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Fausto Matto Grosso: "Intervenção militar 'constitucional'"

Engenheiro e professor aposentado pela UFMS

Redação

30/11/2017 - 02h00
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Durante muito tempo, pensei que a intervenção militar fosse um assunto irrelevante, restrita a uma meia dúzia de condutores de faixas nas passeatas contra a corrupção. Entretanto, algumas informações sobre o assunto me deixaram preocupado.

Não me refiro à possibilidade real da intervenção, mas ao caldo de cultura existente no País favorável a soluções autoritárias e simplistas como esta.

Segundo pesquisas recentes do Instituto Paraná Pesquisas, 43,1% dos brasileiros defendem a intervenção militar no Brasil. 51,6% são contra e 5,3% não sabem ou não responderam. 

Por trás dessa realidade está o brasileiro descrente do sistema político, enojado pela corrupção e assustado com a violência cotidiana. Esses pontos são centrais, portanto, para serem enfrentados a partir de uma perspectiva democrática.

As mudanças que estão ocorrendo no sistema político são muito tímidas e apontam para o esforço de sobrevivência dos atuais mandatários. As poucas brechas que se abriram devem ser aproveitadas para uma intervenção maior da cidadania nas próximas eleições. Muitos grupos, pelo menos meia dúzia deles, apontam para uma filiação maciça de cidadão nos partidos mais limpos ou renovados.

Os que acreditam em mais democracia para a superação da crise da política devem assumir essa articulação com prioridade. Poderemos construir elementos para uma nova cultura política. Afinal, a política é muito importante para deixar na mão só dos políticos.

A corrupção foi transformada em sistema de poder nas últimas décadas. Pior, tornou-se um mal comum, que atinge todos os quadrantes ideológicos: direita, centro e esquerda, esta última até então encarada como reserva de moralidade. Apesar disso, é possível constatar uma atuação firme do Judiciário e da Polícia Federal.

Vários são os políticos e empresários processados, condenados e presos, principalmente nas primeiras e segundas instâncias. Decisões importantes estão sendo esperadas, como a manutenção da prisão para condenados na segunda instância e a redução do foro especial para os políticos, o que ajudaria a desafogar o Supremo Tribunal Federal e daria celeridade aos processos contra os políticos.

As mudanças recentes no Ministério Público, com a entrada de Raquel Dodge, até agora não deram razão para temores de perda de empenho dessa instituição. Apreensões existem quanto a mudanças na Polícia Federal, mas têm de serem anuladas pela mobilização, cada vez mais firme, da opinião pública e dos meios de comunicação. 
A violência na vida cotidiana, o tráfico de armas e drogas, está aí a preocupação maior das pessoas.

Estas se sentem inseguras e desprotegidas. Regiões inteiras estão fora do poder do Estado e a violência invade os lares e todos os ambientes da vida social. O grande desafio é construirmos uma nova formulação democrática, mas efetiva, sobre a segurança pública.

Como herança dos tempos da Ditadura, os democratas sempre olharam com desconfiança esse tema, principalmente aqueles mais à esquerda, que não se permitiram enfrentar esse desafio. Sem abrir mão da defesa dos direitos humanos universais, é preciso formular uma política mais efetiva da defesa integral dos cidadãos. Não se pode imobilizar a polícia no cumprimento do seu papel legal, ela própria grande vítima de crescente violência.

Quanto à intervenção militar, “constitucional”, como tentam dissimular seus defensores, é preciso deixar claro que ela será sempre inconstitucional. A Constituição coloca as Forças Armadas como instituições nacionais organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do presidente da República, seu chefe maior.
A simples propagação dessas ideias se constitui em crime.

Para propaganda de processos violentos e ilegais para alteração da ordem política, é prevista pena de detenção de 1 a 4 anos. Para a incitação da animosidade entre as Forças Armadas e as instituições civis – pena de reclusão de 1 a 4 anos.

Um presidente da República só pode ser afastado do cargo por impeachment ou renúncia. Ou ainda por novas eleições, como as que teremos em 2018, quando a decisão será colocada sob a responsabilidade de cada um de nós. Espero que possamos fazer bom uso da oportunidade de passar o Brasil a limpo. 

ARTIGO

Tempos de espera e da ciência

O caos está instaurado e a sensação de "fim dos tempos" está cada vez mais presente, ainda mais levando em consideração que a escassez de chuvas deve se estender por mais algumas semanas

14/09/2024 07h30

Tempos de espera e da ciência

Tempos de espera e da ciência Arquivo

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Faz semanas que Campo Grande e boa parte de MS estão literalmente tomados pela fumaça procedente de queimadas daqui e de outros estados. Nesta sexta-feira, porém, a situação parecia estar bem pior que em dias anteriores. Monitoramento da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) comprovou aquilo que a visão empírica constatava: foi o dia em que a cidade amanheceu com a pior qualidade do ar do ano. 

Apontar culpados para esta situação assustadora seria algo simplista, pois nenhum cidadão comum coloca fogo para limpar um terreno, assim como nenhum proprietário de alguma grande fazenda pantaneira incendeia a pastagem por maldade ou falta de senso comunitário. Nem as autoridades deixaram de mobilizar um efetivo maior para combater os incêndios porque são omissas ou irresponsáveis deliberadamente. Várias delas até começaram a se vangloriar ainda antes do período de estiagem por conta daquilo que consideravam atuação mais efetiva que em qualquer dos anos anteriores. 

