Artigos e Opinião

OPINIÃO

Rafael Rossi - "Campo e Cidade: Qual é o espaço luminoso?"

Docente do curso de Licenciatura em Educação do Campo na UFMS em Campo Grande-MS. ([email protected])

Redação

05/09/2014 - 00h00
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A questão agrária e a questão urbana, cada vez mais, vêm ganhando visibilidade nos discursos midiáticos, no âmbito das políticas públicas, do debate acadêmico e, principalmente, nas mobilizações e manifestações por todo território nacional como uma ação coletiva política de organização de trabalhadores e trabalhadoras de diversos e múltiplos segmentos. Entretanto, essas duas questões, embora estejam “geneticamente” conectadas, ainda representam um impasse muito grande. Basta olharmos nossos livros didáticos para constatarmos a fatídica e aparente separação entre espaço agrário e espaço urbano.

Infelizmente ainda é muito comum ouvirmos algumas pessoas dizerem aos estudantes que moram no campo: “Estuda bastante viu... Assim você consegue sair logo daqui...” Essa, entretanto, não é uma fala aleatória e desconectada das condições materiais da vida no campo. Apesar de vivermos num período de globalização, com uma velocidade e conectividade entre os territórios jamais observada na história da humanidade, a própria globalização não se manifesta de modo homogêneo por todo espaço podendo, inclusive, salientar as particularidades de cada lugar, como já nos explicava o geógrafo Milton Santos. Assim, a maneira como a globalização chega em Pirapozinho (município de porte pequeno no oeste do Estado de São Paulo) é diferente de como ela se manifesta em Campo Grande – MS.

De modo geral, de qual campo falamos no Brasil? Com relação aos imóveis rurais de 2003 a 2010, de acordo com dados do cadastro do Incra, a grande propriedade ocupava 214.843.865 milhões de hectares em 2003 e, em 2010, este número sobe para 318.904.739 milhões de hectares, o que corresponde a um crescimento de 48,4% no período. A pequena propriedade, no entanto, passa de uma ocupação de 74.195.134 milhões de hectares em 2003 para 88.789.805 milhões de hectares em 2010, o que corresponde a um crescimento de 19.7%. Essas informações explicitam o crescimento da concentração da propriedade da terra. Também poderíamos acrescentar nesse panorama dados do IPEA apontando que os mais pobres ganharam no ano de 2012 aproximadamente R$ 91,71 por mês em contraste gritante com os R$ 3.631,89 por mês dos mais ricos.

A questão das desigualdades sociais precisa continuar na pauta de preocupação de todos da sociedade civil, das políticas públicas e da pesquisa acadêmica. É neste aspecto que vale lembrar da discussão feita por Maria Laura Silveira e Milton Santos em seu livro “O Brasil: Território e Sociedade no Início do século XXI” a respeito de espaços luminosos e espaços opacos. Para os autores, espaços luminosos são aqueles que acumulam densidades técnicas, informacionais e científicas, possibilitando a captação de mais capital e tecnlogia e, por outro lado, espaços em que tais elementos não estão presentes ou não se fazem de modo tão denso, são os espaços opacos.

Em geral, há uma forte tendência social e cultural de desvalorização do campo e de suas populações com relação à cidade. Poderíamos dizer que culturalmente, tendemos a considerar o campo enquanto um espaço opaco e as cidades como espaços luminosos. O problema com isso é que diminuímos em muito as populações que lutam, trabalham, se educam e vivem em espaços agrários. Não conseguimos enxergar a “luz” proveniente do campo e de sua gente, que se organiza para defender seu direito de acesso à terra e ao trabalho, o direito à educação, saúde etc.

Essa “luz” de fraternidade, solidariedade, organização, mobilização, esperança ativa e coletiva, enfim, essa luz que faz do ser humano um ser que sempre busca ser mais como nos ensinava Paulo Freire, há tempos nos falta de modo mais abrangente na cidade. O campo e suas populações vêm cada vez mais explicitando sua luminosidade e criatividade perante momentos de crise. Que possamos todos aprender com eles a nos organizar mais e melhor, caso contrário, somente continuaremos reforçando a “escuridão” e “opacidade urbana” na atualidade através da prática cotidiana do “salve-se quem puder”...

EDITORIAL

É preciso passar um pente-fino na Cosip

O que a sociedade exige e com razão é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte

20/12/2025 07h15

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A deflagração da Operação Apagar das Luzes, nesta sexta-feira, pelo Grupo Especializado de Combate à Corrupção (Gecoc) do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), é mais um daqueles episódios que deixam claro que a iluminação pública de Campo Grande guarda muito mais sombras do que se imaginava.

E, ao que tudo indica, ainda há muito a ser revelado sobre contratos, cifras e responsabilidades envolvendo um serviço essencial para a cidade.

Campo Grande figura entre os municípios que mais arrecadam no Brasil com a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip). Trata-se de uma arrecadação robusta, bilionária ao longo dos anos, paga mensalmente pelo cidadão na conta de energia elétrica.

