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Após acordo de Marangatu, Estado prioriza outras seis áreas em conflito

Modelo de negociação inédito deve abrir precedentes para que mais fazendeiros sejam indenizados para deixar terras reivindicadas por indígenas

27 SET 2024 • POR Alanis Netto, Naiara Camargo • 10h15
O governador do Estado, Eduardo Riedel, afirmou que o acordo firmado é uma quebra de paradigma, mas que abre negociações semelhantes   Marcelo Victor/Correio do Estado

No dia 25 de setembro, indígenas e fazendeiros fecharam um acordo histórico durante audiência de conciliação no Supremo Tribunal Federal (STF), que permitiu a continuidade no processo de homologação da Terra Indígena TI Ñande Ru Marangatu, que possui 9.317 hectares, mediante indenização de R$ 146 milhões aos proprietários rurais que vivem na região para que eles se retirem das terras.

O acordo só aconteceu após os conflitos, que acontecem na região há mais de quatro décadas, se intensificarem novamente e resultarem na morte do indígena Neri Guarani Kaiowá, que foi executado por um Policial Militar com um tiro na nuca.

Durante coletiva de imprensa para tratar sobre o tema, realizada na manhã desta sexta-feira (27) o governador do Estado, Eduardo Riedel, reforçou o interesse do executivo estadual de fazer acordos em outros territórios reivindicados por indígenas em Mato Grosso do Sul. Ele mencionou que o acordo histórico é uma "quebra de paradigma", e não será generalizado, mas que abre o modelo de discussão, que pode ser utilizado em cenários semelhantes.

"É claro que esse acordo é uma quebra de paradigma, ele não abre um precedente geral, porque está muito bem posto no âmbito da conciliação específica desse caso [de Marangatu]. Agora, ele abre esse modelo de discussão. O Congresso Nacional está discutindo uma legislação que defina os critérios e o regramento daquela que é uma questão constitucional", disse Riedel.

A expectativa é que a mesa de conciliação do STF elabore uma proposta de legislação que o Congresso Nacional aceite, para pacificar o conflito de terras no Brasil.

Segundo o governador, existem atualmente mais de 30 territórios em litígio no estado, sendo seis deles prioridade para a firmação de acordos, por se tratarem de locais onde os confrontos são mais intensos. O cenário foi apresentado em reunião com o ministro do STF, Gilmar Mendes, realizada na última quinta-feira (26).

Riedel explicou ainda que o grau de litígio reúne uma série de parâmetros para priorizar negociações como essa. As seis áreas citadas acima se enquadram no grau de litígio 1, considerado de prioridade para resolução.

"É um novo modelo, posto a partir de uma negociação, que certamente vai ter desdobramentos em outros casos, em outras discussões, e não há aqui uma regra estabelecida. É importante que se diga que o que foi feito é no âmbito de um processo judicial específico, e que pode ser adotado para outros processos que sigam enquanto a legislação não estiver pacificada (...) a gente espera que a mesa de conciliação, que foi trazida pelo STF, leve a final e a cabo uma discussão, e que o Congresso Nacional possa efetivamente dar a condição final para esse tipo de litígio", finalizou Riedel.

O governador não especificou quais seriam as seis áreas de litígio grau 1.

Relembre

Em acordo histórico entre indígenas e fazendeiros, ocorrido em audiência de conciliação no Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal e governo do Estado se comprometeram a pagar R$ 146 milhões de indenização para proprietários rurais de Antônio João, dando continuidade, assim, a finalização da homologação da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, de 9.317 hectares.

Uma semana após o assassinato do indígena Neri Guarani Kaiowá, de 23 anos, ocorrido no dia 18, o acordo feito com a presença do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), lideranças indígenas Guarani Kaiowá, governo do Estado, representado pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE), Ana Carolina Ali Garcia, e proprietários rurais, que sacramenta o fim dos conflitos pela propriedade das terras em Antônio João.

Do total de R$ 146 milhões que serão pagos como indenização, R$ 102,2 milhões serão destinados pela União aos proprietários rurais pela terra nua, por meio de precatórios, e R$ 16 milhões o governo do Estado vai arcar como contrapartida. 

O outro montante restante, de acordo com a ata do termo da audiência de conciliação, será pago pela União de imediato aos fazendeiros, pelas benfeitorias feitas nas terras, no valor de R$ 27,8 milhões.

Após o pagamento das benfeitorias, que deve ocorrer até o final deste ano, os proprietários rurais terão 15 dias para se retirarem dos 9.317 hectares, que serão oficialmente pertencentes ao povo Guarani Kaiowá.

Já para o pagamento pela terra nua, que será feito através de precatórios, a previsão é que os títulos de precatórios comecem a ser pagos no começo de 2025.

Saiba

O conflito de terras em Antônio João já dura décadas, ao longo desse período, quatro indígenas já foram mortos no município em virtude da disputa por terras. O primeiro foi Marçal de Souza, em 1983, o segundo foi Dorvalino Rocha, em 2005. Dez anos depois, em 2015, Simião Vilhalva foi assassinado. O último foi Neri Guarani Kaiowá, no dia 18.

Colaborou: Judson Marinho