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Recurso

Cannabis medicinal auxilia tratamento de Gael, diagnosticado com transtorno do espectro autista

Resolução que restringia uso de canabidiol no tratamento de síndromes e epilepsia foi revogada nesta terça-feira

25 OUT 2022 • POR Alison Silva • 16h15
Gael Araújo junto da família   Fotos: Marithê do Céu e Arquivo Pessoal / Montagem Correio do Estado

Após protestos e manifestações, a resolução que restringia o uso medicinal da cannabis em tratamentos clínicos foi revogada por meio do Diário Oficial da União (DOU) desta terça-feira (25).

De acordo com Jéssica Albuquerque, diretora da Associação Sul Mato Grossense de Pesquisa e Apoio à Cannabis Medicinal Divina Flor,  a medida foi boa para a área. 

“A  revogação foi boa, a luta não para porque não podemos reduzir o tratamento à base de cannabis a dez ou 15 patologias.  Hoje são mais de 50 patologias tratadas com cannabis para todos que precisem e não apenas algumas”, disse ao Correio do Estado. 

Diagnosticado com grau I de Transtorno do Espectro Autista (TEA), o pequeno Gael Araújo Codas (3) realiza há pelo menos cinco meses o tratamento à base de cannabis para lidar com as crises causadas pelo TEA. 

Campo-grandense, o filho mais novo da publicitária e social midia Lauanne Araújo (32), possui suspeitas de comorbidade em Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). 

Para a mãe, apesar da resolução revogada não atingir diretamente seu filho, o texto considerado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) representava sérios riscos quanto à continuidade de tratamentos em outros pacientes.

“Quando eu recebi a notícia sobre (resolução), chorei muito. Também pelo medo de ter que voltar para alguma química forte. O tratamento com cannabis pode melhorar não só a vida do meu filho, mas também de outras crianças que sofrem com o autismo e várias doenças”, frisou a publicitária. 

Segundo Lauanne, apesar da pouca idade, Gael fez uso de diversos medicamentos desde um ano de vida até chegar à cannabis medicinal. “Desde um ano ele toma medicação, não dormia bem, cerca de 1h30 por noite e também não comia. Usa carbamazepina, popularmente conhecido como Tegretol (utilizado em casos de epilepsia e neuropatias), o que deixou ele inquieto e muito mais nervoso. Anteriormente utilizava apenas para dormir, hoje utiliza também durante o dia  para melhorar questões de comportamento e assimilação”, disse. 

Para além do Tegretol, Gael já tomou Risperidona, medicamento que segundo Lauanne Araujo deixava seu filho “muito dopado, atingindo questões motoras (grossa, fina, sensorial, cognitiva e comportamental, o que me fez pesquisar e chegar ao CBD”, destacou a publicitária. 

Para Lauanne, apesar da eficácia do tratamento, o principal empecilho atual é encontrar profissionais que prescrevem o tratamento com cannabis. Resolvida a questão, a social mídia destacou ao Correio do Estado que os custos com o medicamento chegaram a R$ 700.

“Gael toma dois frascos por mês do medicamento, que custa em torno de R$ 600, R$ 700 mensais. Infelizmente não tínhamos condição de manter, até que encontramos uma importadora autorizada pela Agência de Vigilância Sanitária e buscamos o medicamento nos Estados Unidos”.

Segundo a mãe, após a introdução do medicamento no tratamento de Gael, os resultados foram notórios. “Demorou uns 15 dias para vermos os primeiros efeitos. Meu filho começou a ficar mais calmo, parece que as coisas começaram a se encaixar na cabecinha dele, melhorou a fala, ele sempre teve um atraso de fala muito significativo para a idade dele, além da formação de frases, isso sempre junto com as terapias”, salientou Lauanne Araújo. Atualmente, a publicitária gasta cerca de R$ 590 por três meses de tratamento do filho.

“Ele consegue se autorregular melhor, se entende, então mesmo que ele fique nervoso e esteja em uma crise, no fim ele consegue entender.  Ainda tem dificuldade em conseguir cessar as crises, mas mesmo assim é muito melhor”.  

Questionada sobre a resistência em relação ao uso do canabidiol, Lauanne Araújo disse que há muitos mitos e preconceitos acerca da cannabis medicinal. “Sempre fui aberta ao diálogo quanto ao CBD porque eu acredito na ciência e já comprovamos diversas vezes a eficácia do tratamento. Depois de conversar com pais e ver relatos sobre o autismo, não pensei duas vezes”, destacou. 

Medicamentos e tratamentos

Estudante regular de uma escola da Rede Municipal de Ensino (Reme), atualmente Gael Araújo utiliza carbamazepina, fornecida gratuitamente por meio do público de saúde, melatonina, hormônio de indução do sono, remédio manipulado que dura, segundo a mãe, cerca de dois ou três meses.

O tratamento é acompanhado com custos com e saúde, terapias duas vezes na semana, fonoaudiólogo e psicólogos, além de desenvolvimentos didáticos  trabalhados pelos pais. Para além de Gael, Lauanne é mãe de Aurora Araújo Codas (5), e casada com Eric Cavalheiro Codas (31).

Segundo a publicitária, é o pai quem faz, na maioria das vezes, os trabalhos de casa e cuida dos filhos, uma vez que o transtorno do filho o faz ser mais apegado à ela, o que a faz trabalhar de forma híbrida. “Entendi que a chegada dele mudou a minha vida e que tenho que dedicar a ele, e pesar na qualidade de vida do meu filho”, finalizou. 

Causa

De acordo com a Associação Divina Flor, mais de 50 mil pacientes utilizam de cannabis medicinal em seus tratamentos em todo o país. Segundo Jéssica Albuquerque, são mais de 400 pacientes em Mato Grosso do Sul, pela associação, além de pacientes que compram o remédio importado (caso de Gael Araújo).

A diretora comemorou a revogação da resolução, entretanto falou sobre os próximos passos acerca do tema. “ Amanhã (26) nos reuniremos com o presidente do CRM além de acompanhar pacientes e médicos para que seus direitos se mantenham”, finalizou.

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