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SECA EXTREMA

Nível do Rio Paraguai fica abaixo de zero 17 dias mais cedo que em 2021

Em 2021 o nível chegou ao segundo pior da história, com apenas um centímetro acima do recorde, registrado em 1964

27 AGO 2024 • POR Neri Kaspary • 11h10
Além de prejudicar o transporte hidroviário, o baixo nível do Rio Paraguai chega a comprometer a coleta de água para abastecer Corumbá e Ladário  

Por conta das chuvas 40% abaixo da média história na bacia pantaneira desde outubro do ano passado, o nível do Rio Paraguai na régua de Ladário está abaixo de zero desde esta segunda-feira (26). A barreira do zero foi rompida 17 dias mais cedo que em 2021, ano em que o rio atingiu o segundo pior nível desde quando começou a medição, em 1900. 

Em 2021, quando o rio chegou a ficar 60 centímetros abaixo de zero (o nível mais baixo já registrado foi em 1964, com 61 centímetros abaixo de zero), a régua de Ladário permaneceu no positivo até o dia 10 de setembro. 

Depois daquela data o rio continuou baixando e só começou a subir em meados de outubro, com a chegada das chuvas. Mesmo assim, permaneceu abaixo de zero até 22 de novembro. 

A quebra da barreira do zero ocorreu apesar da liberação de água extra da hidrelétrica do Manso, em Mato Grosso, que no final de junho e começo de julho liberou água acima da média ao longo de três  semanas no Rio Cuiabá, que chegou a subir quase 70 centímetros em pleno período de estiagem. 

E, mesmo depois da liberação desta água extra, a represa continua despejando 80 mil metros cúbicos por segundo e mantendo o Rio Cuiabá na casa  dos 94 centímetros na régua de Cuiabá.  Em 2021, no dia 27 de agosto, o nível estava 90 centímetros mais baixo do que agora, evidenciando que a hidrelétrica do Manso está impedindo seca ainda mais severa em todo o Rio Paraguai. 

Mas esta água extra não deve ser suficiente para impedir que o Rio Paraguai atinja seu pior nível em 124 anos, já que a meteorologia já está prevendo chuva abaixo da média histórica pelos próximos três meses, conforme o Cemtec (Centro de Monitoramento do Tempo e do Clima) de Mato Grosso do Sul. 

Nesta terça-feira (27), o nível em Ladário amanheceu quatro centímetros abaixo de zero. No começo do mês ainda estava em 48 centímetros. Ou seja, o nível está recuando em uma média de 1,9 centímetro por dia. 

Se continuar neste ritmo e se não forem registradas chuvas fortes nem aumento da vazão na represa do Manso, a tendência é de que até o final de setembro o rio supere inclusive os 61 centímetros abaixo de zero registrados em 1964. 

TRANSPORTE HIDROVIÁRIO

Por conta da escassez de chuvas desde outubro do ano passado, o rio Paraguai demorou a subir no começo do ano e ficou abaixo de um metro já no final de junho. O nível máximo doi de apenas 1,47, ante 4,24 registrados no ano passado. Em consequência, os volumes transportados pela hidrovia despencaram quase 50% no primeiro semestre do ano. 

Nos primeiros seis meses do ano passado, segundo dados da Agência Nacional de Transporte Aquaviário (Antaq) foram transportadas 4,51 milhões de toneladas pelo Rio Paraguai a partir dos portos em Corumbá e Porto Murtinho. Em igual período deste ano, o volume caiu para 2,28 milhões de toneladas. 

No primeiro semestre do ano passado, as exportações de minério de ferro renderam 368,3 milhões de dólares à economia local. Neste ano, foram apenas 164,6 milhões, conforme dados da Carte de Conjuntura do Comércio Exterior. Parte desta queda no faturamento deve-se à redução nas cotações internacionais do minério, da ordem de 25% neste ano.  

DRAGAGEM

A partir do momento em que o rio fica abaixo de um metro na régua de Ladário, o transporte de minérios é praticamente suspenso. Agora, porém, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) promete iniciar, até meados de setembro, o trabalho de dragagem para manter o transporte durante o ano inteiro

De acordo com a superintendência regional do DNIT, no chamado Tramo Sul, entre Corumbá e Porto Murtinho, foram identificados “18 passos críticos e 15 passos potencialmente críticos” que necessitam de intervenção.

Em alguns deles as empresas de transporte são obrigadas a desconectar os comboios e passar as 16 chatas uma por uma, o que atrasa as viagens em mais de um dia, inclusive quando o rio está em cerca de 1,5 metro.

Ainda conforme o DNIT, “a dragagem de manutenção promove um novo arranjo do leito, retirando sedimentos de um canal natural identificado e depositando-o dentro do próprio rio, em ponto que não traga riscos à navegação”.

Esta metodologia de trabalho, explica a superintendência, “visa não reduzir a altura da lâmina d'água, o que significa que a dragagem de manutenção não interfere no ciclo de transbordamento do rio”. 

Intervenções semelhantes já são feitas no chamado tramo norte, entre Corumbá e Cáceres (MT), “há mais de 20 anos sob licença e acompanhamento anual pelo IBAMA, que emitiu pareceres afirmando que as atividades apresentam baixo impacto ambiental e que estes são provisórios e reversíveis”. 

A estimativa do DNIT é de que os trabalhos emergenciais de dragagem se estendam durante seis meses, mas mesmo depois disso, explicou a superintendência por meio de nota enviada ao Correio do Estado, serão necessários trabalhos permanentes de manutenção do calado. 

Em agosto do ano passado foi anunciada a liberação de R$ 95 milhões, pelo Governo Federal, para estes trabalhos de dragagem. Inicialmente, porém, o Ibama entendia que eram necessários estudos de impacto ambiental para conceder a autorização e por isso os trabalhos não começaram até agora.