Artigos e Opinião

OPINIÃO

Confira o editorial de sábado: "ANTT, a serviço de quem?"

Confira o editorial de sábado: "ANTT, a serviço de quem?"

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Nesta semana, o usuário da rodovia BR-163 foi surpreendido por uma revoltante notícia. Mesmo sem ter cumprido nem um terço das metas de duplicação da BR-163, previstas na concessão da rodovia, a CCR MSVia – que explora a via – foi autorizada a aumentar o valor das tarifas de pedágio em quatro praças de cobranças.

O reajuste representa um aumento de R$ 0,10 para carros de passeio e pode chegar a R$ 0,60 para caminhões com seis eixos, como mostrou reportagem do Correio do Estado de sexta-feira (14). A medida vai contra a previsão inicial, que era de queda no preço da tarifa, como punição pelo não cumprimento das metas previstas em contrato, o que levanta sérios questionamentos sobre a eficiência da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

Agências reguladoras, que eram para ser técnicas, tornaram-se políticas, trabalhando em prol das empresas, não do cidadão. Depois da decisão contraditória da Agência Nacional de Saúde (ANS), que beneficiava descaradamente Planos de Saúde, derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ferir os direitos do consumidor – e com justo puxão de orelha da então presidente Cármen Lúcia –, foi a vez de a ANTT subir o preço do pedágio de uma rodovia cujas melhorias estão longe do que foi contratado.

A justificativa chama ainda mais a atenção: o reajuste só não foi maior, de 4,43%, como forma de punição à empresa. Não era para ter reajuste algum. Pelo contrário. Se a empresa não cumpriu o previsto no contrato que a rendeu o direito de explorar a rodovia, não era nem para ser cobrado pedágio. Os usuários estão pagando caro por um serviço que não existe, e a empresa, diante de uma agência reguladora fraca, só tende a lucrar.

A justificativa da CCR por não duplicar a rodovia é ainda mais grave. A empresa alega não ter tido acesso a uma linha de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para realizar as obras das quais se comprometeu, diante concorrência pública, a cumprir. Quantas pequenas e médias empresas fecharam as portas durante a recessão, sem a ajuda do BNDES? Empresários sonham em participar de concorrências ou até mesmo fechar negócios com um dinheiro que ainda nem veio.

Se o grupo não teve acesso a uma linha de financiamento, não é problema do usuário da rodovia, que não deve pagar caro por usar uma rodovia não duplicada – desde que a CCR assumiu a via, a tarifa teve reajuste de 19%. Tanto que relatório da própria empresa mostrou que, por aqui, a arrecadação vai bem.

Mesmo diante de uma das mais graves crises econômicas do País, a companhia registrou aumento da receita com a BR-163 – como mostrou outra reportagem do Correio do Estado. A MS Via, subsidiária da CCR, foi a única a registrar crescimento da receita no segundo semestre, resultado obtido graças à produção de grãos no Estado, com faturamento de R$ 64,4 milhões, 8% a mais do que no mesmo período de 2017.

Esse resultado positivo se mantém quando analisado todo o primeiro semestre. De janeiro a julho, a receita fechou em R$ 136,2 milhões, 9,8% a mais que em comparação ao ano passado. Números que contrastam diretamente com as dificuldades financeiras alegadas pela empresa para prosseguir com as obras de duplicação da via.

Mas a situação ainda pode piorar se a ANTT não tiver pulso firme. A empresa ingressou com ação na Justiça para deixar a concessão sem pagar multa pelo descumprimento do contrato. Depois de longo tempo explorando uma das principais rotas de escoamento da produção de grãos de Mato Grosso do Sul, investindo o mínimo possível em melhorias, no primeiro sinal de cobrança – a ANTT desde maio aplica multa diária na empresa por descumprimento do prazo e deveria ter baixado o preço das praças –, a empresa pretende abandonar a rodovia.

Mais um esqueleto de elefante branco que fica na conta da infraestrutura do Brasil por causa de controle das agências reguladoras. 

