Economia

ENTREVISTA

"A polarização é um veneno para a discussão da agenda econômica"

A economista disse ao Correio do Estado que a implementação das reformas fiscal, tributária e administrativa no Brasil é essencial, mas a divisão política dificulta o debate

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A renomada doutora em Economia Zeina Latif concedeu entrevista ao Correio do Estado em sua passagem recente por Campo Grande. Durante a conversa, a economista com vasta experiência no mercado financeiro falou sobre temas importantes da agenda econômica brasileira.

Quando o tema é economia, Zeina Latif é frequentemente mencionada por suas análises dos cenários doméstico e internacional. 

Entre os pontos citados pela consultora estão a polarização política e sua influência na agenda econômica, a reforma tributária, os investimentos e os incentivos fiscais. Confira a seguir.

Como está a questão do mercado financeiro, da Faria Lima? Você acha que eles cobram do Congresso a mesma transparência que cobram do Executivo na questão dos cortes de gastos? Existe essa cobrança de responsabilidade fiscal também por parte do Congresso? O mercado está sabendo compartilhar essa responsabilidade? 

Eu não consigo falar pelo mercado, não estou mais na linha de frente, mas pelo que eu consigo enxergar, tem muita interlocução do Congresso com os players de mercado. Então, a gente vê muitas vezes políticos, senadores, deputados, indo para São Paulo falar com a Faria Lima e tentar, enfim, tem essa interlocução. Então, mudou, mas o fato é que a gente tem regras que acabam eximindo, isentando os demais Poderes. Porque é assim, você tem regras fiscais, tem de responsabilidade e tal.

O Congresso ou o próprio Judiciário muitas vezes criam despesas, só que não cumprir a lei de responsabilidade cai naquele colo do Executivo. É um Executivo que é punido diante disso. Temos regras que a meta é do Executivo, mas todo mundo, de alguma forma, pode contribuir para o gasto e não é responsabilizado por isso. Além dessa questão do Congresso com mais poder, hoje, não tem mais a mesma margem para cortar a despesa discricionária como no passado. Então, por exemplo, você pega o início do governo Lula, lá atrás, gasto obrigatório que, se não me falha a memória, era algo como 75% do total, hoje é 93%. 

Concordo que o Congresso está faltando uma maior responsabilidade, um maior compromisso para o País. E isso tem a ver, claro, com o nosso desenho político. Você tem um sistema multipartidário, partidos que são sem uma linha programática clara, é muito no jogo da política apenas, buscando atender os seus currais eleitorais, e não com uma visão de País. 

O que é necessário fazer para que as reformas funcionem?

Primeiro você precisa ter um governo forte para passar essas agendas. A gente nunca conseguiu algo muito ambicioso nessa linha. Precisa governo forte para fazer as engrenagens desse tal presidencialismo de coalizão funcionar. Quer dizer, que as moedas de troca de fato se convertam em uma agenda de País. E aí é difícil ser otimista. Aqui é difícil.

Mas um governo forte se faz com sociedades dividida? É difícil também? 

A minha visão é que a polarização é um veneno para a discussão de agenda econômica. Isso eu vi com o Bolsonaro e vejo com o Lula, com os dois. Se tal proposta vem de tal presidente, não deve ser coisa boa. Então, a sociedade trava, o Congresso também não quer melindrar ninguém. Temas polêmicos em uma sociedade muito polarizada é mais difícil você fazer ajuste.

Já fazendo a ponte para Mato Grosso do Sul, hoje, nossos maiores gargalos estão ligados à infraestrutura de transporte, a rodovias e ferrovias que necessitam de investimentos bilionários. Até que ponto o setor privado pode pôr dinheiro para deslanchar investimento logístico? 

Esse ponto é importante, porque quando a gente olha as experiências de países com sucesso, onde eles se destacam é o ganho de produtividade. O mesmo ganho de produtividade, muitas vezes, é contrapartida também de investimentos. E o fato é que a nossa taxa de investimento, quer dizer, o problema nosso não é só a baixa produtividade, a gente tem uma taxa de investimento muito baixa, comparativamente a outros países. E é isso, a insegurança jurídica é o principal fator, porque tem uma demanda enorme. E se a demanda é enorme, quer dizer que a taxa de retorno deve ser boa, de repente compensa a própria taxa de juros do Banco Central. 

