Cidades

ENTREVISTA

‘Em 1968, eu estava na Sorbonne e vi a revolução’,
diz Arlete Saddi Chaves

‘Em 1968, eu estava na Sorbonne e vi a revolução’,
diz Arlete Saddi Chaves

THIAGO ANDRADE

26/05/2013 - 18h30
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“É proibido proibir” se tornou canção de Caetano Veloso. Contudo, a origem da famosa frase é francesa: “C’est interdit d’interdire”. Ela foi uma das frases de ordem entoadas por estudantes, professores e operários franceses durante os protestos que ganharam fama mundial com a revolução de maio de 1968 e que completam 45 anos. Estudante na época, a campo-grandense Arlete Saddi Chaves foi testemunha ocular dos acontecimentos. Nesta entrevista, a diretora da Aliança Francesa de Campo Grande conta o que viveu durante os dias em que a França parou. “O lixo era jogado nas ruas e os lixeiros estavam em greve. O mau cheiro tomou conta da cidade. Porém, eu e os brasileiros que moravam em Paris sabíamos que estávamos vivendo algo único”, considera. Sob o epíteto de maio de 68, reuniu-se um conjunto de protestos, manifestações e conflitos por causas como a revolução sexual, direitos trabalhistas e o fim da guerra do Vietnã. Os eventos levaram à greve geral, onde mais de seis milhões de pessoas interromperam suas atividades, e à derrubada do presidente Charles de Gaulle. Em seu lugar assume Georges Pompidou, que passa a atender as reivindicações, dando fim às manifestações.

CORREIO PERGUNTA O que levou a senhora à França nessa época?

Arlete Saddi Chaves Fui da primeira turma de Letras da antiga Faculdade Dom Aquino de Filosofia, Ciências e Letras, atual UCDB, e também da primeira turma da Aliança Francesa, recém-trazida para a Capital por Maria da Glória Sá Rosa. Por minha afinidade com o idioma, um dos fundadores da faculdade, o falecido Padre Venturelli, me mostrou um anúncio de jornal que dizia que a Cappes estava oferecendo bolsas para quem tivesse interesse em ir estudar em Paris.

A senhora estava no epicentro dos acontecimentos, a Université Paris-Sorbonne. Gostaria que a senhora me contasse como tudo começou.

O clima estava pesado, pois havia pressão para que a Universidade de Nanterre fosse fechada. Lá se concentravam os alunos esquerdistas, liderados por um alemão, Daniel Cohn-Bendit, que atualmente é deputado francês pelo Partido Verde. Em protesto, alunos da Sorbonne incendiaram uma sala de aula, no dia 3 de maio de 1968, e a polícia invadiu a universidade para intervir, o que era um sacrilégio. Eu estava em aula e, quando saí, vi alunos e a polícia se confrontando. Muitos foram presos. Eu entrei em uma sala de cinema no Quartier Latin. O filme que passava era “O joelho de Claire”, de Éric Rohmer, mas eu não prestei atenção alguma no filme, de tão preocupada. Quando o filme terminou, imaginei que tudo já se acalmara. Ao sair da sala, vi que estava enganada.

Qual era o clima na cidade depois que os protestos começaram?

Havia muita insatisfação. Aos poucos, as pessoas aderiam à greve, até sua proclamação oficial em 13 de maio. Foi quando tudo parou. A comida se tornou escassa, os correios não funcionavam, o transporte parou. Não havia abastecimento. A Embaixada do Brasil já pensava em nos tirar de lá.

Qual foi a sua rotina durante esses dias?

Não tinhámos aula, portanto, saíamos a pé para caminhar por Paris, logo depois do café da manhã. A cidade estava desolada. As vitrines foram quebradas, carros queimados eram usados como barricadas e os paralelepípedos, os pavés, eram arrancados para serem usados como arma. Os estudantes se uniam e marchavam entoando palavras de ordem. Eles gritavam: “CRS/SS”, chamando os guardas das Compagnies Républicaines de Securité, a polícia parisiense, de fascistas. Os enfrentamentos adentravam as madrugadas. Eu achava aquilo tudo muito interessante. Com amigos franceses e brasileiros, eu participei dos protestos, mas sempre atrás, pois era estrangeira.