Mesmo assim, o caos está instaurado e a sensação de “fim dos tempos” está cada vez mais presente, ainda mais levando em consideração que a escassez de chuvas deve se estender por mais algumas semanas. Com isso, o que tanto o cidadão comum quanto os proprietários rurais e os governantes precisam entender é que os tempos são outros e aquilo que era normal há alguns anos já não é mais admissível. E esta convicção de que os tempos mudaram ou de que as mudanças climáticas são muito mais do que um discurso alarmista só será possível a partir da hora em que a ciência recuperar o status que realmente merece.

Enquanto houver uma infinidade de falsos profetas fundamentalistas interessados em vantagens imediatistas, tanto políticas quanto financeiras, a ciência será cada vez mais relegada a segundo plano e dificilmente haverá crença de que a situação está realmente grave e de que a coletividade precisa passar por mudanças radicais. 

Pelo contrário, o negaciosismo, boa parte dele alimentado pela religiosidade simplista e exploradora da ignorância, tende a ganhar impulso com um ambiente climático cada vez mais preocupante, uma vez que se abastece justamente do medo e da crença de que tudo depende dos desígnios superiores. Sendo assim, a salvação, tanto pessoal quanto a do planeta, não depende do comportamento humano, mas de uma intervenção do além. 

Só de pensar que, mesmo depois de toda a evolução tecnológica que o mundo alcançou, o negacionismo poderia dominar boa parte da humanidade, é algo assustador. Tão assustador quanto as próprias ameaças climáticas. Isso não significa que essas mudanças sejam resultado do negacionismo, mas as possibilidades de saída desta situação estão nas soluções apontadas pela ciência, na redefinição de certos comportamentos e na preservação do restante de natureza que ainda existe. 

ARTIGOS

A crescente judicialização da saúde tem solução?

13/09/2024 07h45

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A judicialização da saúde suplementar no Brasil vem crescendo de maneira expressiva, destacando um cenário de conflito entre consumidores e operadoras de planos de saúde. Dados recentes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelam que o número de processos judiciais contra essas operadoras aumentou 33% em 2023, em comparação com o ano anterior, atingindo cerca de 234,1 mil ações.

Essa elevação substancial acendeu o alerta do Supremo Tribunal Federal (STF) e do próprio CNJ, que buscam formas de reduzir a litigiosidade no setor.

Uma das principais causas desse aumento é a Lei 14.454, sancionada em setembro de 2022. Essa lei modificou a interpretação do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que deixou de ser taxativo e passou a ser considerado exemplificativo.

Dessa forma, tratamentos recomendados por médicos, mesmo que não estejam incluídos no rol da ANS, podem ser exigidos judicialmente. Vale destacar que as operadoras de planos de saúde argumentam que essa mudança trouxe insegurança jurídica e elevou expectativas dos consumidores, incluindo a cobertura de tratamentos sem comprovação científica robusta.

Outro fator relevante que contribuiu para o aumento das ações judiciais foi a decisão da ANS de eliminar o limite de sessões para terapias como psicologia e fonoaudiologia, o que gerou um aumento das demandas, especialmente em casos de crianças com transtornos do desenvolvimento. Além dessas mudanças regulatórias, o envelhecimento da população e o avanço das tecnologias médicas também impulsionam a judicialização nos últimos anos.

São registradas diariamente em órgão de defesa do consumidor e também em nosso escritório reclamações que atestam a piora na qualidade dos serviços prestados e as práticas abusivas das operadoras, como a recusa de cobertura e os reajustes excessivos.

A pandemia da Covid-19, sem dúvidas, foi responsável pela elevação das demandas reprimidas, mas há indícios de que a raiz do problema está em práticas inadequadas e na falta de transparência por parte das operadoras.

O aumento da judicialização preocupa o setor de saúde suplementar, que já enfrenta desafios de sustentabilidade financeira. Operadoras argumentam que a flexibilização das coberturas aumenta a incerteza jurídica, o que pode inviabilizar financeiramente suas operações. A saída de grandes seguradoras internacionais do Brasil é vista como um reflexo desses desafios.

Para tentar reverter essa curva ascendente, a ANS afirma que tem intensificado a fiscalização e adotado medidas para melhorar a regulação, com o objetivo de reduzir o número de ações judiciais. Uma dessas iniciativas é a Notificação de Intermediação Preliminar (NIP), que tem se mostrado eficaz na resolução de conflitos entre consumidores e operadoras.

No entanto, existe a necessidade de uma regulamentação mais detalhada, especialmente no caso dos planos coletivos, que representam a maior parte dos contratos de saúde suplementar.

O aumento das ações judiciais contra planos de saúde reflete uma combinação de fatores legais, regulatórios e de mercado. O desafio é encontrar um equilíbrio entre a garantia de direitos e a viabilidade econômica das operadoras. A colaboração entre reguladores, operadoras, consumidores e o Judiciário será essencial para resolver esses impasses e criar um sistema de saúde suplementar mais justo e eficiente.

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