A Suzano Celulose pode enfrentar dificuldades técnicas para obter autorização do Ministério dos Transportes para construir a linha férrea de 136 quilômetros entre Três Lagoas e Aparecida do Taboado, com investimentos de R$ 1,1 bilhão.
A Eldorado Celulose já assinou o contrato com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para construir no mesmo trecho, com 88,9 quilômetros de malha ferroviária e investimentos previstos de R$ 890 milhões.
O pedido da Suzano está parado desde o fim do ano passado. Esses obstáculos constam na Resolução 5.987, publicada no dia 2 no Diário Oficial da União, ao afirmar que a autarquia analisará a viabilidade “locacional” dos novos pleitos e “verificará a existência de conflito entre o traçado da ferrovia requerida e as demais infraestruturas ferroviárias implantadas ou outorgadas”, o que pode resultar em indeferimentos dos pedidos.
A resolução foi publicada em virtude da existência de vários pedidos no Ministério dos Transportes que buscam explorar o mesmo trecho. Um exemplo é a Rumo (holding que administra a Malha Oeste), que pediu autorização do governo para construir 10 trechos ferroviários, só que alguns também foram solicitados por outras empresas.
De acordo com o CEO da empresa, João Alberto Abreu, em entrevista ao site Poder360: “Sabemos que não há a possibilidade de ter duas ferrovias no mesmo trecho. Então, se alguém decidir fazer primeiro, terá prioridade na execução”, declarou.
LEI
Embora a Lei 14.273 assevere em seu artigo 8º que “a outorga de determinada ferrovia não implica a preclusão da possibilidade de outorga de outras ferrovias, ainda que compartilhem os mesmos pares de origem e destino ou a mesma região geográfica”, na resolução foi aberta uma brecha para que os pedidos pendentes com mesmo traçado tenham dificuldades técnicas para serem obtidos.
O artigo 6º da resolução afirma que “verificada incompatibilidade locacional ou motivo técnico-operacional relevante que justifique óbice à autorização, a requerente deve apresentar solução técnica adequada para o conflito identificado em até 60 (sessenta) dias do recebimento de notificação da ANTT, prorrogáveis por igual período”.
A legislação define que a necessidade de inclusão de acesso ferroviário na faixa de domínio de outra ferrovia autorizada ou concedida, inclusive para acessar portos, ferrovias ou outras infraestruturas essenciais ou para transpor barreiras topográficas ou áreas urbanas, não inviabilizará a outorga por autorização.
É explícito na resolução que a Eldorado tem vantagem na construção por já ter assinado o contrato com o Ministério da Infraestrutura em dezembro de 2021.
Fica evidente no texto: “Caso o requerimento de autorização ferroviária se sobreponha à faixa de domínio de outra ferrovia já requerida, mas ainda pendente de outorga, às duas solicitantes serão adotados os seguintes passos: I – será solicitada a apresentação, pelas requerentes mais recentes, em até 60 (sessenta) dias, prorrogáveis, uma única vez, por igual período, de solução técnica alternativa que possibilite a implantação de ambos os empreendimentos”.
NOVAS FERROVIAS
A prevalência da Eldorado também fica evidente nas análises de pleitos de novas ferrovias feitas pela Suzano. Embora tenha apresentado no fim do ano passado três solicitações, até agora a diretoria da ANTT só deixou de analisar o trecho entre Três Lagoas e Aparecida do Taboado.
Em janeiro deste ano, no dia 20, a autarquia autorizou a Suzano Celulose a assinar contrato para construir 231 quilômetros de ferrovia ligando Ribas do Rio Pardo a Inocência, além da criação de um ramal ferroviário de 24,7 quilômetros no município de Três Lagoas. Ainda falta a assinatura dos contratos.
Conforme o pedido, o trecho entre Ribas e Inocência será conectado com a linha férrea da Rumo Malha Norte (RMN), que foi criada inicialmente com o objetivo de transportar carga de Mato Grosso até o Porto de Santos.
Agora, com o trecho entre Três Lagoas e Aparecida do Taboado, as possibilidades existentes será a Eldorado apresentar “solução técnica alternativa que possibilite a implantação dos empreendimentos”. No entanto, se sua resposta não possibilitar a implantação, “serão solicitados os estudos de traçado.”
Só após análise da viabilidade locacional, da convergência do objeto do requerimento com a política pública do setor ferroviário e dos aspectos técnico-operacionais, a ANTT deliberará sobre a outorga de autorização ferroviária e publicará o resultado da deliberação, bem como, em caso de deferimento, o extrato do contrato de adesão.
Uma alternativa para a Suzano poderá ser usar a linha a ser construída pela Eldorado para escoar sua produção, mas dependerá da boa vontade da Eldorado de autorizar o uso e dos valores a serem praticados.
De acordo com a ANTT, após ser indagada sobre os efeitos da resolução, os contratos assinados não serão revisados para se adequarem às novas normas.
“Todos os pedidos que tiveram sua análise completa pela Secretaria Nacional de Transportes Terrestres e pela ANTT até fevereiro deste ano, durante a vigência da Medida Provisória [MP] 1.065/2021, receberam autorização, tendo contratos assinados, pois são atos jurídicos perfeitos. Portanto, a edição de atos normativos infralegais subsequentes, como a referida resolução, não retiram a eficácia do que tramitou durante a vigência da MP. Os demais pedidos serão analisados à luz da Lei 14.273/2021, sancionada em dezembro último, e demais atos normativos”.
PEDIDOS
Com base na MP, o Ministério da Infraestrutura recebeu 80 pedidos de 32 diferentes entes privados interessados em desenvolver projetos ferroviários no País pelo regime de autorizações entre agosto de 2021 e fevereiro deste ano.
Somados, os requerimentos têm potencial de injetar R$ 244,6 bilhões em investimentos privados no modal e agregar 21,1 mil quilômetros em novos trilhos à rede ferroviária nacional, cruzando 17 estados e o Distrito Federal – todas as regiões do Brasil foram atendidas com pedidos de autorização ferroviária.
Até o momento, são 27 contratos assinados entre o governo federal e entes privados para a implantação de novas estradas de ferro pelo regime de autorização.
A projeção de recursos privados a serem alocados na implantação desses empreendimentos já autorizados soma R$ 133,24 bilhões e 9.922,5 quilômetros de novos trilhos, cruzando 15 unidades da Federação, de acordo com a ANTT.