Artigos e Opinião

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Os desafios diários enfrentados por quem atua na proteção da natureza têm se tornado uma enorme prova de resistência e fé. As condições climáticas extremas, impulsionadas pelas altas temperaturas, ameaçam nossas reservas com o fogo e penalizam a fauna e a flora – já impactadas pela reincidência de incêndios violentos desde 2020.

Percebo que a fauna enfrenta o pior processo de extinção desde o período em que conseguimos a vitória no controle da caça, do tráfico de animais silvestres e da pesca predatória na década de 1980. O cenário atual é de destruição de habitat natural, em que espécies estão sendo dizimadas de forma assustadora, especialmente répteis e insetos. As chamas estão tão intensas que, somadas aos ventos fortes, invadem todos os lugares: locas, copas das árvores, etc, persistindo por meses de forma impiedosa.

Não há dúvidas de que estamos perdendo essa batalha. Somente neste ano já ultrapassamos os 3 milhões de hectares queimados. Esse trágico número foi alcançado mesmo com o empenho de recursos financeiros nas ações de combate, que certamente superam R$ 1 bilhão – entre os investimentos dos governos federal e estadual.

Nunca tivemos – em um histórico de 40 anos – uma infraestrutura de combate tão ampla, incluindo recursos humanos, equipamentos de logística, helicópteros, caminhões e embarcações. É importante destacar o trabalho pioneiro da Famasul, que contabiliza os prejuízos na produção das fazendas no Pantanal, já ultrapassando R$ 50 milhões.

Como podemos ser mais eficientes se nossa capacidade financeira já extrapola seus limites dos desafios e a força humana se mostra insuficiente, em algumas situações até incapaz? Estamos enfrentando algo sem precedentes e que excede nossa capacidade de resposta.

Não devemos nos omitir na identificação dos responsáveis. Eles existem, embora sejam poucos. Ainda assim, acredito que não haverá melhoras significativas na questão comportamental apenas com multas milionárias e possíveis prisões. 

A experiência de outros países, como Portugal e Austrália, nos indica que o ímpeto punitivo não traz uma solução completa. Esses países já lidam com incêndios gigantescos e perdas de vidas humanas em virtude deles há mais de 20 anos.

O mais impressionante – e certamente mais doloroso que as próprias chamas – são as acusações equivocadas e a ignorância de alguns que associam o crescimento dos incêndios às reservas de proteção. Ao contrário, as poucas áreas protegidas no Pantanal (menos de 5%) têm estruturas para evitar incêndios e ações preventivas em seus planos de trabalho, como a presença de brigadas.

Podemos reduzir a escalada dos incêndios ano após ano se implementarmos outras estratégias que não se restrinjam ao combate ao fogo, mas que incluam 
a prevenção. Devemos reconhecer que nossos planos atuais não estão trazendo os resultados esperados e que não será somente o aumento dos investimentos financeiros que nos trará a solução.

O ponto crítico é como um dos biomas mais preservados (cerca de 85%) passou a ser um grande emissor de gás carbônico no País. Os fenômenos naturais são impactados negativamente pelas condições climáticas extremas. Essa situação ameaça nosso bioma e exige novas estratégias que unam ciência e competência para enfrentar esses fenômenos sem precedentes.

Restaurar ao proprietário formas de manejo do fogo pode ser uma alternativa. Eles podem ajudar. Ao mesmo tempo, com mais tecnologia e grupos de ação de combate ao fogo, equipados com boa logística e equipamentos adequados, podemos reduzir o tempo de resposta. Não podemos desistir e precisamos ter fé e resistência para rever nossa relação com o planeta.

Poderíamos, em um gesto responsável, olhar e fazer algo pela nascente do Rio Paraguai. Não sou pessimista, mas talvez apenas a desesperança e o senso de urgência possam nos salvar.

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Editorial

Justiça fiscal e o combate à sonegação

Existem mecanismos para combater a sonegação. Um deles está parado na Assembleia Legislativa: o projeto de lei para combater os devedores contumazes

11/04/2025 07h15

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Nesta edição, revelamos um dado que deve acender um alerta nas instituições públicas e na sociedade civil: levantamento da Federação Nacional dos Auditores Fiscais (Fenafisco) mostra que a dívida das empresas com o Fisco em Mato Grosso do Sul já ultrapassa os R$ 15 bilhões. Esse valor, que representa um rombo nos cofres públicos, revela um problema crônico e grave: a inadimplência tributária – ou, em muitos casos, a sonegação de impostos.

O não pagamento de tributos, especialmente em larga escala, como mostra o levantamento, é um dos maiores motores de injustiça tributária e social. Enquanto a maioria dos cidadãos e empresas cumpre com suas obrigações, uma minoria dribla o sistema, desequilibrando a concorrência e prejudicando toda a sociedade. Afinal, os recursos que faltam na saúde, na educação e na infraestrutura poderiam, em parte, estar disponíveis se essa dívida fosse quitada.

