Conhecido hoje como um dos empresários de mais sucesso de Campo Grande, Lindolfo Leopoldo Martin, 69 anos, conta um pouco de sua trajetória ao Correio do Estado nesta entrevista.
Nascido no interior do Rio Grande do Sul, mas criado no interior do Paraná, o gaúcho de nascença escolheu Campo Grande para criar seu primeiro negócio.
Com o apoio financeiro do pai, que já cuidava de um empreendimento em Maringá, ele decidiu se mudar para o recém-nascido estado de Mato Grosso do Sul em busca de melhores oportunidades.
Foi assim que criou a Multicasa, em 1978, uma loja simples. Seis anos depois, em 1984, deu início à Multicoisas, empresa que hoje tem mais de 200 lojas franqueadas espalhadas por todo o País.
Para Martin, o principal desafio é a busca por conhecimento. “O desafio continua sendo o conhecimento. Porque o conhecimento que você tem até aqui não te leva para frente, então, o desafio continua sendo como você desenvolve novos conhecimentos”.
Lindolfo Leopoldo Martin
Nasceu em Santa Cruz do Sul (RS), em 6 de julho de 1953.Casou-se em 1976 com Elza Tomoko Furucho Martin, formou-se em Administração em 1976, na Universidade Estadual de Maringá (UEM), e trabalhou na empresa da família até 1978.
No mesmo ano, criou a Multicasa, especializada em materiais elétricos e hidráulicos. A Multicoisas foi criada em 1984, que, ao longo dos anos, recebeu diversos prêmios.
Como veio a ideia de criar a Multicoisas?
Eu sou gaúcho de nascimento, nasci em Santa Cruz do Sul, e, daí, com 6 anos, minha família se mudou para Maringá [PR].
Lá a minha mãe começou a vender calçados na garagem. Eram os calçados que o meu pai tentava vender e não conseguia ou que recebia de devolução dos clientes para quem tinha vendido.
Minha mãe começou esse comércio, e essa visão empreendedora da minha mãe ficou melhor do que o negócio do meu pai, que era vender calçados no atacado, calçados do Sul. Eu diria que aprendi a fazer comércio com a minha mãe, ela me ensinou a ser comerciante.
Com o passar do tempo, esse depósito de calçados foi crescendo, começou a vender cama, mesa e banho, discos, artigos de Santa Catarina e, hoje, virou o Centro Comercial Tiradentes.
O fato marcante foi que, em 1978, já casado, com minha esposa grávida, o que aconteceu foi que as minhas ideias e as do meu pai não batiam. Eu tinha uma forma de ver a empresa e ver o relacionamento com as pessoas. Foi assim que eu pensei em fazer o meu negócio, saindo do zero.
Eu cheguei para o meu pai e pedi para ele me emprestar um capital para começar um negócio aqui em Campo Grande.
Eu escolhi Campo Grande porque tinha acabado de dividir o Estado, era início de 1978 e era um estado que tinha oportunidade e, como todo bom aventureiro, eu escolhi um estado novo, que tinha tudo para ser feito. E em fevereiro de 1978 eu cheguei em Campo Grande. Nunca me esqueço que fui muito abençoado nessa trajetória.
Chegando aqui, eu tinha o tempo para eu alugar uma casa, alugar uma loja e ter todos os elementos para montar uma empresa.
E tive muita sorte, porque, na ocasião, eu conheci a dona Laura Arakaki, que tinha a banca 100 no Mercado Municipal, e contei minha história para o casal, a Laura e o marido dela, e para a minha surpresa o casal disse:
“Lindolfo, pode vir, aqui é muito bom e nós vamos ceder a loja”. Eles iam morar em cima, em um sobrado, e eu ia alugar a loja e a casa que eles moravam.
Foi assim a história, com esse voto de confiança desse casal, eu vim para Campo Grande e criei a Multicasa, em 1978.
Como foi o começo da empresa?
Na época, não sabia muito bem com o que iria trabalhar, se seria material elétrico, hidráulico, cama, mesa e banho. Eu tinha um pouquinhos dessas experiências todas. Na primeira semana, entrou ladrão lá, tinha uma pequena banca de discos de vinil, e acabou com a sessão de discos.
O tempo foi passando e, em 1984, eu percebi que o cliente das pequenas coisas não era bem atendido, foi assim que eu criei, em 1984, a Multicoisas.
Nesse meio tempo, também houve uma coisa muito importante, que foi o início da informatização da empresa. Na época eram quase inexistentes [os recursos], e eu acabei criando uma empresa chamada Multicomp, que existe até hoje.
Em 1990, eu tinha uma vontade muito grande de expandir o negócio, e não tinha capital para isso. Eu já tinha tido a experiência de abrir filial em Cuiabá, com o meu cunhado, e eu percebi que com a filial você divide os recursos, de gente e de capital. Foi aí que resolvi fazer um sistema novo no Brasil, que é o sistema de franquia.
Meus primeiros franqueados foram de Londrina e Apucarana, os irmãos Celso e Marcos, que são franqueados até hoje.
Nós crescemos ao longo de todos esses anos, a gente tem cerca de duzentas e poucas lojas por todo o Brasil, em mais de 20 estados, ganhamos alguns prêmios de melhor franquia do ano.
