Pedro Pedreira, personagem de Francisco Milani na Escolinha do Professor Raimundo, quase sempre encerrava o seu texto com o bordão “não me venha com churumelas”, indicando sua contrariedade com o argumento do mestre. A lembrança do ator veio por conta de uma notícia, aparentemente despretensiosa, informando que a Ouvidoria da Prefeitura fará pesquisa com usuários, nos doze terminais de ônibus da cidade, para saber a opinião dos cidadãos sujeitos ao transporte coletivo da Capital.
Ora, dinheiro público não é capim e devia ser respeitado. Pagamos pesadíssimos impostos, o IPTU de Campo Grande é dos maiores entre as capitais brasileiras, e a receita municipal não deve ser torrada dessa forma. Para que pesquisar o óbvio? Para que gastar tempo e recursos se, ao fim e ao cabo, será constatado que as queixas centram-se, basicamente, no enorme tempo que se gasta à espera dos coletivos; na insuficiência de ônibus em horários de pico, obrigando as pessoas a viajarem sem conforto, como sardinhas em lata; no elevado preço da tarifa.
Se os responsáveis pela gestão do transporte público de Campo Grande quiserem, de fato, conhecer a qualidade dos serviços oferecidos à população, há um jeito muito simples e infalível: proponham-se a abandonar o automóvel, por somente uma semana, realizando a sua rotina, com todas as atividades usuais, sem exceção, de ônibus ou a pé. Seguramente, esse exercício de pesquisa “participativa” fornecerá elementos extraordinários para a compreensão do fenômeno, de vez que a apreensão da realidade não se fará pela leitura fria de informações coletadas e tratadas, mas por meio da observação direta, experimentando a sofrência de quem espera, de quem sacoleja em veículo superlotado e barulhento, de quem sente o forte calor do verão, de quem não pode evitar odores desagradáveis e toda sorte de desconforto a que se está exposto.
Aliás, essa deveria ser uma prática obrigatória para todas as autoridades envolvidas, técnicos e empresários que exploram o serviço. Pode parecer radical, porém, é uma possibilidade plausível para se sensibilizarem e deixarem de atuar de forma protocolar, desrespeitando o direito mais elementar de quem precisa fazer uso desse meio de locomoção.
Há um leque de medidas possíveis, sem alteração de custos, que poderiam ser adotadas para melhorar a qualidade do serviço, como por exemplo, racionalizar o horário de circulação dos coletivos; rever linhas sem demanda; respeitar os horários divulgados. Outras há que exigem dinheiro, como a instalação de abrigos cobertos; o fim da superlotação com ampliação do número de coletivos em circulação e soluções de trânsito para privilegiar o transporte coletivo, aumentando a mobilidade urbana. Afinal, trata-se de uma política pública que deve ser encarada com mais responsabilidade porque, quando o transporte coletivo é ruim, as pessoas buscam o individual, mas, ao acontecerem acidentes, o custo das mortes, da assistência médico-hospitalar e das sequelas, é arcado por toda a sociedade.
Os estudos e pesquisas envelhecem, as soluções não chegam e o suplício do usuário permanece, que o poder público cumpra o seu papel, sem churumelas.


