De um ano para cá, as redes sociais do arquiteto Elvio Garabini viraram um livro aberto sobre a arquitetura da cidade. Munido de uma câmera digital ou usando o próprio celular, ele sai todos os dias, sem seguir um roteiro programado, para desbravar a cidade, que ainda lhe é tão desconhecida.
“‘Andanças’ é o título de uma canção linda. Sempre gostei de deambular, flanar, antes mesmo de me tornar arquiteto”, explica Elvio, hoje com 71 anos.
O que o move a fazer isso é a memória que está por trás de cada paisagem ou edificação. “A cidade não conta o seu passado, ela o contém. E mais, tenho tido muitas surpresas agradáveis, ou não, mas é saudável deixar para os mais novos como as mutações na paisagem urbana ocorrem”, acredita.
As saídas acontecem todos os dias. As fotos são amadoras, no entanto, o conteúdo das legendas mostra a bagagem de quem ama a arquitetura e se respalda na leitura de “Cidades Invisíveis”, de Italo Calvino. “Quando não tem sol, fica mais difícil e, depois, eu percebo que faltou luz”, observa o arquiteto.
Sem roteiro, o que guia Elvio é a curiosidade e a vontade de saber o que aquilo que ele vê significa. “Saio para ver como amanheceu a Lagoa Itatiaia, por exemplo, e, no meio da andança, vejo que não era bem isso o que eu queria. Aí deambulo no seu entorno, com os cachorros latindo atrás de mim”, exemplifica.
Dia desses, o arquiteto foi até uma aldeia indígena, na qual comenta ter encontrado um memorial belíssimo. Às vezes, ele não é tão bem recebido assim. Na aldeia, por exemplo, um dos moradores ficou bravo porque não queria que a casa fosse fotografada. Os passeios são feitos a pé e, quando dá na telha, o arquiteto pega um ônibus ou Uber.
“Esses dias saí para ir ao Seminário e a Lagoa da Cruz, lá soube que a igrejinha da Tia Eva era por ali. Andando a pé, às vezes eu canso, tomo um busão e, dia destes, fui parar lá no Terminal General Osório”, conta.
Por acreditar e defender que o saber e a informação são um processo democrático a que todos têm direito, Elvio sempre relata o que os olhos de arquiteto enxergam: as características, os elementos e, muitas vezes, as críticas quanto ao abandono e à falta de manutenção das construções. Todas as publicações são abertas no Facebook, com o nome de “Espaço do Conhecimento”.
Elvio assina vários dos principais projetos arquitetônicos de Campo Grande, como Horto Florestal, Museu do Índio, canteiros centrais das avenidas Afonso Pena, Mato Grosso e Costa e Silva e o prédio da Secretaria de Estado de Receita e Controle, na 7 de Setembro. Agora, depois de aposentado, ele fala que tem tido tempo para conhecer a cidade e as cidades. “A cidade deve ser a maior invenção da humanidade”, afirma.
Nas andanças, houve surpresas e a prova do quanto Campo Grande ainda é desconhecida. “A minha grande surpresa foi perceber que não conhecemos a nossa cidade. Eu, por exemplo, vim a ‘descobrir’ o Seminário, a Igreja da Tia Eva, a Lagoa Itatiaia, o Estádio Elias Gadia e o Parque Ecológico do Anhanduí”, confessa Elvio.
Como arquiteto e cidadão, ele também tem acompanhado o passo a passo das obras na Rua 14 de Julho, no Centro, que por tantas vezes foi e é palco de seus registros e também de suas memórias.
“Outro lugar que me encantou foi a Rotunda da Noroeste Brasil. É necessário andar pelas ruas da cidade para tentar ver sua alma.”

Cristianne e Rinaldo Modesto de Oliveira
Isabella Suplicy