Os estudantes e os operários foram os principais protagonistas dos movimentos que levaram a maio de 68?

Começou com os estudantes, que não queriam ver Nanterre fechada, mas logo os trabalhadores passaram a participar. Desse modo, todo mundo entrou na briga. Mesmo dentro do movimento estudantil, havia facções diferentes, como o Occident, um grupo de extrema direita. Mas o clima de insatisfação era geral.

A França dos anos 60 estava em plena ebulição intelectual e artística. O filósofo existencialista Jean-Paul Sartre foi um dos que se colocaram ao lado dos estudantes. O que significou esse apoio intelectual?

Eu vi Sartre duas vezes. Uma na rua e outra quando ele visitou a Cité Universitaire, onde eu morava na época, para um encontro com os estudantes. Lá estava ele, pequeno e baixinho. Havia uma crítica muito forte à questão do intelectual, que era visto como o burguês, que de seu escritório fazia críticas, mas não saia à ação. Acredito que isso o tenha motivado e o que se viu foi essa mudança de paradigma. Além disso, foi uma época muito rica. Eu estudava literatura contemporânea, então, os livros que eu lia eram escritos por pessoas que estavam ali. Eu fui ao enterro de André Maurois, por exemplo, que era membro da Académie Française e foi um autor fundamental.

Estamos aqui, 45 anos depois. De que serviram os dias de maio de 1968?

Durante algum tempo, tive a impressão de que tudo aquilo era gratuito, eu não via os reais motivos. Mas depois eu entendi. Uma manifestação, um protesto, uma revolução, elas são justificáveis, sem elas não há mudanças. É um jeito de se fazer ouvir. Desde estudantes que pediam a supressão do latim na grade curricular às mulheres que exigiam mais igualdade ou aos trabalhadores que pediam salários maiores, todos reivindicavam algo. Essa geração de 68, os “Soixante-huitard”, foi atendida porque se manifestou. No Brasil, havia também uma movimentação nesse sentido e contra o regime militar, que ganhou força com os estudantes e os trabalhadores.

A senhora enfrentou alguma dificuldade durante esse período?

Em meio às manifestações, um grupo de jovens brasileiros, que eu imagino que estivessem na França ilegalmente, invadiram a Casa do Brasil, na Cité Universitaire. Muitos colegas apanharam e foram torturados. O diretor da casa foi expulso e teve de procurar abrigo na embaixada brasileira. Nós acordávamos e não sabíamos o que estava nos esperando. Foi um vandalismo horroroso. Eram oportunistas, que se aproveitaram do clima para fazer uma pequena revolução. Algumas outras casas, como a Maison d’Espagne, também passaram por isso.

Quem estava ali tinha noção de que estava participando de um momento histórico?

Eu tinha, ainda mais vinda de uma cidade tão pequena quanto era Campo Grande na época. As proporções que aquilo tomou, eu jamais imaginaria.

Qual foi a sensação quando tudo terminou?
Com o plebiscito, a população decidiu pela saída de Charles de Gaulle. Fiquei desapontada com isso, ele era um grande estadista. Aos poucos, a vida voltou ao normal. O lixo nas ruas foi recolhido e o mau cheiro passou. As reivindicações foram atendidas. 

MEIO AMBIENTE

Com dinheiro sobrando, Noruega pode financiar preservação do Pantanal de MS

Governo norueguês é o maior doador do Fundo Amazônia e desde 2013 já destinou mais de R$ 3 bilhões para o bioma

12/11/2024 09h30

Preservação do bioma pantaneiro em Mato Grosso do Sul pode render dinheiro aos produtores rurais e moradores da região

Preservação do bioma pantaneiro em Mato Grosso do Sul pode render dinheiro aos produtores rurais e moradores da região Foto: Rodolfo César

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O governo de Mato Grosso do Sul negocia com o governo da Noruega para que ela seja um dos doadores do Fundo Clima Pantanal, destinado a projetos de preservação do bioma no Estado e que está prestes a lançar seu primeiro programa de pagamento ambiental.