E por que não deslancha? Não deslancha porque no Brasil você nunca tem certeza do investimento que você vai fazer, se não vai ter um problema lá na frente, no processo de implementação, depois no funcionamento e tal. O exemplo que os economistas gostam de citar era quando o governador lá do Rio de Janeiro mandou quebrar as praças de pedágio. Então, é um País que essa questão da insegurança jurídica é importante, principalmente para a infraestrutura.

Claro que a solução para isso não é que você vai lá, faz uma PEC e está resolvido, estamos falando em reforçar o diálogo com o órgão de controle, com o judiciário, que precisa entender se tem consequências nas suas decisões, o impacto econômico das suas decisões. Então, não é uma medida que você vai lá, aprova no Congresso e tudo está certo. 

O que eu entendo é o seguinte: essa é uma agenda que tem crescido, essa discussão de ter que ter regras do jogo mais estáveis e mais claras para o setor privado investir mais em infraestrutura. Isso está crescendo muito e é essencial. Enquanto a gente só fica discutindo por inflação, por juros, você perde a oportunidade de avançar em uma instituição como essa. Mas, não é virada de chave. Tem muito investimento contratado por causa de concessões, por causa de marcos regulatórios e tal, mas o debate é como acelerar. 

Então imagina, se você consegue ir destravando isso, o ganho de produtividade que você vai ter no País é muito forte. Abrir ou reforçar uma infraestrutura em uma área que está superisolada, o ganho de produtividade é enorme. Então, eu acho que dá para ter uma visão mais construtiva de Brasil. Não que eu acredite que a gente vai dar grandes saltos no atual governo. Ideologicamente, é uma visão muito intervencionista. 

Os incentivos fiscais hoje são um problema para a economia como um todo?

O País, do ponto de vista de funcionamento das instituições, tem muito ainda a avançar. O cálculo do Insper é que o contencioso tributário no Brasil está, pelo menos, equivalente, somando tudo, a 75% do PIB [Produto Interno Bruto]. Não tem nada, nem longe disso, no mundo todo. Nos outros países, é de 0,3%, é menos de 1%. Tudo na escala no Brasil é gigantesca. 

Como é uma sociedade muito complexa, você não vai conseguir acabar da noite para o dia. Aquele discurso do Paulo Guedes, vou dar uma facada no sistema S, vou acabar com não sei o quê, não vai. Não vai porque decisões foram tomadas em cima disso. Você pode, de uma forma agregada, fazendo reformas para vários grupos e, assim, todo mundo sentindo que vai ter que participar desse esforço. 

No fim, se a gente for pensar, ainda que a reforma da Previdência tenha sido incompleta, e nem acho que conseguiria ser completa, porque não é brincadeira, mas era uma sensação assim: olha, todo mundo, com exceção, uns ou outros, no caso dos militares, ficaram de fora, os estados e os municípios ficaram de fora, mas enfim, se você for pensar, todo mundo, de alguma forma, tendo que abrir mão. De novo, não foi o que se esperava, mas já foi um passo importante. Vale para a [reforma] tributária também. 

Você acha que a reforma tributária deve reduzir aquele contencioso tributário de 75%? 

A reforma deve reduzir e em algumas coisas aumentar, mas para o conjunto da obra, vai diminuir. A questão é que pode ser que diminua muito menos do que a gente gostaria. Porque cada vez que você faz uma regra especial, vai ter algum grupo que vai questionar aquela regra, e aí vem o contencioso. E foi piorando, saiu do governo, foi para a Câmara, já piorou. Foi para o Senado, piorou. Daí, na segunda rodada, piorou de novo.

O Brasil, assim, e aí, é que esse é um exemplo que governo fraco de sociedade polarizada atrapalhou. Eu vou ser sincera, quando começou a tramitação da reforma tributária, lembra que, assim, a Simone Tebet falava, “é a nossa bala de prata”?Não tem nenhuma outra grande reforma vindo no atual governo. 

Há um temor de desindustrialização de estados periféricos com o fim do incentivo fiscal. Como você vê essa mudança na dinâmica do contrato, esse fundo de compensação? Existe mesmo esse risco? E como o mercado se comporta com isso?

