Sócio-diretor do Instituto Paraná Pesquisas (IPP), Murilo Hidalgo concedeu uma entrevista exclusiva ao Correio do Estado e falou dos desafios de uma instituição do tipo nos dias atuais.
Ele também defendeu o autofinanciamento de pesquisas, pois para ele isso pode oferecer oportunidades para empresas menores demonstrarem a qualidade de seu trabalho. Confira a seguir.
Conte-nos sobre a história do IPP. Como surgiu o instituto e como construiu sua história?
O Instituto Paraná Pesquisas é um instituto de pesquisa brasileiro fundado em 1990 por mim, na cidade de Curitiba (PR). Inicialmente, era focado em levantamentos de opinião pública no estado do Paraná, expandindo-se gradualmente para cobrir todo o território nacional e, mais recentemente, atuando em eleições internacionais, como em Portugal e nos Estados Unidos.
Desde a sua fundação, o IPP tinha como visão se especializar em pesquisas eleitorais e de opinião. Ao longo dos anos, foi ganhando reconhecimento por suas análises durante campanhas eleitorais e conquistando a confiança dos seus clientes e dos maiores formadores de opinião no campo político.
Sua credibilidade foi construída com base em metodologia rigorosa, na transparência de seus dados, no respeito pela opinião dos entrevistados e, sobretudo, por suas altas taxas de acerto em períodos eleitorais.
Além de atuar em eleições, o IPP realiza estudos em áreas como comportamento do consumidor e questões sociais. Hoje, é considerado um dos mais influentes no Brasil, frequentemente citado pela mídia nacional.
Qual a sua opinião sobre o autofinanciamento de pesquisas eleitorais?
O autofinanciamento de pesquisas eleitorais não deve ser proibido, pois pode oferecer oportunidades valiosas para institutos menores – e que ainda não têm grande visibilidade nacional – demonstrarem a qualidade de seu trabalho. Inclusive, esse foi um grande motor para auxiliar a projeção do nome do Instituto Paraná Pesquisas ao nível nacional.
Proibir essa prática poderia limitar a entrada de novos atores no mercado, favorecendo apenas os grandes institutos, que já têm recursos e reconhecimento.
Além disso, o autofinanciamento permite que esses institutos produzam dados relevantes, sem depender de encomendas externas, e mostrem sua competência e sua credibilidade ao público.
O foco deve estar na regulamentação e na fiscalização rigorosa das metodologias e na transparência dos resultados, a fim de evitar pesquisas de má qualidade ou tendenciosas, em vez de restringir a capacidade de autofinanciamento.
O excesso de pesquisas eleitorais e de institutos acaba por tirar a credibilidade dos levantamentos de intenção de voto?
O excesso de pesquisas eleitorais ou a quantidade de institutos não tiram a credibilidade dos levantamentos. Pelo contrário, a diversidade de institutos e pesquisas fortalece o processo democrático, permitindo que diferentes metodologias e visões sejam apresentadas.
O importante é que haja transparência nas metodologias utilizadas e que os resultados sejam auditáveis.
É necessário aqui destacar que a credibilidade de um instituto não se constrói pela quantidade de pesquisas, mas sim pela consistência e pela precisão dos seus dados ao longo do tempo.
A competição saudável entre institutos estimula a melhoria contínua, o que beneficia tanto o eleitor quanto o processo eleitoral em si.
As pesquisas eleitorais ainda são uma das melhores armas da democracia?
Sem dúvida, as pesquisas eleitorais ainda são uma das melhores ferramentas da democracia brasileira. Elas fornecem um termômetro do que a população pensa e deseja, ajudando tanto a nortear as campanhas eleitorais quanto pautar o debate público.
Ao dar visibilidade à opinião do eleitorado, antes mesmo dos resultados das eleições nas urnas, as pesquisas garantem que as demandas sociais sejam ouvidas e discutidas, promovendo maior transparência no processo político, antecipando as demandas dos eleitores e a forma como estão fazendo o seu constructo de decisão de voto.
Além disso, ao serem conduzidas de forma ética e com metodologias rigorosas, as pesquisas ajudam a evitar manipulações e desinformações.
A qualidade e a credibilidade desses levantamentos são essenciais para fortalecer a democracia e manter o eleitor bem informado. O que deve ser combatido é a desinformação e o que deve ser estimulado é tanto a fiscalização quanto a transparência na condução das pesquisas eleitorais.
