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Literatura

Autor de "O Hobbit" e "O Senhor dos Anéis" ainda influencia a literatura fantástica

Embora "O Hobbit" e "O Senhor dos Anéis" tenham sido as únicas narrativas de fôlego publicadas pelo escritor ainda em vida, dezenas de volumes póstumos lançados nas últimas décadas mostram a amplitude dos experimentos literários

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Uma piada recorrente entre os fãs da literatura de fantasia costuma comparar o ritmo de escrita do americano George R. R. Martin, 74 anos, com o do britânico J. R. R. Tolkien. Enquanto o primeiro não consegue publicar um novo livro da série inacabada que serviu de base para “Game of Thrones” desde 2011, seis obras contendo material inédito de Tolkien, cuja morte está completando 50 anos, chegaram às livrarias nesse mesmo período. Resumo da ópera: o finado autor de “O Senhor dos Anéis” seria muito mais produtivo que seu concorrente ainda vivo.

A comparação sobre produtividade, verdade seja dita, provavelmente é injusta. Nos últimos tempos, Martin anda publicando outras coisas além de sua série mais aguardada, enquanto Tolkien, em vida, sempre teve um problema crônico com prazos, tendo levado 12 anos para escrever a saga do anel.

Ainda assim, nem Martin nem a maioria dos outros autores de fantasia que ganharam sucesso parecem ter a chance de manter sua popularidade durante, pelo menos, mais de meio século. Se for preciso apostar em alguém, Tolkien ainda parece como o melhor nome.

O porquê dessa permanência tolkieniana ainda tem um quê de mistério até para um dos principais estudiosos da obra do filólogo, o medievalista americano Corey Olsen, reitor da Universidade Signum, cujos programas de pesquisa se dedicam quase exclusivamente às diferentes formas de literatura especulativa.

“É uma pergunta fascinante. Trata-se de algo que o próprio Tolkien nunca entendeu. Ele tinha dificuldade de compreender a sua própria popularidade, e dá para detectar até um tom de surpresa feliz quando ele percebe esse sucesso”, afirma Olsen.

Embora Tolkien seja visto como o “pai da fantasia”, graças à influência desproporcional que exerce sobre o gênero desde 1954, quando saiu o primeiro volume de “O Senhor dos Anéis”, a verdade é que autores de língua inglesa com projetos estéticos parecidos, como William Morris e Lord Dunsany, chegaram a ter algum êxito bem antes, entre o fim do século 19 e o começo do século 20. Hoje, porém, tendem a ser vistos como prelúdios a Tolkien.

Olsen ressalta que mesmo o norte-irlandês C. S. Lewis, criador de “As Crônicas de Nárnia” e companheiro de Tolkien no círculo literário apelidado de Inklings, não se encaixa exatamente na mesma categoria.

“Os livros sobre Nárnia eram um bocado populares, mas Lewis ainda estava jogando o jogo de sempre, em certo sentido, [de que a] fantasia é um gênero para crianças. Lewis era ótimo nisso, e muitos adultos adoravam Nárnia, mas ainda assim a popularidade deles não era suficiente para lhes conferir o mesmo tipo de sucesso que Tolkien alcançou”, compara.

Fernanda da Cunha Correia, especialista na obra de Tolkien e que acaba de concluir seu doutorado na Universidade Presbiteriana Mackenzie, também aponta a capacidade do autor em conquistar públicos mais amplos que o infantojuvenil como um elemento-chave. “É uma questão de maturidade de texto ou de considerar a maturidade de quem vai ler o texto”, explica.

“A grande defesa dos contos de fadas por parte de Tolkien é que esse tipo de narrativa não é só para crianças, mas para todo mundo que tem imaginação. Ao mesmo tempo, os hobbits que protagonizam as obras são pequenos burgueses, ingleses de classe média que o leitor consegue compreender intuitivamente”, complementa.

Outro elemento importante pode ter sido simplesmente o timing da publicação de “O Senhor dos Anéis”, que acabou se tornando o livro certo na hora certa para uma ampla gama de leitores.

