

Mais uma vez, a saída apontada parece ser recorrer a novos empréstimos ou aguardar aportes emergenciais do poder público. Trata-se de um ciclo perverso. Endividar-se para cobrir despesas correntes, como folha de pagamento, não é uma estratégia de sustentabilidade; é um atalho para o colapso.

Empréstimos deveriam servir para investimentos, modernização, ganho de eficiência e redução de custos futuros – não para tapar buracos mensais de um caixa cronicamente desequilibrado.

O resultado é uma dívida cada vez menos saudável, maior dependência externa e nenhuma solução estrutural. Enquanto isso, a transparência sobre gastos, contratos e decisões estratégicas segue insuficiente, o que apenas aprofunda a desconfiança da sociedade e dos funcionários.

É lamentável que um hospital com tamanha importância social, histórica e simbólica chegue a esse ponto ano após ano. A Santa Casa precisa de mais do que socorros emergenciais: precisa de coragem para mudar, de responsabilidade na gestão e de respeito por quem sustenta a sua missão.

Sem isso, continuará sobrevivendo de milagres – e milagres, como se sabe, não fazem planejamento financeiro.

ARTIGOS

Terrorismo e religiosidade

Fundamentalismo dos terroristas de todos os matizes é antissemita, anticristão e anti-hislamista, porque se vale da inimizade aos valores religiosos para disseminar o ódio

22/12/2025 07h45

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A propósito do recente e trágico ataque ocorrido na Austrália, que vitimou diversas pessoas – algumas delas fatalmente – durante a pacífica celebração do Hanukkah, a festa das luzes da comunidade judaica, impõem-se algumas reflexões sobre os motivos e as consequências de tal ato.

À falta de definição mais apropriada, e sem entenderem bem o que teria motivado os ataques, aparentemente praticados por pessoas isoladas, os analistas chamaram a atenção para a facilidade com que se adquirem armamentos hoje em dia, fenômeno que ocorre também em nosso País.

É simbólico que a festa das luzes seja muito próxima dos festejos de Natal. Também no Tempo do Advento as luzes da coroa vão sendo acesas em crescente até que a Luz do Mundo venha a nascer na noite tão esperada pelos cristãos.

Jesus Cristo não selecionava ninguém. Qualquer pessoa seria bem acolhida por Ele, bastando que professasse o único mandamento propriamente cristão: ama o próximo como a ti mesmo. Aliás, o Cristo ia além e dizia: amai vossos inimigos, o que revela, igualmente, o modelo mais aberto de compreensão da pessoa do próximo.

Na verdade, o fundamentalismo dos terroristas – de todos os matizes – é antissemita, anticristão e anti-hislamista, porque se vale da inimizade aos valores religiosos para disseminar o ódio, a cultura de morte a que já se referia São João Paulo II.

Trata-se, portanto, do mesmo tipo de fundamentalismo que outros grupos de terroristas praticam para excluir as minorias de todo o tipo, mesmo as que não professem nenhuma crença.

É simbólico que tenha sido Ahmed, o sírio, a desarmar um dos terroristas, o que lhe custou dois ferimentos.

Esses terroristas disparam, inclusive pelos meios de comunicação virtual, contra todos aqueles que não pensam como eles. Eis quem são, em certo sentido, os verdadeiros fundamentalistas do ódio. Por que teriam escolhido a reunião do Hanukkah, tão plena de simbolismos?

Não nos prendamos a esse vetor. Basta atentar para os recentes ataques a uma mesquita e a uma feira natalina para que se ponha foco na essência do que está em jogo.

A enorme confusão ideológica e doutrinal do terrorismo revela, antes de tudo, mentes perturbadas, incapazes de discernir entre o bem e o mal. Ou, se quisermos embaralhar ainda mais as cartas, incapazes de discernir a esquerda da direita.

A confusão ideológica, aliás, não é apenas um sintoma de desordem mental, mas a estratégia consciente de aniquilar a pluralidade inerente à condição humana.

O extremismo, ao se apropriar de símbolos sagrados e transformá-los em bandeiras de exclusão, trai a própria essência de qualquer fé que pregue a transcendência e o amor ao Criador, pois desumaniza a criatura feita à sua imagem.

Desta forma, o verdadeiro combate ao terrorismo não se limita à repressão policial ou militar, mas passa necessariamente pela defesa intransigente da educação e do diálogo inter-religioso.

É a luz da razão e da tolerância que deve ser acesa para dissipar a escuridão do fanatismo, provando que a diferença de crença jamais pode ser motivo para a guerra, mas sim o motor para um enriquecimento mútuo da civilização.

Urge que os homens de boa vontade se ergam, em uníssono, em favor de uma cultura de paz e de liberdade religiosa, e que todas as luzes se acendam em alerta contra toda e qualquer manifestação terrorista.

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