Tenho longos anos de serviços prestados à Justiça Criminal do nosso país. Defendi e defendo casos que ganharam repercussão internacional (caso João de Deus e as Mensagens Psicografadas de Chico Xavier).
Lutei com todas as minhas forças contra os preconceitos, arbítrios e opiniões antecipadas da mídia sobre o crime e a conduta do réu.
Sou devoto radical da obediência as leis, o devido processo legal e o princípio do contraditório.
Sempre respeitei as decisões judiciais e, quando inconformado, busquei socorro nas instâncias superiores. Esta foi a minha vida como advogado criminalista.
Na oportunidade em que externei o meu ponto de vista sobre o caso do Policial Rodoviário Federal, respeitosamente, discordei do eminente magistrado, através de considerações eminentemente jurídicas.
Em primeiro lugar, vê-se a olho desarmado que, quando da aplicação das medidas cautelares em favor do indiciado, observou-se a absoluta ausência do ministério público para se manifestar a respeito da aplicação da prisão preventiva ou a sua concordância com outras medidas menos rigorosas.
Ora, a audiência de custódia, tratando-se de ato jurisdicional era ao meu sentir imprescindível e indeclinável ainda que praticado na fase da investigação. Logo a presença do Ministério Público seria OBRIGATÓRIA. Tivesse presente o fiscal da lei, seria possível efetivar a regra do artigo 282, parágrafo único do Código de Processo Penal, QUE NÃO PERMITE QUE O JUIZ DECRETE, EX OFFÍCIO, medidas cautelares na fase de investigação.
Deveras, sem a presença do Ministério Público, a prisão em flagrante não poderá ser convertida em qualquer outra medida. Sendo o Ministério Público fiscal da lei e destinatário da investigação criminal, tornava-se indispensável a presença do Ministério Público na audiência de custódia, que não existiu.
Assim sendo, igualmente, a presença do advogado é de transcendental importância para fazer respeitar os direitos do preso e, sobretudo, para fiscalizar a legalidade da referida audiência em paridade de armas com o Ministério Público.
Depois, em segundo lugar, fiquei assustado com o corporativismo dos Policiais Militares na cena do crime.
Chamados no cenário delituoso esses agentes públicos não deram voz de prisão ao autor do homicídio. Ora, tratando-se de um crime violento, com três vítimas, e os ânimos exacerbados era mister que algemassem o referido policial, como é feito costumeiramente com outras pessoas. Deram-lhe todos os privilégios, pouco se importaram que tinha um ser humano debruçado e morto por balas do ESTADO.
Em terceiro lugar, fico horrorizado com a postura da Delegada de Polícia que, apressadamente, fazendo um juízo de valor, sem a apuração devida dos fatos, afirmou que o caso poderia ser tratado como LEGITIMA DEFESA.
Não, Senhora Delegada, este entendimento cabe ao Ministério Público, titular da ação penal pública.
E, finalmente, ao meu modesto juízo, embora faça enormes restrições a banalização da prisão preventiva, entendo que no caso presente estavam presentes todos os requisitos para a decretação da medida extrema.
O crime, a princípio, reveste-se de gravidade concreta absoluta. Polícia não mata, protege. Polícia não usa o poder da farda e o poder da força para intimidar, matar e usufruir posteriormente das benesses do estado para se auto-proteger. O que se pede neste caso é prudência é imparcialidade, principalmente da senhora Delegada de Polícia que por paradoxal que possa parecer já absolveu sumariamente o Policial Rodoviário Federal.
Após a publicação deste artigo na minha página no facebook, o eminente magistrado que aplicou as medidas cautelares diversas da prisão revogou a sua decisão, decretando a prisão preventiva do indiciado, após requerimento do Ministério Público Estadual.
A decisão do magistrado mostrou a sua imparcialidade e o grande senso de justiça.
Surpreendentemente e em evidente contradição com a sua história institucional – a Ordem dos Advogados do Brasil/MS, ingressou com uma Reclamação junto ao CNJ, objetivando corrigir um possível erro de interpretação do ilustre magistrado quanto a questão jurídica em discussão. Despautério dos maiores!
Aberração jurídica plena e despropositada, que não posso concordar ou aceitar.
A Ordem dos Advogados, nesta investida assaz populista não me representa. Interesse da Classe não havia, no sentido jurídico da expressão.
No caso, a OAB/MS neste conflito de paixões exacerbadas, deveria invocar a carta-consulta de Evaristo de Morais à Ruy Barbosa a respeito de uma causa que comoveu e trouxe revolta a sociedade carioca, aí, sim a minha corporação teria legitimidade para alertar a sociedade sul-mato-grossense. Diz um trecho da carta:
“Quando quer e como quer que se cometa um atentado a ordem legal se manifesta necessariamente por duas exigências: a acusação e a defesa, das quais a segunda, por mais execrando que seja o delito, não é menos especial à satisfação da moralidade pública do que a primeira. A defesa não quer o panegírico da culpa,ou do culpado. Sua função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente ou criminoso, a voz dos seus direitos legais. Se a enormidade da infração reveste-se de caracteres tais, que o sentimento geral recue horrorizado, ou se levante contra ela em violenta revolta, nem por isso essa voz deve emudecer. Voz do direito do meio da paixão pública, tão susceptível de se demasiar, às vezes pela própria exaltação da sua nobreza, tem missão sagrada, nesses casos, de não consentir que a indignação degenere em ferocidade e expiação jurídica em extermínio cruel.”
Este, em última análise, seria o papel institucional da Ordem dos Advogados do Brasil.