“A ocasião importa”, resume Olsen. “O começo dos anos 1950, pós-Segunda Guerra Mundial, significa que há uma ressonância aí. Se ‘O Senhor dos Anéis’ tivesse sido publicado 20 anos depois ou 40 anos antes, é muito possível que uma história que fala de resistir ao avanço da Sombra e do Senhor Sombrio [personagens da trama], de tentar sobreviver e preservar a beleza do passado diante da destruição causada pela guerra, provavelmente não teria tido nem de longe a mesma ressonância”, frisa o americano.

“Como diz o medievalista Tom Shippey, Tolkien não criou a fantasia, mas ele ainda é o que melhor mostrou até onde ela pode chegar”, ressalta Cristina Casagrande, doutoranda em Estudos Comparados em Literatura na Universidade de São Paulo (USP) e criadora do site Tolkienista.

“Em termos de world building [construção de um universo ficcional], ele é imbatível. 
Esse é um ingrediente muito especial desse bolo. E é algo que não termina nunca, [pois] a cada dia a gente descobre um detalhe novo desse mundo”, adiciona.

De fato, a inventividade desse autor ao esboçar dezenas de milhares de anos de história de diferentes espécies, detalhes geográficos, arquitetônicos e culinários, a evolução linguística e os aspectos teológicos e filosóficos parece ter sido limitada apenas por seu tempo de vida. Para Olsen, porém, outro aspecto é ainda mais importante: a busca por narrativas que tivessem sabor mítico.

“Basicamente, [o que faz diferença] é o mito, o amor de Tolkien pela mitologia. Quando o seu projeto central é criar uma nova mitologia, seu objetivo é escrever um tipo de história que conecta, explica e satisfaz algo profundo dentro da sua cultura. E é algo que vem desde a adolescência dele e perpassa sua vida inteira”, argumenta o pesquisador.

Embora “O Hobbit” e “O Senhor dos Anéis” tenham sido as únicas narrativas de fôlego publicadas por Tolkien em vida, as dezenas de volumes póstumos publicados nas últimas décadas mostram a amplitude dos experimentos literários por trás das obras mais conhecidas, incluindo recriações de poemas escandinavos e do ciclo arturiano, além de romances inacabados de ficção científica.

Essa enorme gama de textos deverá manter especialistas bastante ocupados no futuro, mas as adaptações audiovisuais tendem a ser cada vez mais a principal introdução de novos leitores à obra tolkieniana.

Um levantamento feito com cerca de 300 fãs brasileiros por Fernanda Correia para sua tese, por exemplo, revelou que as adaptações cinematográficas dirigidas por Peter Jackson são as principais responsáveis pelo primeiro contato das pessoas com a obra. Ainda, que quase 90% desses leitores conheceram os livros dos anos 2000 em diante, período que coincide com o êxito dos filmes.

O serviço de streaming Amazon Prime Video deve lançar em breve a segunda temporada de “O Senhor dos Anéis: 

Os Anéis de Poder”, que dramatiza narrativas dos apêndices dos livros, enquanto a Warner Bros. Entertainment planeja para 2024 a animação “A Guerra dos Rohirrim”, também explorando os apêndices. E, claro, há planos para mais filmes no futuro. “Eu costumo brincar que é o ‘tolkienverso’ surgindo”, diz Cristina.

O lado sombrio dessa inserção na cultura popular tem sido o uso da imagética tolkieniana por grupos de extrema direita nos EUA e na Europa e até mesmo entre bolsonaristas. Há os que retratam os heróis de Tolkien como defensores da supremacia da civilização europeia ou “nórdica” – termo que, aliás, o autor detestava justamente por suas conotações racistas.

Entretanto, faz bem mais sentido retratar o autor britânico como um profeta da crise ambiental. Tolkien enxergava árvores como indivíduos e dizia que sonhava em vê-las indo à guerra contra seus opressores. “O som selvagem da motosserra nunca silencia onde quer que as árvores ainda sejam encontradas crescendo”, escreveu ele um ano antes de sua morte.

OSCAR 2026

Wagner Moura tem 91,34% de chance de vencer o Oscar, aponta ranking

A liderança do ranking é de Leonardo DiCaprio, com 95,08% de probabilidade, seguido por Timothée Chalamet, com 93,62%

21/12/2025 23h00

A liderança do ranking é de Leonardo DiCaprio, com 95,08% de probabilidade, seguido por Timothée Chalamet, com 93,62%

A liderança do ranking é de Leonardo DiCaprio, com 95,08% de probabilidade, seguido por Timothée Chalamet, com 93,62% Divulgação

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As expectativas brasileiras para o Oscar 2026 crescem antes mesmo do anúncio oficial dos indicados, previsto para 22 de janeiro. Wagner Moura aparece entre os nomes mais fortes da disputa pelo prêmio de melhor ator, segundo um novo levantamento do site especializado Gold Derby.