E para Campo Grande isso foi um pouco diferente, porque aqui não é um polo onde existem muitas franquias, geralmente elas vêm do Rio de Janeiro ou de São Paulo, e eu fico muito orgulhoso de saber que tem Multicoisas Brasil afora e saber que ela nasceu aqui em Campo Grande.
Quais foram os principais desafios durante a sua jornada nesta empresa?
O desafio de todo empreendedor, primeiro, sempre é o capital, o recurso.
Eu nem falei do capital, mas o recurso que meu pai me emprestou lá no começou foi o valor de um Fusca, e eu tive que devolver, não foi doação, foi empréstimo. Mas eu acho que o principal não foi o recurso financeiro, foi o conhecimento.
O conhecimento é mais importante do que o dinheiro, porque o dinheiro desaparece, o conhecimento, não.
E eu tenho certeza de que o desafio continua sendo o conhecimento. Porque o conhecimento que você tem até aqui não te leva para frente, então, o desafio continua sendo como você desenvolve novos conhecimentos.
Tem uma expressão que eu gosto muito de usar, que nós somos uma empresa holística, uma empresa onde o maior patrimônio nosso não é o dinheiro no banco, não são os terrenos, não é máquina, o patrimônio está nas pessoas.
Então, o nosso conhecimento é intelectual, por isso nós fazemos eventos em que tentamos capturar a inteligência das pessoas, porque o ser humano só se realiza quando ele cria.
Quando ele empresta um pouco do seu conhecimento no que ele está fazendo, e neste aspecto nós somos uma franquia muito diferente, o nosso franqueado não está em uma camisa de força, nós damos espaço para ele criar também, então, este é um aspecto importante.
O desafio sempre vai ser a jornada do conhecimento, e eu continuo nessa jornada até hoje, buscando novos conhecimentos, fazendo curso de Psicologia Positiva, estou conhecendo mais de constelação empresarial, fazendo curso junto de empresas de startup.
No começo, o senhor chegou a imaginar o tamanho que sua loja teria, tornando-se uma franquia de sucesso?
Nós temos mais de 200 lojas espalhadas pelo Brasil, temos quatro Multicasas e mais de 200 Multicoisas.
A importância e a grandeza não estão em quantas unidades você tem, na magnitude de quantas pessoas você está empregando nem no valor do seu faturamento, mas no que você entrega para a humanidade em consciência e evolução da consciência das pessoas.
Parece muito incomum para a visão empresarial, que só pensa em resultado numérico, financeiro. Então, eu entendo muito da qualidade da semente que a gente está plantando e deixando de legado. Eu não fico atento a tamanho, a crescimento numérico, e sim na evolução das pessoas.
Durante a pandemia, como o senhor teve de reinventar seu negócio? Que medidas tomou?
A pandemia mexeu com todos os modelos, agora mesmo estava conversando sobre o mundo híbrido, o home office.
Nós temos que aprender, eu mesmo venho pouco aqui na empresa, trabalho em grande parte de casa, só que exige algumas habilidades do conhecimento do digital de todos os atores, do colaborador, da empresa, para que haja esse equilíbrio, para que a empresa não invada a casa e a casa não invada a empresa.
Tem que ter uma disciplina para ter um convívio, ser produtivo e não ser desgastante.
O que a gente percebe é que esse mundo que era só na empresa não vai existir mais, o híbrido chegou para ficar, e a gente está buscando construir esse formato de trabalho de forma bem construtiva.
Agora, como negócio, a gente teve que fazer profundas mudanças, principalmente, embarcando mais no digital, nas relações. A gente sofreu um choque bastante grande porque nós tínhamos 50% das lojas em shoppings, que ficaram fechados, então, a gente teve que fazer profundas adaptações para poder fazer essa travessia.
Hoje está voltando, até de uma forma bastante rejuvenescida, porque mudou, não é mais como a gente trabalhava antes, em relação aos processos. Hoje, tudo se tornou muito mais digitalizado.
Eu gosto de tirar bons proveitos de cada sofrimento que a gente tem que passar, porque a gente só cresce por meio do momento em que você sai da zona de conforto e vive outras situações, como a pandemia proporcionou.
Então, são duas coisas que aconteceram: na parte de pessoas para trabalhar, foi o home office; e, na relação com o cliente, cresceu o digital. Mas eu entendo que nosso atributo principal é ser uma loja de vizinhança e de solução, e é isso que a gente quer continuar sendo.
Como o senhor vê o futuro de sua empresa e como ela pode ajudar no desenvolvimento de Campo Grande?
Eu gosto muito da gestão compartilhada. A empresa permite esse espaço, chamar mais cabeças mais inteligentes para pensar o futuro. Inclusive, nós estamos promovendo agora dois eventos, um no dia 26 e outro no dia 9 [de setembro], já fizemos um com o conselho de franqueados, para a gente pensar esse futuro em conjunto, porque, independentemente de como vai ser esse futuro, ele tem que ser construído, senão você vai cair na vala comum.
Eu acredito muito na originalidade: você pode se inspirar, mas não ser cópia de nada. E o futuro que eu tenho, com certeza, é com mais cabeças e mais pessoas, e não tem uma solução mágica para esse futuro, porque ele está em permanente reconstrução.
Eu vejo o futuro de uma forma bem simples, eu gostaria de continuar lutando para desenvolver o estado de consciência das pessoas e para que as pessoas que estiverem comigo também tenham esse sonho, de como a gente pode tornar o planeta um lugar melhor.