Segundo Artur Henrique Leite Falcette, secretário-executivo de Meio Ambiente da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc), no fim do mês passado, foram feitas reuniões com o governo norueguês, que mostrou interesse na iniciativa, já que o país europeu conta com muitos recursos para essa finalidade.

“Eles não conheciam o Pantanal e não sabiam o que tem o Estado. Mas disseram que tem carência de bons projetos e que não conseguem dispor de todo o recurso que eles têm para o meio ambiente, porque faltam projetos”, contou Falcettte.

A sinalização é animadora, pois o governo norueguês é o maior financiador do Fundo Amazônia. Conforme o Banco de Desenvolvimento de Econômico e Social (BNDES), que é o gestor do fundo, o primeiro acordo de doação assinado com a Noruega foi em 2009. Desde então, o país permanece sendo o maior doador, com recursos que superam R$ 3 bilhões.

Em junho deste ano, o BNDES e o governo da Noruega formalizaram uma nova doação para o Fundo Amazônia no valor de US$ 50 milhões (cerca de R$ 273 milhões).

Para Mato Grosso do Sul, porém, ainda não há uma sinalização de valores. Segundo Falcette, para progredir a conversa com os noruegueses, o que falta é a publicação do Programa Estadual de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) do Pantanal com as linhas de financiamento aos produtores. O texto já está pronto e apenas aguarda aval do governo do Estado para ser lançado.

“Nenhuma sinalização objetiva foi feita porque todo mundo que tem interesse está aguardando o lançamento do programa. Eles querem ter o controle de como vai ser utilizado o recurso que investirem e estão aguardando essa definição. O texto já está pronto, aguardando para ser lançado”, contou o secretário-executivo.

Desde sua criação, por meio da nova lei do bioma (Lei Estadual nº 6.160/2023), que entrou em vigor em fevereiro deste ano, o Fundo Clima Pantanal tem em caixa o valor do investimento inicial, de R$ 50 milhões, feito pelo governo do Estado. Esse é o quantitativo trabalhado para o primeiro PSA do fundo.

A iniciativa visa incentivar produtores rurais a manterem o Pantanal conservado por meio de financiamento. Quem preservar além do que a nova lei do bioma determina pode receber por isso.

Como o Correio do Estado já antecipou em junho deste ano, esse primeiro edital deverá ter duração de um ano, com os pagamentos divididos em duas parcelas: a primeira será paga assim que o produtor for considerado apto e a segunda, no fim do período.

Quem for aprovado nesse edital não terá limitação para participação dos próximos, já que a ideia é aumentar a preservação do bioma. A previsão é de que os pagamentos do PSA iniciem no ano que vem.

COP29

Para tentar avançar nesse investimento na ferramenta, Falcette já tem uma nova reunião marcada com o governo da Noruega, que deve ocorrer nesta semana.

“Temos uma agenda na COP29 [Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas] e uma série de outras agendas sobre o Fundo do Pantanal para falar dos programas e esperamos conseguir alguma novidade”, declarou Falcette.

INICIATIVA PRIVADA

Além do governo da Noruega, o secretário-executivo de Meio Ambiente da Semadesc também se reuniu com empresas do setor privado no país europeu, que também se mostraram interessadas nas iniciativas ligadas ao Pantanal de Mato Grosso do Sul.

“Tivemos conversas com a iniciativa privada ligada ao setor de petróleo. Eles investem muito em projetos de descarbonização no Hemisfério Sul porque precisam bater a meta deles. Eles se mostraram interessados em financiar o setor produtivo e atrelar isso a créditos de carbono”, contou Falcette ao Correio do Estado.

Segundo o secretário-executivo, esse financiamento seria para ajudá-los a iniciar as práticas de preservação, para que esses produtores não precisem investir dinheiro próprio, o que muitas vezes é necessário. Em troca, o crédito de carbono resultante dessa preservação seria destinado às empresas privadas da Noruega. Isso, porém, também depende da publicação do PSA.