De acordo com a projeção, o ator brasileiro tem 91,34% de chance de vitória, porcentual que o coloca na terceira posição entre os 15 nomes mais bem colocados na categoria. A lista reúne artistas que já figuram entre os pré-indicados e aqueles acompanhados de perto durante a temporada de premiações.

A liderança do ranking é de Leonardo DiCaprio, com 95,08% de probabilidade, seguido por Timothée Chalamet, com 93,62%. Wagner aparece logo atrás, à frente de nomes como Michael B. Jordan e Ethan Hawke.

As estimativas do Gold Derby são elaboradas a partir da combinação de previsões de especialistas de grandes veículos internacionais, editores do próprio site que acompanham a temporada de premiações e um grupo de usuários com alto índice de acerto em edições anteriores do Oscar.

O Agente Secreto está entre os pré-indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional e de Melhor Escalação de Elenco, em lista divulgada no último dia 16, pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.

A cerimônia do Oscar 2026 está marcada para 15 de março, com transmissão da TNT e da HBO Max, e terá novamente Conan O’Brien como apresentador. A edição também deve ampliar a presença brasileira na premiação: produções nacionais como O Agente Secreto já figuram em listas de pré-indicados da Academia, em categorias como Melhor Filme Internacional e Melhor Escalação de Elenco.

Ranking do Gold Derby para o Oscar 2026 de melhor ator:

1. Leonardo DiCaprio (95,08%)

2. Timothée Chalamet (93,62%)

3. Wagner Moura (91,34%)

4. Michael B. Jordan (83,35%)

5. Ethan Hawke (73,46%)

6. Joel Edgerton (25,24%)

7. Jesse Plemons (7,09%)

8. George Clooney (4,25%)

9. Jeremy Allen White (4,06%)

10. Dwayne Johnson (2,64%)

11. Lee Byung Hun (2,52%)

12. Oscar Isaac (0,83%)

13. Daniel Day-Lewis (0,39%)

14. Brendan Fraser (0,31%)

15. Tonatiuh (0,24%)
 

Correio B+

B+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anos

Bailarina, atriz e criadora do método Dança Integral, Keila Fuke transforma o movimento em linguagem de escuta, autocuidado e reinvenção feminina

21/12/2025 20h00

B+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anos

B+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anos Foto: Divulgação

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Keila Fuke fala de dança como quem fala de família. Não no sentido de abrigo confortável apenas, mas de território vivo - onde moram memória, desejo, silêncio e prazer. Quando ela diz que o corpo é templo, não soa místico. Soa prático. Soa vivido.

“A dança é uma arte que se expressa pelo corpo, e o corpo é nossa casa, templo sagrado e cheio de emoções, histórias e prazer”, diz. Para ela, quando uma mulher escuta e sente o próprio corpo, algo essencial se reorganiza: “ela realmente se conecta com sua essência primária, seus desejos, e consegue ir para a vida de forma mais consciente”.

Há mais de três décadas, Keila dança, atua, coreografa e cria. Sua formação artística começou ainda na infância e se expandiu por diferentes linguagens (dança, teatro, musical e direção), construindo uma trajetória consistente nos palcos brasileiros. Nos grandes musicais, viveu a intensidade da cena em produções como “Miss Saigon”, “Sweet Charity”, “A Bela e a Fera”, “Victor ou Victoria” e “Zorro” (experiências que aprofundaram sua relação com a disciplina, a entrega e a presença).

Foi também no teatro que sua trajetória profissional ganhou contorno definitivo. Keila estreou ao lado de Marília Pêra, em “Elas por Ela”, num encontro que deixaria marcas profundas em sua forma de compreender a arte. A convivência com Marília reforçou a noção de que o palco exige verdade, escuta e disponibilidade (valores que atravessam seu trabalho até hoje).

