Regulamentado pelo governo federal neste mês, o execício de poder de polícia para servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) permite que a autarquia possa fiscalizar, interditar ou restringir o acesso de terceiros a terras indígenas por prazo determinado.
Para o Correio do Estado, o advogado Newley Amarilla, especialista em Direito Agrário, informou que o poder de polícia para a Funai tem a intensão de intensificar o trabalho de fiscalização da fundação.
“A lei regulamentada dá mais poder de fiscalização naquilo que já é da competência da Funai. Outogar o poder de polícia não significa também transformar os servidores da Funai em polícia, no [mesmo] sentido em que a gente vê a Polícia Militar e Polícia Civil”, afirmou.
De acordo com a Funai, após a publicação do decreto, a fundação passa a colocar as mudanças em vigor internamente, após a realização de uma capacitação de seus servidores.
“A autarquia indigenista ainda divulgará normativas internas para detalhar fluxos e procedimentos. Além disso, a implementação da medida exigirá a capacitação dos seus servidores. A regulamentação do poder de polícia é fundamental para a proteção dos servidores e dos povos indígenas”, publicou a Funai em posicionamento sobre a regularização.
Em termos de infração, o texto também classifica que a Funai poderá atuar em casos de remoção de grupos indígenas de suas terras; de violação ao usufruto exclusivo das riquezas naturais, conforme disposto na Constituição; de utilização imprópria da imagem dos indígenas ou de suas comunidades sem a devida autorização, inclusive para fins comerciais, promocionais ou lucrativos; e de dilapidação dos bens ou descaracterização dos limites das terras indígenas, além de danos às placas e aos marcos delimitadores de terras indígenas ou a sua remoção.
Com esse decreto já está em vigor, a Funai passa a ter o poder dentro das terras indígenas de impedir invasões, grilagem, garimpo, entre outras atividades ilícitas.
ALTERAÇÃO
A mudança, de acordo com a Funai, vem para reforçar a atuação na promoção e na proteção dos direitos dos povos indígenas, ao promover maior autonomia na execução de suas atribuições.
O decreto permite determinar a retirada compulsória de pessoas não autorizadas das terras indígenas, realizar – de forma excepcional e fundamentada – a destruição, a inutilização ou a destinação de bens utilizados na prática de infração, entre outros pontos.
O poder de polícia da Funai foi regulamentado para atender uma determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). O decreto estabeleceu critérios e definiu os procedimentos a serem adotados para o exercício dessa autorização administrativa.
Esse poder de polícia para a fundação indigenista já era previsto em lei desde a sua criação, em 1967. A publicação do Decreto nº 12.373/2025 apenas regulamentou a autorização.
SEM PORTE DE ARMA
Apesar das novas atribuições, o poder de polícia para a Funai não substitui nem coloca no mesmo patamar das ações dos órgãos de segurança pública.
De acordo com o decreto do governo federal, outra possibilidade autorizada para a autarquia é a solicitação direta da Funai para que órgãos de segurança pública – especialmente a Polícia Federal, as Forças Armadas e as forças auxiliares – atuem na cooperação necessária à proteção das comunidades indígenas.
A regulamentação do poder de polícia administrativo da Funai, porém, não autoriza o porte de arma para os servidores. De acordo com a autarquia, para ocorrer uma autorização de porte, seria necessário uma previsão em lei. Assim, tramita no Senado justamente um projeto de lei que trata sobre esse tema.
DEMARCAÇÕES
O novo decreto já desencadeou posicionamentos de ruralistas contrários à regulamentação do poder de polícia para a autarquia federal.
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion (PP-PR), declarou apoio à apresentação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 52/2025, que busca anular os efeitos do Decreto nº 12.373/2025, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Lupion considera a medida “claramente inconstitucional” e uma afronta ao direito de propriedade no Brasil.
“Esse decreto usurpa a competência do Poder Legislativo”, afirmou o parlamentar.
A mudança pode surtir efeitos em territórios que passam por processos de demarcação de terras indígenas que ainda não foram homologados.
De acordo com Amarilha, essa regulamentação deve ser bem debatida no setor agropecuário.
“Penso que esse assunto vai ser bem debatido no Congresso, uma vez que a Frente Parlamentar da Agropecuária entende que não há o que regulamentar e que precisaria de uma nova lei para isso”, analisou.
Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ao todo, ocorreram 25 conflitos relativos a direitos territoriais em 2023 no Estado. Nesse período, foram registrados 16 casos de violência contra comunidades indígenas sul-mato-grossenses.
No ano passado, conflitos fundiários entre indígenas e ruralistas ocorreram em Mato Grosso do Sul em terras indígenas localizadas em Douradina, Antônio João, Sete Quedas, Caarapó, entre outras localidades.


