Depois que os responsáveis pela morte de Sophia de Jesus Ocampo foram condenados em júri popular com penas que somam 52 anos, o pai da criança de 2 anos, Jean Carlos Ocampo, segue na Justiça para condenar o Estado (governo e prefeitura) por omissão em atendimentos no sistema público de saúde, em segurança e em assistência social.
Em entrevista para o Correio do Estado, o advogado Josemar Fogassa, assistente jurídico de defesa do pai de Sophia, informou como está tramitando na Justiça a ação civil que acusa o governo do Estado e a Prefeitura de Campo Grande por omissão no caso.
“A ação civil contra o Estado está em fase inicial, e o próximo passo será a marcação de audiência feita pelo juiz, quando serão ouvidas testemunhas para recolher mais provas”, declarou.
A advogada Janice Andrade afirmou que o processo tem como tese principal a omissão do sistema público de saúde, que não desconfiou que Sophia sofria agressões físicas mesmo após a criança dar entrada 30 vezes em unidades de saúde.
“Foi realizado um levantamento de todas as omissões junto a uma peça processual que mostra como o Estado falhou. Sophia foi levada à UPA [Unidade de Pronto Atendimento] 30 vezes, com marcas no pescoço e vários hematomas, passando por pelo menos 15 profissionais da saúde”, informou Janice.
Segundo os advogados de defesa de Ocampo, o processo foi feito com várias provas, contando com depoimentos de agentes da Polícia Civil que trabalham na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).
No caso da Prefeitura de Campo Grande, que também está sendo processada, a acusação alega falha e omissão do Conselho Tutelar, que esteve presente na casa onde Sophia e mais duas crianças moravam com os réus condenados, Stephanie de Jesus da Silva e Christian Campoçano Leitheim, após uma denúncia de maus-tratos de animais.
A casa, conforme foi informado em júri popular que condenou Stephanie e Christian, estava em condições precárias de higiene tanto para os pets quanto para as crianças que viviam no local.
Relatórios da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul (DPGE-MS) que comprovam a presença de Jean Ocampo e seu esposo, Igor de Andrade, na entidade pedindo a guarda de Sophia e declarando que a casa deles estava apta para receber a criança de 2 anos também estão arrolados no processo.
“No papel, é perfeito o Estatuto da Criança e do Adolescente [ECA], mas na prática não tem [a proteção à criança]. Nós sentimos na pele, porque nós fomos atrás, e eles [governos estadual e municipal] não olharam para a Sophia. Eles fazem que nem pingue-pongue, ficam jogando as responsabilidades um para o outro, eles não têm comunicação”, declarou o pai de Sophia.
DIREITO DAS CRIANÇAS
A repercussão da morte de Sophia impactou a sociedade, que pressionou o poder público para o melhoramento do sistema de proteção à criança e ao adolescente na Capital e no Estado.
Em Campo Grande, por exemplo, a decisão de aumentar o número de Conselhos Tutelares e conselheiros e o recorde de eleitores que compareceram para votar no pleito (gestão 2024-2027) mostraram que o caso Sophia teve repercussão, ao denunciar a ineficiência de aparato público.
“Por um lado, me doí [a repercussão], porque a Sophia é minha filha e o que aconteceu com ela infelizmente não tem como voltar atrás. Por outro, é importante para não acontecer com outras Sophias. O que a gente espera é que a rede de proteção funcione de verdade e que não fique só no papel”, falou Ocampo.
“É nítido que o Estado foi omisso, o que aconteceu com a nossa filha infelizmente serviu de alerta para que eles trabalhem com a prevenção, sem esperar chegar no nível que aconteceu com a Sophia”, declarou Andrade.
CONDENADOS
Stephanie de Jesus da Silva e Christian Campoçano Leitheim foram condenados em júri popular pela morte da menina Sophia de Jesus Ocampo, que foi assassinada em janeiro do ano passado.
Com a condenação, o juiz titular da 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, Aluízio Pereira dos Santos, decretou pena de 32 anos ao padrasto da criança, que foi condenado pelos crimes de homicídio doloso (20 anos) e estupro de vulnerável (12 anos).
Já a mãe da criança pegou uma pena um pouco menor, de 20 anos de reclusão, pelo crime de homicídio doloso. Ambos os condenados cumprirão a pena em regime fechado.
Conforme Santos declarou ao fim do julgamento, o caso era complexo, porém, com a sentença proferida, o Judiciário ficou satisfeito com o resultado.
“É um processo complexo, de repercussão pública, exatamente por envolver uma criança, ainda mais na circunstância em que ocorreu. Então, eu sempre dei prioridade para dar um andamento ao processo e estou satisfeito com o resultado obtido”, afirmou.
Saiba
Sophia morreu no dia 26 de janeiro de 2023. Ela foi levada pela mãe até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Bairro Coronel Antonino. No local, as enfermeiras que realizaram os primeiros atendimentos constataram que a menina já apresentava rigidez cadavérica quando chegou à unidade. Posteriormente, a perícia confirmou que Sophia já estava morta há cerca de sete horas.