Duas jornalistas do Correio do Estado foram ameaçadas nessa sexta-feira pela diretora da Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) da Vila Nasser, em Campo Grande.
Ao telefone, a referida senhora chegou a dizer que iria “ferrar” com as repórteres, após matéria publicada na edição anterior em que apontava, de acordo com informações da delegada Fernanda Félix, da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA), que uma criança confirmou em depoimento ter sido abusada sexualmente na unidade escolar.
As jornalistas e o setor jurídico do jornal já procuraram a polícia para os procedimentos cabíveis.
O contato telefônico durou 19 minutos, nos quais a diretora afirmou, por diversas vezes, e em tom de ameaça, a seguinte frase: “Eu peguei o nome completo de vocês, sei onde trabalham. Vou ferrar com vocês”.
De acordo com a profissional que conversou com a mulher, ela estava bastante alterada, tentou descredenciar o trabalho jornalístico feito pela reportagem, tanto como o da delegada e o da própria Secretaria Municipal de Educação (Semed), órgão que foi ouvido na matéria por representar todas as Emeis de Campo Grande.
A diretora alegava que o fato apontado no inquérito policial não era verdade e pediu que o jornal fizesse uma “retratação contando a verdade”, e ainda disse que dava o prazo para a tarde dessa sexta-feira para que outra reportagem fosse publicada, desmentindo o primeiro material.
A reportagem publicada na sexta-feira, no Correio do Estado, com o título “Polícia confirma casos de abuso sexual em creches” mostra que, em depoimento à polícia, uma criança de três anos relatou que no dia 30 de maio uma funcionária da Emei teria passado a mão em suas partes íntimas.
Segundo a delegada, essa conversa com a vítima é feita apenas uma vez, na presença de psicólogos e com uso de técnicas em que a criança expõe o ocorrido sem ser sugestionada por terceiros.
A denúncia já havia sido motivo de outra reportagem, no dia 2 de junho, portanto, publicada um dia após a denúncia feita pela família da criança. Na época, como a denúncia havia acabado de chegar à delegacia, havia pouca informação sobre o fato, que ainda seria investigado.
SEMED
Por se tratar de uma instituição vinculada à Prefeitura de Campo Grande, a reportagem teve o cuidado de procurar a Semed para mais esclarecimentos.
A Pasta encaminhou uma nota informando que todas as providências foram tomadas imediatamente após ter conhecimento da denúncia, quando a funcionária foi afastada de suas funções na unidade.
“Esclarecemos que o caso da unidade localizada na Vila Nasser não envolve professora. Na esfera administrativa, a Semed abriu procedimento disciplinar, que está em tramitação, sob sigilo legal para a proteção das vítimas”, dizia trecho da nota publicada na sexta-feira.
Mesmo tendo ouvido a prefeitura, que é quem responde pela instituição, a diretora afirmou que a Semed estava “errada” e que eles “não sabiam do que estavam falando”.
Após o fato, a reportagem procurou novamente a Pasta, que, em nota, declarou que “lamenta a forma como as repórteres foram tratadas”. “Esta não é a conduta que se espera dos profissionais que atuam na Rede Municipal de Ensino [Reme]. Tal atitude não representa a Secretaria ou a Reme nem os profissionais da Educação pública municipal”.
“A Semed respeita o trabalho da imprensa, que é de vital importância para nossa sociedade, e presta solidariedade neste momento. Informamos que as medidas administrativas em relação ao caso serão tomadas de forma imediata”, completa a Secretaria.
ATAQUE A JORNALISTAS
Ataques a jornalistas ou a órgãos de imprensa têm crescido nos últimos anos. Segundo a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), 2021 foi o ano mais violento para jornalistas brasileiros, com 430 ocorrências registradas em todo o País, duas a mais que as registradas em 2020, até então o ano mais violento para a profissão desde o começo da série histórica dos registros dos ataques à liberdade de imprensa, segundo o órgão.
Do total de 430 registros, dois ocorreram em Mato Grosso do Sul, conforme dados da Fenaj. A entidade ainda não divulgou os dados desde ano envolvendo ataques contra a profissão.
Para o presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul (Sindjor-MS), Walter Gonçalves, o caso atenta contra a liberdade de imprensa.
“O jornal está cumprindo seu dever de informar, existe um inquérito, delegada já falou e tem um BO [boletim de ocorrência]. O caso atenta contra a liberdade de imprensa, liberdade de informar, já que o assunto já é publico, a própria delegada falou sobre o fato. O sindicato repudia essa atitude e se coloca à disposição, assim como o seu departamento jurídico, das jornalistas. Vamos acompanhar esse caso, e qualquer atentado contra as repórteres nós vamos tomar as providências cabíveis. O papel da imprensa é informar”, declarou Gonçalves.
CASOS INVESTIGADOS
A DEPCA investiga um segundo caso de abuso sexual que teria ocorrido em uma escola pública da Capital. De acordo com registro policial, uma criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA), de nove anos, revelou à mãe ter sido abusada sexualmente onde estuda, no Vila Sílvia Regina, em Campo Grande.
Ainda segundo a denúncia, a menina apresentava sinais de irritabilidade e nervosismo. Ao chegar em casa, a criança relatou sentir dores nas partes íntimas. Nesse momento, a mãe notou uma vermelhidão no local e acionou a Polícia Militar.
A mãe contou que a menina estava há cinco meses na escola e que, segundo a filha, a agressão teria sido cometida por um homem, que passou o dedo em suas genitais e a agrediu na unidade de ensino.
Em nota, a Semed afirmou que até o momento o caso não foi registrado pela família na unidade escolar e que a aluna não compareceu à aula na quinta-feira (9) nem nessa sexta-feira.
“A escola tem apenas um funcionário homem que não tem nenhum contato com a aluna. Ela tem como apoio uma profissional do sexo feminino e tem acompanhamento integral no período que está dentro da unidade escolar. A Semed e as unidades escolares da Reme prezam por garantir o integral atendimento aos alunos na área da educação, bem como a segurança e a proteção de cada um deles no ambiente escolar”, disse a Pasta.
O caso segue em investigação na Delegacia Especializada da Capital.
Direito de resposta
A Diretora da Escola Municipal de Educação Infantil "Fátima de Jesus Diniz Silveira" - EME Vila NAsser: Professora Zanderli de Paiva Ribeiro, em razão da notícia: "Diretora de Emei ameaça jornalistas do Correio do Estado", publicada no Jornal Correio do Estado em 11 de junho do corrente ano, esclarece que não realizou qualquer ligação para o jornal Correio do Estado, não possuindo qualquer vinculação com a citada ameaça ou intimidação sofrida por qualquer profissional de imprensa.
A gestora educacional informa que procedeu com o registro da ocorrência policial n. 1844/2022 - 2DP/CG, em razão dos delitos de calúnia (Art. 138 do Código Penal) e difamação (Art. 139 do Código Penal) e adotará todas as medidas judiciais cabíveis para preservação e reparação de sua reputação como educadora.