Mas só quem escuta com atenção percebe que sua trajetória não foi guiada apenas pela busca da forma perfeita ou do espetáculo bem acabado - e sim por uma pergunta insistente: o que o corpo ainda tem a dizer quando a vida muda de ritmo? Essa pergunta atravessa tudo o que ela faz hoje.

Ao falar sobre movimento, Keila não separa o gesto do afeto, nem a técnica da emoção. “A dança revela a comunicação entre o mundo interno e o externo. O gesto se torna linguagem, o movimento vira verdade.” Talvez seja exatamente por isso que tantas mulheres chegam às suas vivências depois de períodos de exaustão: ali não se pede performance, mas presença.

Existe algo de radicalmente gentil na forma como Keila olha para o corpo feminino. Especialmente aquele que atravessa a maturidade. A menopausa, tema ainda cercado de silêncio, aparece em sua fala como travessia, não como falha. “Todas as mulheres irão passar por esse portal ao entrar na maturidade”, afirma. “Não para corrigir o corpo, mas para reconhecê-lo.”

B+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anos         B+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anos - Divulgação

Foi desse entendimento que nasceu o método Dança Integral, desenvolvido a partir da integração entre sua experiência artística e seus estudos terapêuticos. Ao longo dos anos, Keila aprofundou-se em yoga, meditação, tantra, bioenergética e consciência sistêmica, incorporando esses saberes à dança. “É um trabalho que convida a mulher a ativar e integrar seus corpos (físico, mental e emocional) devolvendo consciência, presença e escuta.”

Na prática, o movimento deixa de ser esforço e passa a ser aliado. O corpo volta a circular energia, as emoções encontram expressão e a mente desacelera. “No movimento consciente, o corpo lembra que não nasceu para ser corrigido, mas habitado.” Quando isso acontece, o corpo deixa de ser campo de conflito e volta a ser morada.

A ancestralidade japonesa que Keila carrega atravessa profundamente esse olhar. Mestiça de origens japonesa, italiana, alemã e libanesa, ela se reconhece como uma mulher amarela e traz dessa herança a disciplina entendida como cuidado. O respeito ao tempo, ao silêncio e ao gesto essencial molda sua relação com o movimento, a prática e o feminino. Espiritualmente, o corpo é templo, o movimento é ritual e a repetição, um caminho de aperfeiçoamento interno.

Ao mesmo tempo, Keila é mistura. Emoção, calor e invenção brasileira convivem com rigor e silêncio. “Vivo entre tradição e vanguarda, entre raiz e criação”, diz. É dessa fusão que nasce um trabalho que não se fixa nem na forma nem no conceito, mas no estado de presença.

Essa escuta sensível também se manifesta fora das salas de dança. Há 17 anos, Keila atua na Fundação Lia Maria Aguiar, em Campos do Jordão, onde integra a formação artística de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Ali, ela participa da criação de um núcleo de teatro musical que utiliza a arte como ferramenta de educação, inclusão e fortalecimento da autoestima. “Com eles, aprendo que sensibilidade não é fragilidade, é potência.”

B+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anosB+: Keila Fuke transforma a dança em escuta do corpo, cura emocional e reinvenção aos 59 anos - Divulgação

Falar de reinvenção aos 59 anos, para Keila, não tem a ver com começar do zero. Tem a ver com fidelidade. “Se reinventar é um gesto de fidelidade à vida.” Ela fala de saúde emocional, de vulnerabilidade, mas também de prazer, curiosidade e desejo. “Depois dos 50, algo se organiza internamente: ganhamos coragem para comunicar quem somos e ocupar nosso lugar sem pedir permissão.”

Existe algo profundamente político nesse corpo que segue dançando sem pedir licença ao tempo. Que reivindica delicadeza sem abrir mão de força. “Dançar, assim, é um ato político e espiritual”, diz. “É a mulher dizendo ao próprio corpo: eu te vejo, eu te respeito, eu te celebro.”

Quando Keila afirma que cada passo é uma oração, a frase ganha densidade. “Hoje, a oração que guia meus passos é a gratidão em movimento.” Gratidão por estar viva, criando, aprendendo e colocando o talento a serviço da vida. “Que minha arte continue sendo ponte - entre corpo, alma e coração.”

Talvez seja isso que faz de Keila Fuke uma presença tão inspiradora: não apenas o que ela construiu nos palcos, mas a forma como permanece. Em movimento. Em escuta. Em verdade.

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