Convocado para prestar esclarecimentos sobre a fiscalização e o contrato com o Consórcio Guaicurus junto à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do ônibus, o presidente da Agência de Regulação dos Serviços Públicos Delegados de Campo Grande (Agereg), José Mário Antunes, de início, disse “não saber de nada”.
No cargo há quatro meses, destacou estar “no meio do fogo cruzado”. A postura foi apresentada durante a segunda oitiva que investiga a qualidade do transporte público de Campo Grande, realizada na Câmara Municipal nesta segunda-feira (5).
O embate entre a mesa-diretora e Antunes se deu no momento em que este apresentou dados da auditoria interna da Agereg. Produzido ao longo da última semana, o documento destaca que o Consórcio Guaicurus mantém uma frota de 460 ônibus, contudo, opera com 300 ônibus acima do limite prudencial de uso, com a capacidade comprometida, o que, segundo o relatório, pode comprometer os índices de desempenho do serviço. De imediato, parte da bancada pediu uma cópia do relatório.
“Desde que o senhor teve acesso a esse relatório, o que a Agereg fez? Qual foi o objeto da notificação ao consórcio?”. José Mário explicou que a notificação estava sendo feita no próprio dia da audiência: “Saiu recentemente, já notificamos. Está saindo hoje”.
Conforme os números, a atual frota conta com 171 ônibus com menos de 2 anos; 58 ônibus entre 4 e 6 anos; 20 ônibus com 7 anos e outros 11 ônibus com 8 anos.
Em sua gestão, o dirigente disse ser amparado tecnicamente por outros servidores “Meu diretor executivo é um advogado renomado, especialista em contratos, doutor Otávio Figueiró. Acredito que estou bem assessorado”, destacou. Em contrapartida, Luiza retrucou o gestor municipal.
“Pode enviar uma cópia para nós por gentileza? Estamos requerendo aqui. O senhor pode deixar o relatório conosco? Ou é secreto?”, frisou.
Em resposta, Antunes respondeu que não poderia entregar porque o documento estaria “rabiscado” e seria enviado ao Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE-MS). “Solicitem por escrito e nós respondemos”, completou.
Diante da situação, o vereador Ademar Júnior, o Coringa (MDB), pediu formalmente a apreensão do documento.
“Essa CPI tem o compromisso de entregar um relatório à sociedade. Eu quero solicitar o apoio desta casa para que a gente possa fazer a apreensão desse documento que está na mão do secretário”., bradou.
Na mesma linha que Coringa, Luiza Ribeiro seguiu. “O senhor passou a tarde inteira dizendo ‘não sei’, ‘não é comigo’, ‘só tenho quatro meses’. Agora o senhor abriu aí um relatório que nos interessa, está sobre a mesa, e está dizendo que não vai compartilhar. Isso não é justo”.
Presidente da CPI, o vereador Livio Viana (União), ponderou que “o fato a ser apurado por essa CPI é a idade média da frota. Isso foi dito aqui, está documentado. Vamos requerer visitas às garagens, ao setor de mecânica, às multas aplicadas pela Agereg ao consórcio, e também o extrato de pagamentos dos subsídios de 2025. Se os pagamentos estão em dia e o consórcio não está cumprindo, nós vamos ter que apurar. Acho desnecessária a apreensão agora. Podemos dar 24 horas para que o relatório seja entregue. Se isso não acontecer, fazemos a busca e apreensão. É prerrogativa da CPI”.
Relatora da comissão, a vereadora Ana Portela (PL), concordou com o prazo, e reforçou a importância dos esclarecimentos por parte da Agereg. “Quero afirmar que isso aqui não é um documento pessoal dele. Vamos dar as 24h, mas não achem que isso é brincadeira, porque não é”.
Ao final, o presidente Livio Viana frisou que a CPI está documentando todos os dados e que, caso o relatório não seja entregue no prazo, serão tomadas medidas legais para apreensão.
CPI do ônibus
Cabe destacar que de início, a Comissão analisou contrato de concessão do transporte público, incluindo aditivos, fiscalização, custos e balanços financeiros dos últimos cinco anos. Agora serão ouvidos agentes públicos, órgãos de controle e especialistas para entender como a concessão do transporte foi fiscalizada ao longo dos anos.
Somente na terceira fase o Consórcio Guaicurus em si será investigado, pela escuta de diretores, sócios, gestores e análise de documentos para entender a aplicação dos recursos públicos.
É nessa terceira etapa que também estão marcadas as vistorias nos ônibus, constatações in loco e auditoria das tarifas. Só depois serão marcadas audiências para escuta de motoristas e colaboradores.
Presidida pelo vereador Dr. Lívio (União) e relatada pela vereadora Ana Portela (PL), a CPI também conta com os vereadores Junior Coringa (MDB), Maicon Nogueira (PP) e Luiza Ribeiro (PT).
Estrutura da CPI
Aberta no dia 18 de março, a CPI fiscalizará três frentes:
- Emprego de frota com idade (média e máxima) dentro do limite contratual e o estado de conservação dos veículos, nos últimos cinco anos;
- Equilíbrio financeiro contratual após a aplicação dos subsídios públicos concedidos pelo Executivo Municipal de Campo Grande à empresa concessionária por meio das Leis Complementares 519/2024 e 537/2024;
- Fiscalização da Prefeitura Municipal, pela Agereg e pela Agetran, no serviço de transporte público prestado pelo Consórcio após a assinatura do Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) perante o TCE-MS, em novembro de 2020.
Consórcio
Com o contrato original firmado em 2012, há tempos a possibilidade de uma CPI é discutida nos bastidores políticos pela Casa de Leis de Campo Grande, graças aos sinais apresentados pela gestão do transporte coletivo urbano da Capital.
Após 12 de contrato, dados fornecidos pelo Consórcio Guaicurus indicam, por exemplo, uma queda de quase 25% no total de ônibus em circulação, como abordado pelo Correio do Estado no início do ano.
Em outubro de 2012, quando assinado o contrato com o Consórcio Guaicurus, a Capital contava com 574 carros atendendo o transporte coletivo, com o balanço mais recente indicando apenas 460 ônibus em operação.
Na contramão, o número de habitantes saltou de 805.397 para 898.100 moradores, conforme comparação da estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) à época e os dados do Censo Demográfico realizado pela instituição em 2022.
Já em 23 de janeiro deste ano a passagem de ônibus subiu 20 centavos, chegando a R$ 4,95 após esse reajuste.
Antes mesmo do fim de 2024, a mesma Câmara aprovou o projeto de lei que concedia subsídio extra, no valor de R$ 3,3 milhões, ao Consórcio Guaicurus, por parte da Prefeitura.
Isso fez os valores de repasses para a concessionária saltarem de R$ 19,5 milhões para R$ 22,8 milhões, sem contar os valores repassados pelos governos estadual e federal.
*Saiba
A próxima oitiva acontece no dia 5 de maio, às 14h. Quem será ouvido é o presidente da Agência de Regulação dos Serviços Públicos Delegados de Campo Grande (Agereg), José Mário Antunes.