A guerra fiscal dos estados, em um primeiro momento, ajudou a desconcentrar e tal. Mas foi ficando muito claro para os governadores que o nível de renúncia fiscal estava ficando absurdo. Então, teve um momento ali que se criou um grande consenso entre os governadores e os secretários de fazenda de que era necessário fazer a reforma e estancar aquela fiscal. Porque realmente ela parou de cumprir seu papel, vamos dizer assim, e ela estava gerando uma renúncia tributária muito forte com uma marca que só faz crescer.

E sem contar que o ICMS foi se tornando um imposto obsoleto, que não dá mais conta da mudança da estrutura produtiva do País, que cresce no Brasil e no mundo no setor de serviços. Hoje, o que a gente tem de manufatura embutida naquilo que a gente consome é muito pouco. O grosso são os serviços. 

Acho que, para aqueles estados que conseguiram mudar de patamar, que utilizaram o ganho que tiveram de arrecadação com a atração dessas empresas e sofisticaram os seus setores e tal, eu não vejo por que ter desindustrialização. Por exemplo, aqui, eu não vejo por que, porque você tem ali uma empresa que já tem todo o seu capital organizacional ali.

Eu acho que as mudanças, elas vão ser para aqueles estados que não conseguiram trazer nada, entende? E essa é a principal concorrência. Olha, eu estou indo para um estado em que vou ter mão de obra qualificada, infraestrutura, marcos regulatórios mais previsíveis, baixa insegurança jurídica. Então essa é a principal concorrência, não pode ser por causa do tributo. Então, assim, do ponto de vista dos motores de crescimento do País, tem excelentes notícias, mesmo que a gente não colhe esses frutos rapidamente. 
 

A reforma tributária traz estímulo para a indústria?

Depende do estado, depende do que produz, eu estou falando de uma forma genérica. O efeito multiplicador na economia é forte, porque a indústria tem um peso muito importante. O efeito multiplicador da indústria é muito grande. Então, por exemplo, parte do setor de serviços está atrás porque é justamente provedores de serviços para a indústria.

A indústria, ela puxa muitos setores. O agro, apesar de ter sido crucial para o Brasil superar aquele problema que a gente chama de vulnerabilidade externa, o Brasil se inseriu, exporta, ganha as reservas e é essencial para muitas áreas do País, não é exatamente o agro sozinho um puxador de crescimento. A gente realmente precisa da indústria. 

Então, você ter a commodity processada, porque você tem um ambiente de negócios mais razoável, com um sistema tributário mais racional, acho que é um salto que a gente pode ter. Eu realmente acho que a gente pode ter bons efeitos. Claro que não é uma virada de chave. A reforma não sai do jeito que a gente quer, mas, pelo menos, vai indo, vai caminhando.

Perfil - Zeina Abdel Latif

Nascida em Campinas (SP), no dia 13 de outubro de 1967. Bacharel, mestre e doutora em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), foi professora de Economia na Universidade Mackenzie, em São Paulo, e pesquisadora da USP no Instituto de Pesquisas Econômicas. Lecionou Macroeconomia no MBA do Ibmec e atuou por um grande período no mercado financeiro. Sua trajetória começou como economista sênior na Tendências Consultoria Integrada.

Em 2002, assumiu a posição de economista-chefe no Banco Bilbao Vizcaya e, um ano depois, tornou-se economista-chefe do HSBC Asset Management, cargo que ocupou até 2005. Entre 2005 e 2007, exerceu a função de economista-chefe no ABN-Amro Bank. Em 2008, assumiu o mesmo cargo no ING Bank no Brasil, permanecendo até 2010, quando se transferiu para o Royal Bank of Scotland na América Latina, onde atuou como economista sênior.

Em 2014, assumiu a posição de economista-chefe na XP Investimentos, cargo que ocupou até 2020. Após deixar a corretora, Zeina concentrou seus esforços na Gibraltar, sua empresa de consultoria. 

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Economia

Belém precisa mais que dobrar número de leitos de hotel para COP30

Rede hoteleira espera passar de 18 mil para 50 mil vagas

05/01/2025 13h00

Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

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Construído com traços dos estilos art nouveau e neoclássico, o Mercado de São Brás foi reinaugurado em Belém, no Pará. A construção histórica abriga mais de 300 feiras e lojas que vendem alimentos, ervas, artesanato e vestuário. A restauração do local é a primeira de uma série de intervenções que estão sendo concluídas na cidade nos próximos meses.