Ainda assim, a realidade vista nas ruas é contraditória: bairros inteiros convivem com postes apagados, avenidas mal iluminadas e áreas que se tornam vulneráveis à criminalidade justamente pela ausência de luz.

A investigação que apura fraudes estimadas em R$ 62 milhões lança uma pergunta inevitável: como é possível faltar iluminação em um município que arrecada tanto?

Reportagem publicada pelo Correio do Estado no ano passado mostrou que a Cosip de Campo Grande superava, à época, a arrecadação de Curitiba – cidade com mais que o dobro da população. Mesmo assim, a capital sul-mato-grossense convive com um serviço precário e reclamações recorrentes da população.

O mais preocupante é que essas suspeitas de irregularidades surgem em meio a um discurso constante de crise financeira propagado pela administração municipal.

Se confirmadas, as fraudes não estariam ocorrendo em um cenário de escassez, mas sim em um verdadeiro manancial de recursos. Isso agrava ainda mais o quadro, pois revela que o problema pode não ser falta de dinheiro, mas falhas graves de gestão, fiscalização e zelo com o dinheiro público.

É legítimo esperar explicações detalhadas sobre os contratos firmados, os critérios de pagamento e a execução dos serviços. Mas isso, por si só, não basta. O que a sociedade exige – e com razão – é transparência permanente sobre a aplicação da Cosip. Trata-se de uma contribuição pesada no bolso do contribuinte, que deveria retornar em forma de ruas iluminadas, mais segurança e melhor qualidade de vida.

Nesse contexto, o trabalho do Gecoc merece reconhecimento. Mais uma vez, o MPMS cumpre seu papel institucional de investigar, cobrar respostas e iluminar áreas em que a administração pública falhou.

Combater a corrupção não é apenas punir culpados, mas também criar condições para que os serviços públicos funcionem melhor e com mais eficiência.

Iluminação pública não é luxo. É segurança, mobilidade e dignidade urbana. Se há dinheiro sobrando e luz faltando, algo está profundamente errado – e precisa ser corrigido com urgência, transparência e responsabilidade.

ARTIGOS

Redes sociais: o "estacionamento" da reputação corporativa

Qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial

19/12/2025 07h45

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No ambiente corporativo contemporâneo, a fronteira entre opinião pessoal e responsabilidade profissional se tornou quase invisível. Com a hiperconectividade, qualquer manifestação nas redes sociais tem potencial para alcançar ampla visibilidade. Um único comentário ofensivo de um funcionário é capaz de comprometer a confiança interna, afetar a reputação da marca e desencadear litígios.

Quando as manifestações de funcionários ultrapassam o limite da crítica construtiva e se convertem em acusações ou declarações com potencial de impactar negativamente a imagem e a credibilidade da organização, abre-se espaço a um debate essencial: qual é o limite entre a liberdade de expressão do trabalhador e a proteção da honra e da imagem empresarial?

A repercussão, em casos como esse, costuma ser imediata. Colegas, clientes, fornecedores e demais parceiros têm acesso ao conteúdo, potencializando seus efeitos e ampliando o risco reputacional.

Qualquer que seja o caminho de resposta, a análise jurídica deve ser cuidadosa. A Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, alíneas j e k) prevê a possibilidade de dispensa por justa causa quando o empregado pratica ato lesivo à honra ou à boa fama de qualquer pessoa “no serviço”, especialmente quando dirigido ao empregador ou superiores hierárquicos.

A jurisprudência tem entendido que publicações em redes sociais podem produzir efeitos equivalentes aos de condutas praticadas no ambiente físico de trabalho, legitimando a aplicação da penalidade.

A Constituição Federal (art. 5º, incisos IV, V e X) assegura a liberdade de expressão, mas estabelece limites claros quando essa manifestação viola direitos relacionados à honra, à imagem e à dignidade. Já o Marco Civil da Internet reforça mecanismos de responsabilização de plataformas mediante notificação, permitindo respostas mais ágeis a conteúdos ilícitos.

Com a evolução da sociedade, a linha que separa opinião de ofensa se tornou cada vez mais tênue. A liberdade de expressão é garantida, mas não é absoluta: quando a crítica se transforma em injúria ou difamação, há quebra de confiança, podendo configurar justa causa, inclusive quando a conduta ocorre fora do expediente.

O desafio, agora, reside na interpretação. A definição do que constitui “crítica legítima” ou “falta grave” ainda é variável entre diferentes julgadores, o que aumenta o risco de reversão de penalidades, pedidos de indenização e danos à reputação corporativa.

Em um ambiente empresarial cada vez mais exposto ao escrutínio público, sobretudo nas redes sociais, torna-se imprescindível que as organizações adotem políticas claras, protocolos seguros de apuração e documentação robusta para fundamentar suas decisões e que as decisões e a gestão de tópicos sensíveis considerem estratégia, cautela e respaldo técnico.

Condutas inadequadas de colaboradores podem gerar impactos relevantes, mas a resposta empresarial deve estar alinhada à legislação e às melhores práticas de governança.

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