A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) apresentou uma proposta, que foi discutida em audiência pública na semana passada, que traz uma série de mudanças para aprimorar os processos de reajuste dos planos de saúde, tanto individuais quanto coletivos. Com objetivo de garantir maior transparência e equilíbrio financeiro, a possível alteração deverá impactar a relação entre operadoras e consumidores.
Uma das principais modificações sugeridas é a possibilidade de os planos de saúde aplicarem reajustes excepcionais, sendo estes superiores ao limite autorizado pela ANS, em contratos individuais. Essa medida seria permitida em situações de “desequilíbrio econômico-financeiro” nos contratos.
Advogado especialista em planos de saúde do escritório Arzabe Sociedade de Advogados, Gustavo Arzabe comenta as implicações dessa proposta. “A revisão na forma de reajuste dos planos é uma demanda antiga das operadoras de planos de saúde. Elas reclamam sobretudo dos altos custos dos procedimentos, que geram problemas para tornar a prestação dos serviços economicamente viável, sem contar a alta judicialização de pedidos de cobertura”, aponta.
Arzabe pontua que, de fato, a margem das operadoras não é grande, tornando a precificação dos serviços algo crucial para sua viabilidade. “Contudo, há de se considerar que as famílias também fazem grande esforço para pagar pelo serviço, o que gera o dever de cautela da ANS para autorizar ou não a mudança na forma de reajuste”, argumenta.
Quanto aos planos coletivos, o advogado explica que a proposta de aumento no número de integrantes dos grupos pode ser positiva, diluindo os custos para todos. “Assim, é necessário atenção para que a nova norma torne o fornecimento do serviço economicamente viável para as operadoras, sem inviabilizar a contratação pelos consumidores”, finaliza Arzabe.
Em Mato Grosso do Sul, a Confederação Nacional das Cooperativas Médicas de Campo Grande (Unimed), por meio de nota ao Correio do Estado, frisa que tem como princípio seguir todas as regulamentações e determinações da ANS. “Em relação à proposta de reajuste, estamos acompanhando os desdobramentos da consulta pública e aguardamos a publicação oficial para analisar e definir como atuaremos”.
Procurado pelo Correio do Estado, o Hapvida Plano de Saúde preferiu não se manifestar, por se tratar de uma pauta que abrange todo o setor.
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) informou que considera “completamente inapropriado” discutir na mesma audiência temas complicados e com grande potencial negativo para os consumidores.
“Esse tipo de reajuste, a ser implementado quando as empresas passam por dificuldades financeiras, coloca o consumidor em uma situação de extrema desvantagem e, na prática, autoriza a alteração unilateral de preço”, informa o Idec, em nota à Folha de São Paulo.
INDIVIDUAIS
A ANS propõe estabelecer requisitos específicos que permitam às operadoras solicitar reajustes excepcionais em caso de desequilíbrio econômico-financeiro. Segundo a associação, isso pode proporcionar uma maior estabilidade financeira para as operadoras, mas também gera preocupações sobre o aumento de custos para os consumidores.
A definição de indicadores que caracterizem a ameaça ao equilíbrio financeiro da operadora pode levar a uma maior vigilância sobre a saúde financeira das empresas. No entanto, a aplicação desses indicadores pode resultar em reajustes mais frequentes, afetando diretamente o bolso dos beneficiários.
De acordo com a ANS, a proposta de criar um indicador que mostre a participação da carteira individual na totalidade da operadora visa promover um entendimento mais claro sobre a importância dos planos individuais. Isso pode ajudar na negociação e no planejamento de reajustes, mas também pode levar a variações nos preços.
A definição de um prazo para a implementação das mudanças e a frequência dos pedidos de reajuste podem trazer previsibilidade tanto para as operadoras quanto para os consumidores, facilitando o planejamento financeiro.
COLETIVOS
Outra proposta de mudança é a ampliação do tamanho dos agrupamentos de contratos, que atualmente são limitados a 29 beneficiários. Conforme a ANS, isso permitirá uma diluição maior do risco. Isso pode resultar em reajustes mais equilibrados, beneficiando tanto as operadoras quanto os consumidores, ao reduzir a volatilidade dos preços.
A ANS destaca que a implementação de uma cláusula padrão para o cálculo de reajustes tem como objetivo aumentar a transparência para os consumidores. Isso pode contribuir para uma maior confiança na relação entre beneficiários e operadoras, possibilitando que os consumidores compreendam melhor as justificativas para os aumentos de preços.
A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) ainda não se pronunciou oficialmente sobre as propostas, aguardando a publicação do edital pela ANS. A expectativa é de que, após a divulgação, a federação traga uma análise detalhada sobre os impactos das mudanças para o setor.
AUDIÊNCIA
Por meio de nota enviada ao Correio do Estado, a ANS esclarece que a Audiência Pública nº 48, realizada no dia 7 de outubro, tratou de temas relacionados, primordialmente, a preço e reajuste, de modo a promover a sustentabilidade do setor.
“De medidas que possam: ampliar a concorrência no setor; facilitar o acesso de consumidores ao setor de planos de saúde; trazer maior diluição do risco para os contratos de pequenos grupos de planos coletivos; trazer maior transparência sobre as metodologias de cálculo de reajuste utilizadas; e colaborar para a manutenção da sustentabilidade do setor”, detalha a agência.
Os temas tratados foram: reajuste de planos coletivos; mecanismos financeiros de regulação (coparticipação e franquia); venda on-line; e revisão técnica de preços de planos individuais/familiares.
Especificamente sobre a revisão técnica, a ANS informa que se trata de uma medida prevista em lei. Uma vez normatizada, poderá ocorrer em situações consideradas excepcionais, em casos de desequilíbrio econômico-financeiro que ameacem a continuidade da prestação do serviço pela operadora.
Ou seja, o intuito é receber contribuições e/ou propostas para se estabelecer critérios claros e objetivos para que uma operadora tenha direito a um reajuste excepcional para o conjunto da carteira de planos individuais.
“Entre as medidas que podem vir a ser adotadas, estão, por exemplo, a definição de indicadores que caracterizem ameaças ao equilíbrio econômico-financeiro da operadora e da participação efetiva da carteira individual no âmbito da carteira total da operadora. Vale esclarecer que a revisão técnica é uma medida que diz respeito apenas às carteiras de planos individuais, não se aplicando aos contratos de planos coletivos”, frisa a ANS.