Belém se prepara para receber a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que acontecerá de 10 a 21 de novembro de 2025. A conferência é importante encontro internacional para tratar de meio ambiente e de decisões que contribuam para frear o aquecimento global, causador das mudanças climáticas e desastres ambientais. 

Por toda a cidade são vistos canteiros de obra, tapumes, intervenções no trânsito e placas com a inscrição Capital da COP30.

"São mais de 30 obras estruturantes que estão sendo feitas em Belém, realizadas pelo governo federal junto com a prefeitura e o governo do estado do Pará. Os investimentos têm um motivo e um significado. Estamos dotando de infraestrutura uma cidade maravilhosa que vai ter um grande legado", informou o secretário extraordinário da COP30, Valter Correia.

Vinculada à Casa Civil da Presidência da República, a Secretaria Extraordinária para a COP-30 foi criada pelo governo em março de 2024 para coordenar a preparação da Amazônia para receber a COP30.

Expansão hoteleira
No entanto, para fazer frente à magnitude da conferência, que deve receber mais de 60 mil pessoas, entre chefes de Estado, diplomatas, empresários, investidores, ativistas, jornalistas e delegações dos 193 países membros, um setor precisa enfrentar o desafio de mais que dobrar de tamanho: a hotelaria.

“A hotelaria de Belém está a pleno vapor. Todos os hotéis estão passando por reformas para atender a COP30”, informou o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Pará (ABIH-PA), Antônio Santiago, em entrevista à Agência Brasil.

“O principal desafio ainda é aumentar a quantidade de leitos existentes”, disse o presidente da ABIH-PA, que espera receber 40 mil visitantes na cidade.

Santiago detalha que a capital tem atualmente 18 mil leitos de hotel e espera chegar na COP30 com um número entre 45 mil e 50 mil, seno que uma cama de casal conta como dois leitos.

De acordo com Santiago, com a inauguração de hotéis, a quantidade de leitos deve chegar a 22 mil. Belém vai ganhar três hotéis de alto padrão, construídos por grupos internacionais para o público A e B. Um deles ficará na área do Porto Futuro II; outro em um antigo prédio que pertencia à Receita Federal; e o terceiro em Castanhal, fora da capital, mas na região metropolitana.

Alternativas

Estão sendo feitas negociações com plataformas virtuais como Airbnb e Booking, para cadastrar imóveis e aumentar a oferta de quartos disponíveis para o período da COP30. Além disso, dois transatlânticos deverão servir como hotéis flutuantes com 5 mil leitos.

Dezessete escolas públicas serão transformadas pelo governo paraense em espécies de hostel temporário. “Com tudo isso esperamos chegar a mais 22 mil leitos”, destacou Santiago. Aproximadamente 2,5 mil pessoas estão empregadas atualmente no setor. “Para a COP30, a estimativa é uma contratação de 40% a mais de trabalhadores.”

De acordo com o presidente da associação, as cidades vizinhas no raio de 150 quilômetros também devem ter procura por quartos de hotéis.

Segundo a Secretaria Extraordinária para a COP30, R$ 224 milhões foram destinados pela estatal Itaipu para a construção da Vila Líderes, que vai disponibilizar cerca de 500 quartos de padrão cinco estrelas. As acomodações atenderão parte das delegações e, após a COP30, o local funcionará como centro administrativo do governo estadual.

O governo federal também destinou R$ 100 milhões, por meio do Fundo Geral de Turismo (recursos do Ministério do Turismo), para melhoria da qualidade de hotéis e serviços de turismo.

O governo do Pará informou à Agência Brasil que incentivou a modernização da rede hoteleira ao isentar o setor de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para compras de itens como frigobar, televisão, ar-condicionado e mobiliário.

Antônio Santiago, da ABIH-PA, projeta que a realização da COP deixará para a rede hoteleira de Belém o legado de mão de obra mais bem preparada e novos empreendimentos hoteleiros de excelência.

Movimentação
A COP30 será realizada em novembro de 2025, mas Belém e os hotéis já experimentam aumento de movimentação. De acordo com Santiago, desde o início do ano, a taxa de ocupação da rede hoteleira na cidade passou de 50% para 82%, em média.

No último dia 15 de dezembro, o ministro do Turismo, Celso Sabino, esteve no aeroporto de Belém para comemorar o recorde de 3,9 milhões de passageiros em 2024, número cerca de 8% maior que o registrado no mesmo período de 2023.

