O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), expediu decisão para que a União desaproprie terras que tenham sido alvo de incêndios, porém, só nos casos criminosos ou em situação de desmatamento ilegal. Além disso, é preciso ter a comprovação da responsabilidade do proprietário. A medida jurídica é talvez a mais dura editada até hoje para combater os incêndios florestais no Pantanal.
A decisão, portanto, esbarra em um dos principais problemas jurídicos: a dificuldade de se identificar a autoria dos incêndios florestais no território pantaneiro.
Apesar de toda a polêmica causada pela determinação de Flávio Dino, expedida nesta segunda-feira, na prática, as investigações das Polícias Federal e Civil conseguem alcançar poucas conclusões.
A autoria dos incêndios florestais em áreas remotas do Pantanal acaba não sendo identificada, fazendo com que não sejam geradas penalidades criminais.
Até mesmo as multas administrativas ambientais demoram anos para serem pagas, quando simplesmente não ficam em um limbo por conta dos recursos que são possíveis de serem impetrados.
A determinação do STF ocorreu por julgamento de processo de arguição de descumprimento de preceito fundamental.
O requerente foi o partido Rede Sustentabilidade, com protocolo feito em setembro de 2020, e tinha como intimados os estados do Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Pará, Rondônia e Tocantins.
As discussões envolviam medida de expropriação, ou seja, retirar a propriedade sem pagamento. Em um dos processos, o governo do Estado ainda solicitou que houvesse recurso do Fundo da Amazônia, no valor de R$ 46 milhões, para a compra de aeronave a ser destinada para o combate a incêndios florestais. Nesse caso, Dino determinou que a União avaliasse o pedido.
Depois de analisar as defesas, Dino determinou que a União promova a desapropriação e que os estados devem criar barreiras para impedir a regularização de propriedades que apresentam problemas.
“Determino a intimação da União para que promova as medidas administrativas necessárias à desapropriação, por interesse social, de imóveis atingidos por incêndios dolosos ou desmatamento ilegal quando a responsabilidade do proprietário esteja devidamente comprovada”, disse Dino em trecho da decisão.
“Determino a intimação da União e dos estados que integram a Amazônia Legal e o Pantanal para que: adotem instrumentos normativos e operacionais que impeçam a regularização fundiária de áreas em que se constate, de forma inequívoca, a prática de ilícitos ambientais; e promovam ações de indenização contra proprietários de terras que sejam responsáveis por incêndios dolosos e desmatamento ilegal”, completou o ministro em sua sentença.
Está correndo, agora, prazo de 15 dias úteis para que a União faça manifestação para liberar ou não a compra de avião para Mato Grosso do Sul, além de que haja detalhamento sobre a implantação do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) em âmbito nacional, o que cabe ao Operador Nacional do Sistema de Registro de Imóveis (ONR).
FISCALIZAÇÃO
No Estado, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) tem avançado na fiscalização para identificar os pontos de ignição dos incêndios florestais no Pantanal. Nos casos de 2024, foi identificado que 149 pontos de ignições começaram em fazendas particulares. Esse fogo avançou por 1,3 milhão de
hectares.
“Em 2024, 332 propriedades foram classificadas como prioritárias para monitoramento pelo Programa Pantanal em Alerta. Dessas, 202 (60,84%) sofreram impactos diretos dos incêndios ao longo do ano. Este é um dado importante, o qual indica que a metodologia adotada na identificação das áreas prioritárias tem um nível satisfatório de acerto”, divulgou o MPMS, em nota.
Enquanto a tecnologia tem auxiliado a identificar o início do fogo, a autoria ainda é um desafio.
“Embora a identificação de incêndios dolosos ou culposos que resultariam em processos criminais e multas seja difícil, o MPMS mantém seu compromisso na atuação firme para a responsabilização cível, especialmente com foco na prevenção. Até o momento, 75 investigações foram instauradas, entre inquéritos civis e notícias de fato, referentes aos 105 casos acompanhados, e que ainda estão em andamento”, detalhou o órgão fiscalizador.
As fiscalizações, até agora, resultaram em autuações aplicadas pela Polícia Militar Ambiental (PMA) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), totalizando mais de R$ 100 milhões em multas.
FAMASUL
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Marcelo Bertoni, está em Brasília (DF) e divulgou vídeo para criticar a medida e comentar que a decisão trouxe insegurança jurídica.
“Isso não é aceitável, principalmente porque não há uma lei de regulamentação de que forma que vai ser feita [a desapropriação]. Uma decisão do STF monocrática do Dino. Estamos trabalhando para regulamentar uma lei, quais critérios, de que forma vai ser feito. Trazer uma segurança jurídica”, declarou.





