Na quarta-feira (10), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) publicou lista de 16 empreiteiras que viraram alvo de processo administrativo por formação de um suposto cartel para manipular licitações de obras rodoviárias e duas delas firmaram contrados de quase R$ 200 milhões com o Governo de Mato Grosso do Sul somente em 2025.
O Tribunal de Contas da União identificou um conjunto de empresas com atuação suspeita em licitações públicas para obras e serviços de engenharia realizados em nível federal, regional e municipal entre 2016 e 2024. Somente de 2021 a 2024, o valor desses contratos somou R$ 10 bilhões, segundo reportagem do UOL.
Uma delas, a LCM Construção e Comércio, apontada como principal responsável pela formação deste suposto megacartel, toca o recapeamento de 50 dos 111 quilômetros da MS-436, rodovia que liga Camapuã a Figueirão, na região norte de Mato Grosso do Sul.
A obra está com cerca de 35% dos trabalhos concluídos e a empresa vai faturar pelo menos R$ 108 milhões. O contrato inicial, assinado em fevereiro deste ano, previa R$ 101 milhões pelo recapeamento da rodovia que está sendo reconstruída após 12 anos de uso e está recebendo um investimento da ordem de R$ 240 milhões. Os outros 61 quilômetros estão a cargo da empreiteira paulista Vale do Rio Novo.
Além disso, a empreiteira LCM também tem contratos ativos da ordem de R$ 47 milhões para manutenção de quase 300 quilômetros das rodovias BR-262 e BR-158 em Mato Grosso do Sul. Estes contratos, porém, foram firmados com o DNIT.
A outra empresa que aparece na lista do Cade é a Ética Construtora, que em agosto deste ano venceu licitação de R$ 90,55 milhões para implantação de 31 quilômetros de asfalto na MS-245, no município de Bandeirantes, na região central de Mato Grosso do Sul.
A disputa atraiu dez empreiteira e mesmo assim o deságio sobre o preço máximo foi de apenas 1%. O teto estipulado no edital da Agesul era de R$ 91.470.493,63. Mas, depois da “disputa”, a Ética Construtora ficou em primeiro lugar ao oferecer um desconto pouco superior a R$ 915 mil.
As duas obras (MS-436 e MS-245) estão sendo bancadas pelo empréstido de R$ 2,3 bilhões concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao Governo de Mato Grosso do Sul.
A Ética Construtora é antiga conhecida do Governo do Estado, pois há anos é contratada anualmente pela Agesul para fazer a manutenção de cerca de 580 quilômetros de estradas na regional de Costa Rica.
Ela também participou de outras licitações do pacote de obras bancadas com recursos do BNDES e que foram lançadas ao longo deste ano, assim como as outras nove que se inscreveram para a obra da MS-245. Porém, nos outros certames não chegou entrar na disputa financeira.
SÉRIE DE TENTATIVAS
Uma terceira empreiteira que aparece na lista do Cade divulgada na quarta-feira, a Ethos Engenharia de Infraestrutura, também ensaiou a entrada no setor de obras públicas de Mato Grosso do Sul, mas desistiu no meio do caminho.
A Ethos participou de pelo menos três licitações para recapeamento das rodovias MS-295 e MS-156, no sul do Estado, concluídas pela Agesul no segundo semestre deste ano.
Em todas a empreiteira chegou à fase da disputa de preços, mas em nenhuma fez proposta para redução do valor máximo estipulado pela Agesul. Estas três obras também fazem parte do pacote de obras do BNDES.
Conforme informações do UOL, o Cade abriu processo administrativo contra as 16 empresas e 15 pessoas físicas suspeitas de terem manipula licitações que somam R$ 10 bilhões em contratos do DNIT entre 2021 a 2024. Isso equivale um terço de todas as licitações do órgão no período. Só com o DNIT em Mato Grosso do Sul são quase R$ 250 milhões em contratos firmados com a LCM.
A apuração indica que as empresas investigadas firmavam contratos entre si para redistribuir internamente os serviços após vencerem licitações — o que fere a Lei de Licitações.
Quando uma das empresas do grupo era declarada vencedora, a execução era repassada a outra empresa do cartel por meio de Sociedades em Conta de Participação (SCPs). A investigação também analisa possíveis danos ao erário, já que combinações de preços entre participantes tendem a inflar custos e levar o poder público a pagar mais caro pelos serviços.
Essas SCPs — instrumentos legais para permitir investimentos sem tornar o sócio público — vinham sendo utilizadas, segundo o Cade, para ceder até 99% do valor da obra, ocultando o verdadeiro executor.
A prática também permitia que o cartel definisse, entre suas dezenas de empresas espalhadas pelo país, qual delas seria responsável por cada obra, desde que uma tivesse vencido o certame. O Cade divulgou o nome de 16 empreiteiras, mas a investigação aponta que seriam pelo menos 35.
Segundo o UOL, no centro da investigação está a LCM Construção e Comércio S.A., empresa mineira que desde 2015 assinou R$ 17,4 bilhões em contratos com o governo federal.
De acordo com documentos apreendidos na sede da companhia em uma operação conjunta do Cade e da CGU (Controladoria-Geral da União) no fim do ano passado, a construtora é apontada como líder do grupo e responsável por coordenar um esquema de repasses internos de obras por meio de subcontratações consideradas irregulares.
A LCM, de acordo com a investigação, mantém mais de 200 SCPs como forma de estruturar esses repasses, além de participar como sócia oculta em outras companhias.
Segundo o Cade, foram identificadas estratégias como propostas de cobertura — em que empresas apresentam lances sem intenção de vencer, com erros propositais — e desistências combinadas durante pregões e concorrências. A Ethos, por exemplo, desistiu no meio do caminho dos três certames que participou neste ano em Mato Grosso do Sul.
Quem são os envolvidos?
As empresas citadas no processo do Cade são: BRA Construtora, CCL (Construtora Centro Leste), Construto Losângulo, Terrayama, Enpa Engenharia e Parceira, Ethos Engenharia de Infraestrutura, Ética Construtora, HWN Engenharia, Ibiza Construtora, LCM Construção e Comércio, MA Engenharia, Minas Pará, MTSul, Pavidez, Pavienge e TWS Indústria e Comércio.
Além da investigação no Cade, o proprietário da LCM, Luiz Otávio Fontes Junqueira, é investigado pela Polícia Federal por suspeita de fraude em dois pregões do Dnit no Amapá, que somam R$ 35 milhões. O empresário foi alvo de busca e apreensão em julho deste ano.
A apuração do caso pelo Cade — órgao ligado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que tem como função garantir a livre concorrência no país — teve início com uma denúncia feita pelo TCU (Tribunal de Contas da União).