OUTROS INVESTIDORES

O Correio do Estado já havia antecipado que o governo do Estado também negocia com empresas do setor privado um investimento no Fundo Clima Pantanal.

Duas multinacionais ligadas à cadeia da produção pecuária estão interessadas em investir no fundo. Além delas, uma organização não governamental (ONG) ligada ao meio ambiente também se mostrou disposta a colaborar.

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"PÓ DE SERRA"

Rota do tráfico da 'Quadrilha dos Casais', interior de MS vira alvo da PF

Polícia Federal deflagrou operação mirando três municípios sul-mato-grossenses, considerados "ponto-chave" no tráfico transnacional que alimentava o Brasil com cocaína paraguaia

12/11/2024 09h17

Mandados foram cumpridos em quatro municípios paranaenses e outros três de Mato Grosso do Sul

Mandados foram cumpridos em quatro municípios paranaenses e outros três de Mato Grosso do Sul Reprodução/PF

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Municípios de Mato Grosso do Sul amanheceram essa terça-feira (12) na mira da Polícia Federal, como alvos da Operação Pó de Serra, que busca desarticular uma "quadrilha de casais", suspeita de traficar toneladas de drogas tendo o interior do Estado como rota principal. 

Mandados foram cumpridos em quatro municípios paranaenses e outros três de Mato Grosso do SulReprodução/PF

Segundo a Polícia Federal, os mandados judiciais expedidos pela 1ª Vara Federal de Guaíra/PR - 36 de Busca e Apreensão e 27 de Prisão Preventiva -, foram cumpridos em: 

  • Umuarama/PR,
  • Guaíra/PR,
  • Maringá/PR,
  • Rolândia/PR,
  • Amambai/MS,
  • Naviraí/MS e
  • Mundo Novo/MS. 

Organização criminosa que, conforme investigações, costumeiramente homens e mulheres para simular um casal no transporte de drogas, com a ideia de não levantar suspeitas durante abordagens policiais, estima-se que cerca de 20 toneladas de substâncias tenham sido traficadas por esse grupo desde 2020.

Além dos mandados, foi determinado sequestro de bens móveis e imóveis da quadrilha, com intuito de "descapitalizar" a organização, bem como o bloqueio de contas vinculadas a 31 investigados,  no valor de até R$389 milhões.

Entenda o esquema

Através dos trabalhos conjuntos das forças brasileiras com o chamado Grupo de Investigações Sensíveis (GISE), da Secretaria Nacional Antidrogas do Paraguai (SENAD/PY), foi possível desenhar a rota que a dita "Orcrim" usava em suas atuações. 

Os carregamentos, conforme apurações policiais, aconteciam em solo paraguaio, descendo de Pedro Juan Caballero através de uma rodovia brasileira que corta as cidades de Amambai, Tacuru e Sete Quedas. 

O objetivo era cair novamente em território paraguaio, na região de Katueté, para dali decidir se: seguiriam rumo a Guaíra ou partiriam para Foz do Iguaçu/PR. 

Conforme a polícia, o destino final era fazer com que essas substâncias chegassem até: 

  •  Umuarama, 
  •  Maringá,
  •  Curitiba,
  •  Balneário Camboriú, 
  •  Itajaí e 
  •  Joinville.

Os trabalhos investigativos começaram a partir de 2023, quando no fim do ano passado um casal com 53 kg de cocaína foi flagrado em Guaíra, com destino a Umuarama. 

Pelo menos 11 flagrantes, de tráficos em geral, foram vinculados no inquérito policial como ligados às práticas dessa organização criminosa em específico. 

Ou seja, ainda que as apreensões sejam de aproximadamente 1 tonelada de cocaína, a polícia estima que mais de vinte tenham passado pelo trecho no período dos últimos quatro anos. 

Como os alvos incorrendo nos crimes de tráfico internacional de drogas, associação para o tráfico e participação em Organização Criminosa, as penas máximas dos envolvidos podem somar mais de 55 anos de prisão. 

 

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