Segundo o ministério, o Aeroporto Internacional comporta até 7,7 milhões de passageiros por ano, “cenário que, com a realização das adaptações necessárias, atenderá a contento os visitantes de Belém durante a realização da COP30”.

Legado urbanístico

As atividades principais da COP30 vão ocorrer no Parque da Cidade e no Hangar Centro de Convenções, que são conectados e ficam no bairro Souza, a cerca de 20 minutos de carro do Aeroporto Internacional de Belém.

O Parque da Cidade ocupa a área de um antigo aeroporto e ainda está em construção, com cerca de 70% das obras concluídas. Após a realização da conferência, o parque será entregue para uso da população. O projeto final prevê áreas verdes preservadas, lago artificial, instalações esportivas, o museu da aviação, um centro de economia criativa e boulevard gastronômico.

O investimento do governo federal para os preparativos da Conferência sobre Mudanças Climáticas beira R$ 4,7 bilhões. As intervenções, feitas em conjunto com as administrações estadual e municipal, são direcionadas para infraestrutura urbana, segurança, sustentabilidade, transporte e mobilidade, como a finalização do BRT Metropolitano (sistema de ônibus rápidos em pistas exclusivas), ampliação de vias e construção de quatro viadutos.

A Rua da Marinha, no polígono da COP30, passará de duas para seis faixas de rolamento. “A obra vai beneficiar a população de seis bairros, escoando o tráfego e melhorando a mobilidade”, diz comunicado enviado pelo governo paraense.

Avaliação

A professora Roberta Menezes Rodrigues, da Faculdade da Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará (UFPA), considera que todo investimento que a cidade vai receber “tende a ser visto com muito bons olhos”.

“Belém é uma capital, mas é uma cidade que tem déficits enormes de infraestrutura, de qualidade em termos de moradia. É uma cidade da região Norte que sempre foi relegada a segundo plano em termos de investimentos, em especial voltados para área relacionada à infraestrutura urbana”, ressaltou.

A avaliação da professora sobre as moradias belenenses é confirmada pelo Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que mostrou Belém como a concentração urbana com a maior proporção de habitantes morando em favelas (57,1%). 

Rodrigues, que participa de uma pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) sobre o legado da COP30, considera que ainda é cedo para se ter clareza sobre o tema.

“Falar de legado agora, na verdade, é falar sobre dúvidas”, afirmou Rodrigues, que já enxerga contradição entre intervenções que estão sendo feitas na cidade e caminhos que deveriam ser seguidos justamente para se obter desenvolvimento ambiental sustentável.

“Por mais que a gente tenha grandes investimentos acontecendo na cidade, parte deles está presa ainda a uma lógica de investimentos e formas de intervenção desse modelo que a gente está questionando”, apontou.

“A gente está abrindo mais vias, rodovias, desmatando as poucas áreas verdes que restam na cidade e priorizando, por exemplo, o transporte individual, o carro, em vez de priorizar o transporte público.”

A professora reconhece que a cidade ganhará ativos importantes em termos de infraestrutura, locais como o Parque da Cidade e equipamentos culturais. “Belém nunca viu tanto investimento acontecendo ao mesmo tempo”, frisou.

No entanto, ela adverte que algumas iniciativas podem favorecer a valorização imobiliária em determinadas regiões, em vez de beneficiar a população em geral. Em alguns casos, pessoas chegam a enfrentar remoções, diz ela, se referindo a famílias que viviam na Avenida Tamandaré, onde acontecem obras do Parque Linear.

“É um tipo de investimento que está bastante ligado à valorização imobiliária.”

Legado ambiental

A professora Lise Vieira da Costa Tupiassu Merlin, do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, destaca o fato de o evento internacional mais importante sobre meio ambiente ser realizado em uma cidade amazônica. “Atualmente há um grande déficit de protagonismo amazônico nas discussões climáticas.”

“Em que pese o mundo todo reconhecer a importância da Amazônia para a luta contra as mudanças climáticas, quase sempre as soluções e debates são moldados sem a participação de pessoas da região.”

Para a professora, Belém foi uma escolha adequada para exercer esse protagonismo, porque “tem a maior instituição científica da Pan-Amazônia, a UFPA”. Ela ressaltou ainda o “conhecimento ancestral” da população local.