A Justiça Eleitoral aumentou a fiscalização sobre os institutos de pesquisas. Em sua avaliação, o que é necessário fazer?
O aumento da fiscalização pela Justiça Eleitoral é positivo, pois contribui para a transparência e a credibilidade das pesquisas eleitorais.
Além de intensificar a fiscalização, é fundamental garantir que todos os institutos sigam metodologias científicas rigorosas e sejam claros na divulgação de suas amostras e margens de erro.
Um dos fatores que gostaríamos de ver, enquanto instituto, é a criação de um diálogo constante com outros institutos, estabelecendo regras que não sejam excessivamente burocráticas, mas que garantam a integridade dos resultados. Promover o debate e a reflexão conjunta auxiliaria não só a criar regras mais realistas, como garantiria maior transparência entre as empresas do ramo.
Outro fator não menos importante é de que os órgãos de representação de classe estivessem presentes não só na fiscalização, como também nesse diálogo.
Conselhos federais como os de estatística e advocatícia poderiam se fazer mais presentes nesses momentos, inclusive para auxiliar no entendimento das regras de pesquisa por promotores e pela classe de advogados que julgam a veracidade ou não de uma pesquisa ou ainda se ela poderá ou não ser divulgada pela mídia.
O eleitor acaba por votar no candidato que a pesquisa indica que vai ganhar?
De fato, as pesquisas eleitorais podem influenciar o comportamento do eleitor, mas não determinam o resultado da eleição. Muitos eleitores levam em consideração as pesquisas ao definir seu voto, principalmente aqueles que tendem a votar no candidato “mais forte” ou que têm receio de desperdiçar o voto em candidatos com poucas chances de vitória.
Ainda, aqueles que visam auxiliar no engajamento à eleição, para não permitir que determinado candidato à frente de pesquisas divulgadas ganhe, ou até mesmo que querem fomentar o voto útil, muito falado nas últimas reflexões.
No entanto, essa influência tem limites. Pesquisas são fotografias do momento, retratando a intenção de voto em determinado contexto, mas não são previsões definitivas.
O comportamento do eleitorado pode mudar até o dia da eleição, e fatores como debates, campanhas e novas informações/fatos políticos podem alterar o cenário.
É crucial que as pesquisas sejam vistas como uma ferramenta de informação, e não como um mecanismo que decide o pleito. Ao analisar essa temática, conclui-se que, embora haja uma influência, o voto é determinado por múltiplas variáveis e que a pesquisa apenas reflete as tendências de um momento específico, e não a decisão de uma eleição.
O comportamento do eleitor tem mudado nos últimos anos?
O comportamento do eleitor brasileiro tem mudado significativamente nos últimos anos, e essas mudanças têm impactado diretamente o trabalho dos institutos de pesquisa.
Uma das transformações mais evidentes é o aumento da polarização política, com eleitores cada vez mais decididos e leais a suas preferências partidárias e ideológicas.
Essa polarização dificulta a captação de eleitores indecisos e exige que os institutos sejam mais precisos ao identificar nuances entre diferentes grupos.
Outro fator importante é o crescimento das redes sociais, as quais têm influenciado o debate público e permitido que os eleitores acessem tanto informações quanto desinformações em tempo real.
Isso tem tornado a opinião pública mais volátil e sujeita a mudanças repentinas, o que representa um desafio para a confiabilidade das pesquisas.
Eleitores, antes expostos principalmente à televisão e aos meios tradicionais de comunicação, agora se informam por diversas fontes, criando bolhas de opinião que dificultam a percepção ampla do cenário eleitoral.
Além disso, o eleitor moderno está mais crítico em relação às instituições e à política em geral, o que tem elevado o nível de desconfiança em relação às próprias pesquisas eleitorais.
O fenômeno das fake news e a crescente desinformação também tornaram os eleitores mais céticos sobre os dados apresentados pelos institutos. E essas mudanças no comportamento exigem que os institutos adaptem suas metodologias.
Por exemplo, é necessário um equilíbrio entre diferentes metodologias, formas de extração de amostras e seleção de entrevistados. Também se faz necessária uma segmentação mais detalhada das amostras, levando em conta fatores como redes sociais, hábitos de consumo de informação e até emoções políticas.
Dessa forma, o trabalho dos institutos está cada vez mais focado em acompanhar as rápidas mudanças de opinião ao longo da campanha.
