Na quarta queda consecutiva, o dólar fechou ontem cotado a R$ 5,00, o menor valor registrado desde junho do ano passado. Neste mês, a redução acumulada é de 5,69% e de 10,24% no ano.
Apesar de a desvalorização ser positiva para quem trabalha com importação de matéria-prima e produtos e para os que pretendem investir na moeda americana, para o consumidor comum o impacto é irrisório, segundo os especialistas ouvidos pela reportagem.
O economista Holger Heimbach explica que os primeiros impactados serão os agentes econômicos que comercializam com outros países.
“Para os exportadores a queda é ruim, pois o produto vendido em dólar ao ser convertido gerará menor valor em reais. Já para os importadores é favorável, visto que os produtos importados passam a custar menos”.
“Ainda que a economia de Mato Grosso do Sul tenha no setor exportador [grãos, proteínas, minério e celulose] um importante agente, essa desvalorização do dólar não deve gerar grandes impactos, visto que parte das operações externas tenham hedge cambial que ameniza os impactos da flutuação do câmbio”, analisa.
Segundo o assessor financeiro Fernando Almeida da Rocha, as pressões inflacionárias – não apenas no Brasil, mas no mundo todo – fizeram com que os preços das commodities subissem muito nos últimos meses e por isso não há previsão de impacto para a ponta da cadeia.
“E esse aumento de custo de produção, seja na compra de grãos, seja na de combustíveis, reflete direto no preço do produto na prateleira do consumidor. Aqui vale ressaltar que no momento o que está tendo mais influência nos preços é esse custo de produção, mais do que as variações do câmbio”, pondera.
Outro que reforça a expectativa de não ser de grande valia para controlar os índices inflacionários é o economista Marcio Coutinho.
“O que pode impactar para o consumidor é na hipótese que demanda de soja, milho e carne para o exterior seja maior. Mas, com o dólar mais baixo, esse produtor pode querer negociar no mercado interno. Entendo que o impacto para o consumidor será muito pequeno”, analisa.
No comparativo com os últimos anos, a moeda americana subiu mais de 50%. Em 13 de maio de 2020, o dólar encostou nos R$ 6,00, sendo cotado a R$ 5,88, o valor é 57,21% maior que os R$ 3,74 aferidos em 22 de fevereiro de 2019.
FUTURO
A valorização do real em relação ao dólar que poderia trazer um efeito favorável para inflação, segurando a alta de preços das matérias-primas, como grãos, carnes, petróleo e derivados nos índices de custo de vida, é limitado, segundo economistas.
O doutor em economia Michel Constantino pondera que a longo prazo a desvalorização do dólar pode refletir em redução da inflação.
“Dólar é uma moeda forte e imprevisível. Para a economia, muda a influência sobre: os preços dos produtos, dos investimentos, dos custos de insumos e das importações”.
“No curto prazo não muda os preços para o consumidor final, pois os custos dos produtos foram pagos com o dólar mais caro; no longo prazo, caso continue caindo, teremos quedas de preços”, contextualiza.
No entanto, a maioria dos analistas acredita que há uma tendência de alta para os próximos meses. Tanto as eleições para os maiores cargos do Executivo quanto as tensões entre Rússia e Ucrânia podem virar a mesa de câmbio.
“Com a possibilidade de um conflito envolvendo a Rússia e a Ucrânia, o mercado internacional tende a ficar mais volátil e, assim, aumentar as oscilações do câmbio”.
“O preço dos combustíveis poderia até ser impactado pela desvalorização do dólar, contudo, em decorrência das tensões entre Rússia e Ucrânia, a cotação do petróleo no mercado internacional subiu, pressionando os preços praticados no Brasil”, conclui Holger Heimbach.
MOMENTO POSITIVO
A principal explicação para a queda do dólar ante o real é a busca de investidores internacionais por ativos brasileiros.
Com juros mais altos, um maior fluxo de moeda estrangeira é atraído para o mercado nacional.
“É natural que o investidor migre seus recursos para cá, em que pese esse ano ser um ano político – isso parece não estar sendo fator de preocupação”, diz Rocha e complementa.
“A crise política da Rússia, que também é um mercado emergente e que está em um mesmo patamar de risco que o Brasil para o investidor, fez com que o fluxo que poderia ser diluído viesse com mais força para cá. Basicamente, isso derrubou o dólar por aqui”, analisa.
Ainda de acordo com o assessor financeiro, a busca por ativos brasileiros cresceu em janeiro.
“Com ativos de bolsa a preços atrativos e sem outras opções, o investidor estrangeiro entrou com força aqui. No mês de janeiro, o real foi a segunda moeda que mais valorizou frente ao dólar no mundo”, considera Rocha.
O Banco Central divulgou ontem o fluxo cambial positivo em US$ 5,2 bilhões até 18 de fevereiro.
Mesmo com as mostras positivas no sentido de investimentos, os especialistas aconselham a ter cautela na hora de aplicar tudo em dólar, por exemplo.
Eles pontuam que é vantajoso o investimento pensando em futuras valorizações, mas que continua sendo importante diversificar a cesta.
“O investimento tem de sempre estar ligado ao objetivo da pessoa. A pessoa que vai investir em um ativo obviamente ela pensa lá no futuro consumir esse ativo. Se a pessoa está pensando em viajar no fim do ano de repente seria interessante comprar dólar agora”, diz Coutinho.
O assessor financeiro ainda complementa que para o investidor local a melhor alternativa é sempre diversificar e procurar oportunidades de entrada e principalmente não deixar todas as reservas em uma única estratégia.
“O mercado financeiro oferece opções de investimento para quem quer fazer proteção cambial por meio de derivativos e hedge. Ou apostas, tanto na queda quanto na alta do dólar. Na minha visão, a volatilidade continuará ainda forte durante todo o primeiro semestre, e tanto o investidor quanto o consumidor precisam ter cautela na hora de tomar a decisão”, finaliza Rocha.




