A Polícia Federal abriu um canal para receber denúncias anônimas sobre grilagem de terras da União no Pantanal. As denúncias podem ser realizadas por meio deste endereço.
O esquema de grilagem, que tinha aval de servidores do governo de Mato Grosso do Sul, é combatido na Operação Pantanal Terra Nullius, desencadeada nesta quinta-feira (8) pela Polícia Federal.
O esquema envolve o Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural (Agraer), André Nogueira Borges na gestão de Reinaldo Azambuja (PSDB); a fazendeira Elizabeth Peron Coelho; e o proprietário de uma empresa de topografia agrícola, a Toposat, Mario Maurício Vasques Beltrão.
A ação criminosa, segundo a Polícia Federal, consiste em fraudar a emissão e a comercialização de Cotas de Reserva Ambiental (CRA) ou Títulos de Cota de Reserva Ambiental Estadual (TCRAE).
O empresário da Toposat, a fazendeira e os servidores da Agraer — à época presidida por André Nogueira Borges — falsificavam documentos e os inseriam em processos administrativos de titulação para conquistar áreas localizadas dentro do Parque Estadual do Rio Negro, situado em faixa de fronteira.
Ao emitirem os títulos de compensação, os envolvidos no esquema omitiram que as áreas com reserva legal para compensação pertencem, de fato, à União.
“O que torna a Agraer incompetente para decidir sobre tais terrenos”, informou a Polícia Federal.
“Ainda assim, os processos tramitavam normalmente no órgão, possivelmente com o envolvimento de propina”, complementa a Polícia Federal.
“O esquema funcionava da seguinte forma: se ninguém identificasse a origem pública da terra, a titularização era concluída de forma ilegal. Caso a fraude fosse percebida durante o trâmite, o processo era cancelado sob a justificativa de irregularidade, alegando-se erro no reconhecimento da titularidade da área”, explica nota da Polícia Federal.
Ao todo, foram cumpridos dez mandados de busca e apreensão em Campo Grande e um em Rio Brilhante (MS), além do sequestro de bens e bloqueio de valores que podem superar R$3 milhões.
Os envolvidos poderão responder, entre outros, pelos crimes de associação criminosa, usurpação de bens da União, falsidade ideológica, inserção de dados falsos em sistema público e infrações ambientais.
Saiba quem são os investigados
- - Mario Mauricio Vasques Beltrão - da Toposat, empresa investigada
- - Bruna Feitosa Brandão - também ligada à Toposat
- - Nelson Luís Moía - funcionario da Toposat
- - Elizabeth Peron Coelho - fazendeira
- - André Nogueira Borges - servidor de carreira do governo, presidiu a Agraer na gestão de Reinaldo Azambuja (PSDB)
- - Jadir Bocato - servidor de carreira da Agraer
- - Josué Ferreira Caetano - engenheiro de carreira da Agraer
Há 4 anos, governo “comemorou” negócio que originou esquema
Em 2021, a transação que envolve a fazendeira e o ex-diretor do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul foi celebrada pelo governo do Estado.
“O Governo do Estado, por meio do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), regularizou mais 42.609 hectares do Parque Estadual do Pantanal do Rio Negro. Nesta semana, foram assinadas as escrituras públicas de desapropriação amigável de 2.995 hectares da Fazenda Santo Antônio do Rio Vermelho e de 39.614 hectares da Fazenda Redenção / Gleba ‘A’, propriedades rurais que integram a Unidade de Conservação de Proteção Integral administrada pelo Imasul. Assinaram as escrituras o diretor-presidente do Instituto, André Borges, e a representante legal pelas propriedades, Elizabeth Peron Coelho”, afirma reportagem do governo de Mato Grosso do Sul, de setembro de 2021.
A operação para aquisição das terras e regularização do parque, na época, foi garantida por meio de acordo envolvendo o governo de Mato Grosso do Sul e a Companhia Energética do Estado de São Paulo (Cesp). Os recursos da compensação ambiental à época, aproximadamente R$ 36 milhões, foram investidos no processo de desapropriação.
A reportagem do governo à época já identificava o esquema agora alvo da Polícia Federal. “Agora, como estratégia para a regularização fundiária das demais áreas do Parque, já foram iniciadas as tratativas para que a área restante da Unidade de Conservação seja repassada ao Estado por meio de compensação de reserva legal, procedimento pioneiro no país”.
Jaime Verruck, que ocupava na época a mesma pasta que ocupa hoje, ligada ao Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente, comentou o processo com a seguinte declaração:
“A compensação de reserva legal é um mecanismo inteligente que permite a regularização fundiária e que traz um componente fundamental na política ambiental do Governo do Estado, que é a sustentabilidade”.
O outro lado
O governo de Mato Grosso do Sul enviou a seguinte nota à redação:
O Governo de Mato Grosso do Sul, por meio da Semadesc (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tenologia e Inovação) e Agraer, reforça que está acompanhando e colaborando com os trabalhos da Polícia Federal desde o início desta manhã, quando foi deflagrada a operação referente a áreas localizadas no Pantanal. Todavia, ressaltamos que, até o momento, não tivemos acesso aos autos da investigação que trata sobre a regularização fundiária.
Com foco na manutenção da lisura dos processos administrativos referentes ao tema, no âmbito da Agraer já foi determinado abertura de uma apuração interna dos fatos ora em investigação pela PF.
Compensação
A estratégia de compensar áreas de preservação ambiental no meio rural continua e avança. Na semana passada, a senadora Tereza Cristina (Progressistas-MS) celebrou um acordo envolvendo os estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul para tais compensações.
A iniciativa foi divulgada nesta semana pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), durante o evento “Cenário Geopolítico e a Agricultura Tropical”, promovido pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) em parceria com o jornal O Estado de S. Paulo.
“Boa notícia para o Mato Grosso do Sul!”, escreveu Tereza Cristina ao compartilhar a declaração de Tarcísio, que ressaltou a atuação conjunta com o governador sul-mato-grossense Eduardo Riedel e destacou a importância da senadora na construção do projeto.
“Essa é uma parceria com o governador Eduardo Riedel, com a bênção de Tereza Cristina — grande inspiração para nós, com quem tive a honra de trabalhar e que muito fez pelo Brasil e pelo agro, abrindo inúmeros mercados”, disse o governador paulista.
* Errata: ao contrário do divulgado pelo Correio do Estado anteriormente, André Nogueira Borges não presidiu o Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), apenas a Agraer.
O atual presidente do Imasul, André Borges Barros de Araújo não é alvo da operação. O alvo da operação é homônimo dele, André Nogueira Borges, ex-diretor da Agraer. Os dois órgãos estão ligados à mesma secretaria.
A reportagem foi editada às 19h17min para a correção da informação.
A reportagem foi editada às 19h50min, para acrescentar a nota oficial da Semadesc/Agraer sobre o ocorrido.