Isso implica a realização de pesquisas mais frequentes e de diferentes tipos de estudos qualitativos, como grupos focais, para entender os fatores emocionais e comportamentais que moldam as decisões dos eleitores.
Quanto mais diversificadas e frequentes são as sondagens e os levantamentos realizados, maior a probabilidade de acerto da pesquisa.
Hoje, sem dúvida nenhuma, o desafio [de fazer levantamentos políticos] é muito maior que há 30 anos, quando começamos, mas também oferece uma oportunidade para que os institutos demonstrem sua capacidade de adaptação e sua relevância.
Qual o método que o IPP utiliza?
O Instituto Paraná Pesquisas utiliza uma combinação de métodos de coleta de dados, dependendo do tipo de pesquisa, do público-alvo e da situação específica.
Entre as principais abordagens estão as entrevistas por telefone [Computer Assisted Telephone Interviewing ou Cati] e presenciais em domicílio e, em alguns casos, métodos on-line. Cada um desses métodos tem suas vantagens e seus desafios, e a escolha depende do objetivo da pesquisa e das condições operacionais.
As entrevistas por telefone, por exemplo, são eficientes para obter respostas rápidas e alcançar uma amostragem ampla em diversas regiões, principalmente em eleições em que a agilidade é fundamental.
Esse método permite um maior controle sobre a amostra e, com o auxílio de softwares, facilita a tabulação dos dados. No entanto, pode haver limitação no alcance de públicos que têm pouco acesso ou até mesmo o hábito de usar o telefone, além de um certo nível de recusa em participar.
Já entrevistas presenciais em domicílio oferecem um contato mais direto com o eleitor e costumam gerar taxas de resposta mais altas.
Elas são mais adequadas quando o pesquisador precisa captar nuances do comportamento e do ambiente do entrevistado, bem como quando a seleção da amostra exige múltiplos estratos. No entanto, esse método é mais caro e demorado.
Entrevistas por fluxo contínuo em locais públicos são úteis em pesquisas de mercado ou de opinião pública. Um problema que surge, porém, é que algumas vezes nem todos os segmentos sociais estão presentes nesses locais. Por isso, se exige que múltiplos estratos sejam atendidos para a seleção do entrevistado.
Já as pesquisas on-line, por adesão voluntária, têm ganhado espaço com o crescimento do acesso à internet, especialmente entre os mais jovens.
Elas permitem coleta de dados de forma rápida e a um custo menor, mas apresentam limitações quanto à representatividade, uma vez que muitos eleitores, especialmente de classes mais baixas ou em áreas rurais, podem não ter acesso à internet ou não participar dessas plataformas.
Todos os métodos têm seus prós e contras. E justamente por esse motivo não há um método considerado mais eficiente universalmente. Cada técnica tem o seu papel dependendo do contexto.
A melhor abordagem é sempre aquela que combina a representatividade da amostra, a precisão dos dados e a adequação ao tipo de estudo, razão pela qual o IPP está sempre aberto a adotar múltiplos métodos conforme a necessidade.
Os entrevistados estão cada vez menos receptivos aos institutos de pesquisa?
Sim, e essa tendência tem se intensificado nos últimos anos muito pela desinformação, pela propagação de informações inverídicas sobre a seriedade dos institutos, com a divulgação de notícias classificando as empresas entre confiáveis e não confiáveis, que acertam ou que não acertam.
Já foi dito que a pesquisa se traduz em uma ferramenta estratégica para trazer a opinião, os anseios e as pautas do eleitor, consumidor, etc., mas nunca um instrumento de previsão – no máximo revelamos tendências.
Tentamos antever resultados, sim, mas não há uma cobrança excessiva, pois há o entendimento sobre o cerne do trabalho de um instituto de pesquisa: fornecer dados para traduzi-los em informação estratégica.
Uma das principais causas desse fenômeno, portanto, é a crescente desconfiança por parte do público em relação às instituições em geral.
Perfil - Murilo Hidalgo
Natural de Curitiba (PR), é formado em Economia, pós-graduado em Marketing e ex-professor da UniCuritiba e da Universidade Positivo. Atualmente, é sócio-diretor do Instituto Paraná Pesquisa (IPP), que atua há 34 anos no mercado brasileiro e é uma referência em pesquisa política, de opinião e de mercado.