O imposto, como o nome sugere, não é facultativo. Ele é imposto a todos – pessoas físicas e jurídicas – como uma obrigação para a manutenção do Estado. A maioria paga. É justo, portanto, que todos o façam. E mais justo ainda que o Estado aja para cobrar de quem não cumpre essa regra básica de convivência social.

Dificilmente, aliás, essas empresas repassam a “economia” gerada pela sonegação de impostos aos consumidores. Muito pelo contrário: além de darem mau exemplo, lucram em cima de uma prática que penaliza os que cumprem a lei. O principal imposto estadual envolvido nesses casos é o ICMS, que, em tese, deveria ser recolhido e repassado aos cofres públicos, mas muitas vezes fica pelo caminho.

Existem mecanismos legais para combater esse tipo de prática. Um deles está, neste momento, parado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul: trata-se do projeto de lei enviado pelo governo do Estado para estabelecer regras mais rígidas contra os chamados devedores contumazes – aqueles que fazem da inadimplência um modelo de negócio. Por que tamanha demora em aprovar um projeto que visa proteger os bons pagadores e garantir mais justiça fiscal?

Combater a sonegação exige integridade, vontade política e coragem para enfrentar interesses poderosos. É um passo essencial para tornar o sistema tributário mais justo, eficiente e, acima de tudo, mais equilibrado. A sociedade sul-mato-grossense merece essa resposta.

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ARTIGOS

Como o "Liberty Day" de Trump afeta o Brasil

09/04/2025 07h45

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Cabe contextualizar o problema, para que se possa entender o quadro geral e seus desdobramentos no Brasil e no mundo. O presidente Donald Trump apresentou um plano de tarifas comerciais que seguramente é o mais abrangente desde os acordos de Bretton Woods (1944), que definiram as bases para o comércio internacional, que mais tarde criaria o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (Gatt), de 1947, atual Organização Mundial do Comércio (OMC), de 1995.

A proposta do presidente americano, batizada de “Liberty Day” (Dia da Liberdade), representa uma ruptura com a ordem mundial e no sistema multilateral de comércio que vem sendo promovido desde 1947 com o Gatt, atual OMC, que garante acordos e regras debatidas e negociadas entre os países antes de serem implementadas. O mundo como um todo será impactado. Alguns países estão mais expostos, outros menos.

Os EUA passarão a retaliar tarifas caso a caso, com base nas tarifas que cada país cobra dos produtos americanos. O conceito de tarifa recíproca parte do princípio de equiparar as alíquotas de impostos. Por exemplo, se o país (A) cobra tarifa de 25% sobre um produto americano, os EUA aplicarão os mesmos 25% sobre o produto equivalente vindo do país (A). Essa medida ignora os aspectos técnicos do comércio internacional e rompe com compromissos firmados em acordos multilaterais.

Acredita-se que estamos observando o início de uma guerra comercial com desdobramentos de difícil previsibilidade. Segundo a Boomberg Economics, as medidas podem aumentar os preços nos EUA em 2,5% em um horizonte de três anos. Mais inflação nos EUA tem reflexos no Brasil pela via financeira. Para a Câmara de Comércio Americana e para a União Europeia, um conflito comercial pode colocar em risco US$ 9,5 trilhões no fluxo de comércio, afetando todas as cadeias de produtos e serviços.

Acredita-se que o impacto sobre o comércio brasileiro seja relativamente limitado no curto prazo, visto que o Brasil exporta para os EUA bens intermediários e combustíveis. Nas importações, o Brasil depende dos EUA para os segmentos de motores, máquinas, aeronaves e combustíveis. Isso não significa que o risco esteja descartado para outros setores. O Brasil cobra, em média, 11,3% sobre produtos importados dos EUA (dados de 2022), enquanto os EUA cobram, em média, 2,2% dos produtos brasileiros. Pelo conceito de tarifa recíproca, os produtos brasileiros exportados para os EUA serão taxados.

O pacote de tarifas tem potencial para aumentar a insegurança global, elevar a inflação nos EUA, podendo forçar o Federal Reserve Board (FED) a manter a taxa de juros alta por mais tempo. Isso pode pressionar a moeda brasileira, encarecer o crédito e, como desdobramento, diminuir o espaço do Banco Central para corte na taxa de juros (Selic).

Dessa forma, sem considerar todos os impactos diretos nas exportações, o Brasil seria afetado diretamente com o encarecimento do financiamento externo, a desvalorização cambial, o aumento da inflação (IPCA) e mais tempo com juros no patamar de dois dígitos, o que encarece a rolagem do estoque da dívida pública, que já é elevada e tem provocado fortes debates no mercado sobre capacidade de pagamento do governo federal, sem que sejam promovidas reformas estruturais na economia. Existe risco de uma recessão global? Sim. Vamos acompanhar os desdobramentos e possíveis mudanças de rota.

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