Nesta edição, abordamos um tema que conecta dois campos muitas vezes tratados de forma separada: a segurança pública e a saúde coletiva. A recente operação deflagrada pela Receita Federal e a Polícia Federal contra o uso ilegal, indevido e clandestino de metanol em bebidas alcoólicas é um exemplo claro de como o crime organizado pode afetar diretamente a saúde da população.
A ação, que teve três alvos em Mato Grosso do Sul – um deles em Campo Grande e outros dois no interior do Estado –, expôs a gravidade de um problema que vai muito além da fraude comercial: trata-se de uma ameaça concreta à vida humana.
A adulteração de bebidas alcoólicas com substâncias tóxicas, como o metanol, é um crime covarde e silencioso. Covarde porque vitima, sem distinção, do trabalhador que compra uma garrafa barata para comemorar o fim de semana ao consumidor que busca produtos aparentemente regulares.
Silencioso porque muitas vezes o perigo só é descoberto quando já é tarde demais. O metanol, mesmo em pequenas quantidades, pode causar cegueira, falência múltipla de órgãos e morte. Trata-se, portanto, de uma questão de saúde pública, e não apenas de segurança.
É importante ressaltar que o fato de as bebidas alcoólicas serem produtos legalizados não as torna inofensivas. Elas são, em essência, uma droga lícita e, como toda substância psicoativa, exigem controle, fiscalização e consumo responsável.
O que agrava o cenário é justamente o desvio e o uso indevido dessas substâncias por grupos criminosos, que buscam lucro rápido às custas da integridade física de milhares de pessoas.
Essa operação também serve para expor uma relação muitas vezes negligenciada: a do crime organizado com a saúde pública. Essa conexão é profunda.
Assim como o tráfico de drogas ilícitas destrói vidas e sobrecarrega o sistema de saúde com dependentes químicos, a adulteração de bebidas envenena silenciosamente a sociedade, levando vítimas a hospitais e ao óbito por causas totalmente evitáveis.
O crime, quando contamina o que ingerimos, invade o espaço mais íntimo da vida humana – o corpo.
É por isso que o combate às ilegalidades deve ser visto como uma extensão da política de saúde. Quando a Polícia Federal investiga, quando a Receita cruza dados fiscais e quando o Ministério Público emite alertas de fiscalização, o que está em jogo não é apenas a aplicação da lei, mas a proteção da vida.
Uma sociedade mais segura é, antes de tudo, uma sociedade que compreende essa interdependência: sem segurança, não há saúde e, sem saúde, não há vida digna.
Investigar e punir quem produz ou distribui substâncias adulteradas não é apenas uma tarefa policial, é um dever moral de toda nação que se pretenda civilizada.
Quando o Estado cumpre esse papel, ele não apenas combate o crime, mas preserva o bem mais precioso de qualquer sociedade: a confiança de que viver e consumir dentro da lei é também uma forma de estar protegido.


