O número de acidentados que precisam de atendimento médico apresentou aumento em Campo Grande no último fim de semana de março deste ano em relação aos dois meses anteriores. Com o cenário de pandemia em ascensão em Mato Grosso do Sul, a situação preocupa as autoridades quanto à falta de leitos e insumos para atender os pacientes que buscam atendimento médico.
Isso porque essas pessoas acabam disputando vagas com pacientes sequelados da Covid-19, que já estão curados do vírus, mas que precisam continuar internados para tratar os danos que a doença ocasiona.
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Atualmente, por causa da quantidade de casos de Covid-19, o único hospital de Campo Grande a receber pacientes pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que não estão com a doença é a Santa Casa.
Dados apresentados pelo hospital apontam que na semana anterior às medidas restritivas em Campo Grande, que determinaram o funcionamento apenas de atividades essenciais entres os dias 15 e 21 de março, 96 pacientes acidentados e que não estavam com a doença foram atendidos na unidade.
Já durante a semana de feriados, com as medidas de restrição, o hospital recebeu 64 pacientes vítimas de acidentes.
Mas o que se observa é que, apesar da queda de 33% nos atendimentos da última semana do mês de março, houve um aumento no número de atendimento a esses pacientes durante os fins de semana. Entre sábado (13/03) e domingo (14/03), foram atendidos 27 pacientes vítimas de acidentes.
O número cresceu na semana seguinte (20 e 21 de março), quando 30 pessoas precisaram de um leito na unidade. Já no último fim de semana, que compreende os dias 27 e 28 de março, 41 pacientes deram entrada na Santa Casa de Campo Grande, vítimas de acidentes de trânsito – que englobam atropelamentos, choques entre veículos ou objetos, quedas de bicicletas, motos ou veículos e capotamentos.
Segundo o secretário de Estado de Saúde, Geraldo Resende, o sistema não tem estrutura suficiente para atender além do público de pacientes com coronavírus, que já é grande.
“Essas pessoas [acidentados] não fazem o uso apenas dos leitos, mas também de outros espaços, como os para exames e centros cirúrgicos. Esses pacientes também precisam do próprio anestésico, por exemplo, que está em falta e que precisamos para atender os pacientes de Covid-19”, explica o secretário.
De acordo com a infectologista Mariana Croda, o sistema de saúde está saturado. “Muitos pacientes apresentam sequelas depois da doença, como acidente vascular cerebral [AVC] e infartos. Essas pessoas precisam de atendimento hospitalar. Não tem como ocuparmos leitos por nenhuma outra causa”.
SUPERLOTADO
De acordo com os dados apresentados pela assessoria da Santa Casa, ontem, a área vermelha do pronto-socorro tinha 16 pacientes, desses, quatro estavam em ventilação mecânica. Outros 34 pacientes estavam aguardando vaga na área verde.
“A situação está caótica. O pronto-socorro está acima da sua capacidade estabelecida, não temos mais macas nem local físico para colocar os pacientes. Está acabando a fonte de oxigênio. Daqui a pouco não temos mais espaço físico para entrar na porta do pronto-socorro. Está superlotado, as equipes estão se desdobrando ao máximo, estão cansadas, fatigadas, mas não para de chegar pacientes”, queixa-se o médico emergencista Rodrigo Quadros.
O médico afirma ainda que é possível que algumas pessoas fiquem desassistidas em razão da superlotação do hospital e que não tem mais recursos. “Estamos no máximo, no auge da nossa capacidade instalada”.
“Todos os hospitais estão sobrecarregados. Já vivíamos no limite antes da pandemia, agora a doença veio e chacoalhou tudo. Nós precisamos da ajuda de todo mundo. Estamos em uma situação de guerra. Vamos fazer de tudo pelas pessoas, mas provavelmente os recursos e as atenções que elas necessitarem não existirão de forma adequada”, completa Quadros.
Conforme o boletim epidemiológico divulgado ontem (7) pela Secretaria de Estado de Saúde (SES), Campo Grande registrou mais 293 novos casos de Covid-19. Em Campo Grande, 88 pessoas estão na fila de espera por leitos para tratar a doença, das quais 59 moram na Capital.
A ocupação de leitos clínicos para a Covid-19 era de 78% ontem na Capital, já para as outras enfermidades era de 70%. No caso das vagas em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) para a doença, a ocupação era de 100%. No caso das UTIs para outras doenças, a ocupação era de 92%.
“O nosso pedido é o mesmo de sempre. Não se aglomere. Muitos dos acidentes que acontecem é em razão do consumo de bebida alcoólica, que muitas vezes é feito com um grande número de pessoas. Pedimos para que a população nos ajude, siga as orientações das autoridades, isso enquanto não chega a vacina, que é o único remédio eficaz contra o vírus. Pedimos sempre para que mantenham o distanciamento e façam todos o uso de máscara”, apela Geraldo Resende.
NO LIMITE
No dia 31 de março, a Santa Casa divulgou uma nota informando a situação do hospital. “Estamos em um momento crítico para o atendimento aos pacientes graves que não são de Covid-19. Desde o fim de semana, aumentou o número de casos de pacientes vítimas de trânsito e agressões [baleados, principalmente]”.
Naquele dia, 13 pacientes aguardavam por vagas na UTI e outros seis estavam em salas do Centro Cirúrgico para serem atendidos, o que acabou “travando” as salas para outras cirurgias, até que os pacientes pudessem ser encaminhados para a CTI quando surgisse vaga.
No dia 1º de abril, o hospital publicou novo comunicado fazendo um apelo à população, pedindo para que os cuidados para prevenir acidentes domésticos e de trânsito fossem redobrados.
“Precisamos deixar os leitos para pacientes com doenças preexistentes ou que venham a sofrer intercorrências, como problemas cardiovasculares, neurológicos, respiratórios, entre outros”, publicou.
PREFEITO
Em entrevista ontem, o prefeito de Campo Grande, Marcos Trad (PSD), afirmou que as medidas de restrição decretadas na Capital, especialmente o toque de recolher, fizeram com que as internações por acidentes de trânsito diminuíssem.
“Se você for ao pronto-socorro, você vai ver quantos entravam de acidente que agora não entram. Então houve, sim, uma redução”, garantiu.
“As pessoas têm que entender que dentro de um lugar de UTI [Unidade de Terapia Intensiva] existem vários leitos e, nesses leitos, têm pessoas de causas naturais, que é um infarto, um AVC, um derrame, uma embolia pulmonar e a Covid-19, e essas causas nós não temos o controle. Há os acidentes de trânsito e as tentativas de homicídio, que nós podemos ter o controle regrando alguns horários”, disse.
Ainda segundo Trad, os acidentes e as tentativas de homicídio ocorrem com mais frequência no período da noite e de madrugada, sendo este um dos motivos do toque de recolher, que atualmente tem vigência das 21h às 5h na Capital.
O prefeito acrescentou que durante o dia também há a ocorrência de acidentes, mas estes costumam ser de menor impacto e sem necessidade de atendimento por socorristas do Corpo de Bombeiros ou Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, na maioria das vezes.
“Geralmente, quem bate o carro no período matutino e vespertino, o Juizado de Trânsito resolve. Já quem se acidenta entre 22h e 5h vai para um leito de UTI por causa de diversos outros motivos”. (Com Glaucea Vaccari e Naiara Camargo)


