Enquanto o novo aterro sanitário para destinação do lixo de Campo Grande não é entregue, o município continua utilizando o aterro Dom Antônio Barbosa II, mesmo com a idade útil do lugar vencida desde junho. A previsão para sua desativação é 2023, e, para especialistas, esse tempo extra de utilização do local pode causar danos ambientais.
Conforme o engenheiro e ativista ambiental Moacir Lacerda, a utilização do Aterro Sanitário Dom Antônio Barbosa II por mais dois anos, atrelada à construção do novo aterro Ereguaçu, resultará em diversos prejuízos ambientais.
“Essa decisão de deixá-los no mesmo ambiente, além de prejudicar o solo, com a liberação de todos os componentes, vai fragilizar ainda mais todo o bairro”, ressaltou.
Em nota, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana (Semadur) esclareceu que a área do novo aterro é de responsabilidade da empresa concessionária Solurb.
Conforme a Semadur, os critérios para a escolha da área onde será instalado o Aterro Sanitário Ereguaçu partem de extensos e criteriosos estudos, com o objetivo de avaliar a melhor alternativa locacional no que tange aos critérios ambiental, social e legal.
“Assim, são apresentadas áreas favoráveis à implantação do aterro sanitário, em que a que oferecer melhor pontuação nessa avaliação passará pelas etapas posteriores de licenciamento ambiental”, diz a nota.
Para Lacerda, a construção do novo aterro sanitário próximo ao lixão em operação potencializa o processo de elitização de Campo Grande, além de representar um retrocesso em soluções sustentáveis. Conforme a Solurb, é previsto que o local seja totalmente desativado apenas em janeiro de 2023.
“A princípio, o novo aterro seria na saída para Três Lagoas, local com nascentes, em uma região mais nobre e que teve grande pressão do setor imobiliário. Agora, deixar o novo aterro perto do antigo é extremamente negativo. Uma cidade moderna, que está revitalizando todo o seu centro, não poderia deixar o lixão em um bairro humilde”, reiterou Lacerda.
Para o engenheiro, a Capital, que hoje é referência em arborização e indicadores ambientais, deveria implementar uma usina para o processamento dos resíduos.
“É preciso que os gestores se espelhem em exemplos mundiais, com soluções inteligentes para tirarmos benefícios do lixo, como a produção de energia, por exemplo. Coleta seletiva é apenas uma medida paliativa também”, ponderou.
HISTÓRICO
É importante salientar que durante a gestão do prefeito Nelson Trad Filho (PSD), em 2012, o contrato da prefeitura da Capital com a Solurb chegou a ser judicializado, após denúncias de superfaturamento e corrupção.
Uma das principais irregularidades apontadas foi referente à impermeabilização do terreno. Durante vistoria ainda em 2012, a Polícia Federal captou imagens que mostraram a inferioridade do material das mantas que protegem o solo.
Conforme preconizado pelo estudo de impacto ambiental, seria necessário o uso de mantas com 2 milímetros de espessura, diferentes do material instalado, que variou de 1 mm a 1,5 mm.
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) propôs uma ação civil pública (ACP) expondo, além do superfaturamento, a existência do direcionamento na licitação, haja vista que foi constatado o compromisso de compra e venda de 50 hectares onde o Aterro Ereguaçu deveria ser implementado.
Com a avaliação procedente, o juiz David de Oliveira Gomes Filho chegou a anular o contrato da prefeitura com a Solurb. No entanto, a concessionária recorreu, alegando que a medida resultaria na demissão em massa de 935 funcionários.
Por esta razão, em maio deste ano, o desembargador Vilson Bertelli, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado (TJMS), aceitou o pedido da Solurb e suspendeu o cancelamento do contrato entre a prefeitura e a empresa.
Ambientalistas também questionam local escolhido para Aterro Ereguaçu
A implementação do novo aterro de Campo Grande, batizado de Ereguaçu, foi discutida durante audiência pública ontem. O aterro que será construído na rodovia MS-455, na Estrada da Gameleira, na visão de ambientalistas, é um retrocesso para uma capital referência em indicadores sustentáveis.
O novo aterro sanitário de Campo Grande será projetado para receber o lixo da Capital e de mais sete cidades por 40 anos. Segundo reportagem do Correio do Estado de 2019, além de Campo Grande, o local receberá os resíduos de Terenos, Rochedo, Bandeirantes, Jaraguari, Rio Negro, Dois Irmãos do Buriti e São Gabriel do Oeste.
A reportagem não conseguiu confirmação da Solurb se as cidades atendidas continuam as mesmas.
Durante a audiência pública para apresentação do novo aterro, o superintendente da Solurb, Elcio Terra, pontuou que todos os campo-grandenses serão beneficiados com o projeto.
“Toda a vida comercial, residencial e industrial da cidade termina no aterro. Temos que iniciar essa conversa [sobre o novo local] porque o atual aterro no Dom Antônio II está com o seu prazo de encerramento definido”, pontuou.
A construção do Aterro Ereguaçu na MS-455, na Estrada da Gameleira, foi justificada pela Solurb em razão da distância do local em relação ao centro da cidade, 11 quilômetros, além do aval ambiental proporcionado pelos estudos.
O advogado, titular da Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e militante do direito ambiental Lairson Palermo salientou que há diversas questões que colocam em xeque a implementação do aterro Ereguaçu.
“Temos alguns elementos do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental [EIA/Rima] que apontam superficialidades, por exemplo, eles utilizam o plano diretor de 2006, quando já temos um atualizado de 2017, portanto, isso já demonstra certa generalidade no estudo", afirmou.
"Outra situação é a que envolve as áreas e impedimentos no entorno do perímetro, como o aeroporto, além da falta de elementos sobre os impactos na vegetação, que será alterada sem a devida compensação após o EIA/RIMA”, completou.
Sobre o Aterro Sanitário Dom Antônio Barbosa II, Palermo ressaltou que a partir do momento em que a licença expira – que são os limites do suporte ambiental – já existe o prejuízo.
“Quem deve arcar com esse prejuízo, no nosso ponto de vista, é a Solurb. Haja vista que a responsabilidade de construir o Aterro Ereguaçu é dela desde 2012. É necessário ainda verificar como a empresa poderá ressarcir os cofres públicos por não ter cumprido essa obrigação prevista na concorrência nº 66/2012”, disse.
Durante a audiência, a Solurb garantiu que o aterro atual possui capacidade para operar até 2022. Conforme a empresa, o aterramento e o controle de chorume e infiltração do solo estão sendo feitos para remediar os impactos do descarte de resíduos.




