Esses dois insetos frequentam as artes de diferentes maneiras. No cinema, quem não viu o filme “A Mosca”, de 1986, em que um cientista inventa a máquina para fazer o teletransporte de corpos?
O processo consistia numa espécie de “desmonte” das moléculas do corpo numa das máquinas (a transmissora) e sua reconstituição na outra (a receptora). Depois de testá-la com objetos e pequenos animais, resolve ele mesmo submeter-se a um teste. Deu tudo errado quando ele, ao entrar na máquina, não percebeu que entrou junto uma mosca.
Ela foi “desmontada” e transportada junto com o cientista e, na “remontagem”, misturaram-se as moléculas e o homem incorporou as características do inseto, transformando-se num monstro híbrido, mosca/homem. Essa mesma história já havia sido filmada, com recursos bem toscos, em 1958, com o título em português de “A mosca da cabeça branca”.
Na música temos a composição do saudoso Raul Seixas, “A mosca na sopa”, aquela “que perturba o seu sono” e que fica “no seu quarto a zumbizar”, além de outras que no momento não me ocorrem.
Quanto à borboleta, por motivos óbvios, sua presença se faz muito mais notada: é a beleza de uma pintura, é a poesia exaltando suas belas cores, é a música, tal como canta Marisa Monte (“Borboleta pequenina que vem para nos saudar”) e o poeta Vinícius de Moraes (“Brancas/Azuis/Amarelas/Pretas/Brincam/Na luz/As belas/Borboletas”), e outros. Renomados escritores, como o mestre Rubem Braga, celebraram a borboleta: quem não leu sua notável crônica “A borboleta amarela”?
Na verdade, o que me motivou a escrever sobre esses dois insetos foi uma situação curiosa que vivenciei há alguns dias. Sempre que posso e a disposição comparece, frequento a sala de ginástica do condomínio onde moro, bem cedo, geralmente o primeiro a chegar. Como sempre, entrei, liguei as luzes e abri as janelas para arejamento e renovação do ar do ambiente.
Fui logo para a esteira ergométrica e, ao iniciar, surgiu, saída de algum canto escuro, uma bela borboleta, que fez diversos sobrevoos na sala, vindo a seguir em minha direção e realizando quatro voltas ao meu redor; após isso, dirigiu-se a uma das janelas e ganhou a liberdade, sumindo no ar ainda meio escuro. Concluí que esse volteio em torno de mim foi, provavelmente, para agradecer-me por tê-la libertado da escuridão e do ambiente abafado em que passara a noite.
Mas, assim que a borboleta evadiu-se do local, fui assaltado por uma dessas moscas que, às vezes, nos assediam, insistindo em pousar em nosso rosto, por mais que as espantemos. Foram muitos minutos de luta: a mosca tocando o meu rosto e eu repelindo-a.
Ela não me deu trégua, até que, chegando outro morador para exercitar-se, a danada abandonou-me e foi imediatamente incomodar o recém-chegado. Fiquei matutando sobre qual teria sido o motivo para que ela me trocasse pelo outro (seria seu perfume mais agradável que o meu?), mas não reclamei; fiquei apenas observando a luta do meu vizinho com o irritante inseto.