Tupiassu Merlin acrescenta que, por outro lado, Belém situa-se no" estado que contém um grande mosaico de conflitos socioambientais, que contribuem para o acirramento das mudanças climáticas”.

Na opinião de Lise, o aumento do protagonismo depende de um posicionamento mais estratégico dos atores locais, “mas também de uma vontade genuína dos demais atores de querer se abrir para uma nova perspectiva de justiça climática”.

“A COP30 será, sem dúvida, uma oportunidade para isso, mas ainda há muito trabalho pela frente para que essa oportunidade se reverta em benefícios duradouros para a população”, concluiu.

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Economia

Gasolina inicia 2025 pressionada por defasagem de preço e aumento de ICMS

A alíquota do ICMS sobre a gasolina e o etanol vai subir R$ 0,10 por litro

04/01/2025 21h00

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O ICMS sobre os combustíveis sobe no início de fevereiro em meio a um cenário de preços pressionados pela alta do dólar e pela recuperação das cotações internacionais do petróleo, o que pode dificultar ainda mais a queda das taxas de juros.

Gasolina e diesel iniciaram o ano com elevadas defasagens, e, embora a Petrobras diga que ainda esperará para definir reajustes, as bombas já refletem alta nos custos de importações e no preço de venda da maior refinaria privada brasileira.

A alíquota do ICMS sobre a gasolina e o etanol vai subir R$ 0,10 por litro, de R$ 1,37 para R$ 1,47. A alíquota sobre o diesel e o biodiesel vai aumentar R$ 0,06, de R$ 1,06 para R$ 1,12 por litro. A gasolina é o componente com maior peso no IPCA e qualquer aumento tem potencial para pressionar a inflação.

Os produtos já vêm em alta nas bombas, refletindo a escalada do dólar nas últimas semanas. Segundo levantamento da Endered Ticket Log, o diesel S-10 encerrou dezembro com o maior preço de 2024: R$ 6,27 por litro, em média, alta de 2,79% no ano.

Gasolina e etanol subiram em dezembro, para R$ 6,29 e R$ 6,47 por litro, respectivamente. "As altas registradas no dólar têm afetado o mercado de combustíveis, assim como a maior demanda por transporte, tradicional nesta época do ano", avalia Douglas Pina, diretor-geral de Mobilidade da Edenred Brasil.

Os aumentos nas bombas ocorreram em um ano de poucos reajustes da Petrobras. A estatal elevou o preço da gasolina em suas refinarias apenas uma vez. No diesel, não fez nenhum reajuste.

Já a Refinaria de Mataripe, controlada pela Acelen, tem repassado as oscilações do mercado internacional com mais frequência.

No dia 26 de dezembro, por exemplo, elevou seus preços de venda da gasolina e do diesel, já respondendo à escalada do dólar.

A pressão cambial arrefeceu nos últimos dias, mas a cotação do petróleo voltou a subir: entre o dia 20 de dezembro e esta sexta-feira (3), saiu da casa dos US$ 72 para cerca de US$ 76 por barril.

Preocupações com sanções ao Irã pelo governo eleito nos Estados Unidos tendem a manter certa tensão no mercado, diz o Goldman Sachs. O banco acredita em impacto pequeno, mas vê o petróleo a US$ 78 por barril em junho.

A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, disse à Folha que a empresa ainda vai esperar para entender o comportamento do mercado. Em entrevista recente à Band, ela defendeu que a empresa tem registrado bons resultados mesmo tendo "abrasileirado" o preço dos combustíveis.

Nesta sexta-feira (4), porém, a defasagem do preço do diesel vendido pela estatal chegou a R$ 67 por litro em relação à paridade de importação medida pela Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis). Na média nacional, a diferença é de R$ 0,61 por litro.

É um valor próximo dos R$ 0,73 registrados no início de julho, quando a defasagem atingiu seu pico em 2024. No caso da gasolina, a defasagem estava nesta sexta em R$ 0,38 mas refinarias da Petrobras e R$ 0,37 na média nacional.

Mesmo que não defina por aumentos, a Petrobras não tem margem para reduzir preços em refinarias e aliviar a alta dos impostos, como fez no último reajuste do diesel, em dezembro de 2023, às vésperas da retomada integral dos impostos federais sobre o combustível.

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