 

EDITORIAL

As bolhas que nos afastam da realidade

Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis

17/12/2025 07h15

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A expressão “estar em uma bolha” deixou de ser apenas uma gíria de internet para se transformar em um retrato cada vez mais fiel da forma como a sociedade vem se organizando. Nas redes sociais, algoritmos direcionam conteúdos, opiniões e notícias de acordo com preferências previamente identificadas.

O resultado é um ambiente confortável em que quase tudo confirma aquilo que o indivíduo já pensa. Divergir passa a ser exceção e confrontar ideias, um incômodo evitado.

Fora do ambiente digital, a lógica das bolhas também se impõe. O isolamento crescente em condomínios fechados, verticais ou horizontais, reduz o contato cotidiano com o diferente. Ao limitar o convívio, o indivíduo perde a oportunidade de compreender realidades distintas da sua própria.

Torna-se, ao mesmo tempo, mais desconfiado e mais desinformado, conhecendo o mundo mais pelo “ouvir dizer” do que pela experiência direta. A realidade passa a ser filtrada, editada e, muitas vezes, distorcida.

As bolhas criam falsas impressões. Quando se consolidam em grupos, reforçadas pelo sentimento de pertencimento, geram uma perigosa falta de sintonia com o restante da sociedade. Problemas coletivos passam a ser relativizados, minimizados ou simplesmente ignorados.

A empatia dá lugar à autoproteção e o interesse público acaba substituído pela preservação de privilégios.

Nesta edição, mostramos um exemplo concreto dessa desconexão: o aumento do duodécimo para quase todas as instituições de Mato Grosso do Sul, mesmo após um ano marcado por crise financeira, enquanto cresce a sobrecarga sobre o Poder Executivo.

É sobre ele que recai, de forma quase exclusiva, o peso de enfrentar as dores reais da sociedade: da falta de recursos para serviços essenciais às demandas crescentes por saúde, educação, transporte e assistência social.

Essa discrepância orçamentária não é apenas um dado técnico. Ela reforça as bolhas institucionais. Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis.

Trata-se de um desequilíbrio que aprofunda a sensação de injustiça e distancia ainda mais as instituições da realidade vivida pela população.

Seria desejável que integrantes das instituições que recebem repasses de duodécimo saíssem de suas bolhas. Que vivessem mais intensamente a realidade fora de gabinetes, relatórios e planilhas.

Que entendessem que, em tempos de dificuldades financeiras, reforçar privilégios e ampliar confortos institucionais não é apenas insensível, é socialmente injusto.

Romper bolhas não é simples, mas é necessário. Para indivíduos, para grupos e, sobretudo, para instituições públicas. A democracia e a justiça social exigem mais contato com a realidade concreta e menos acomodação em mundos protegidos. Caso contrário, seguiremos administrando percepções, e não problemas reais.

ARTIGOS

A Interpol e as lições do roubo ao Louvre: quando a cultura exige proteção global

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural

16/12/2025 07h45

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A Interpol é amplamente reconhecida por seus sistemas de avisos e pela atuação no combate ao crime organizado transnacional.

O recente episódio envolvendo o Louvre, porém, recoloca em evidência um ponto ainda subestimado no debate público: crimes não violentos, como o roubo de bens culturais, também demandam tutela internacional qualificada.

O tráfico de obras de arte e de patrimônio histórico segue sendo um delito de baixo risco e alto lucro, alimentado pela opacidade do mercado e pela fragmentação das respostas estatais.

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural. A Interpol parte dessa premissa, ao reconhecer a cultura como interesse jurídico protegido, merecedor da mesma atenção dedicada à vida, à segurança e à integridade física.

Nesse contexto, o Banco de Dados de Obras de Arte Roubadas da organização cumpre papel central: dar rastreabilidade a um mercado em que o patrimônio cultural pode, com facilidade, converter-se em saque.

A existência do banco de dados não é apenas simbólica. Ela permite a identificação de peças subtraídas, inibe a circulação ilícita e oferece suporte técnico às investigações nacionais.

Ainda assim, a eficácia do sistema depende de algo que nem sempre acompanha a velocidade do crime: cooperação internacional efetiva e compartilhamento ágil de informações entre agências de aplicação da lei.

Há espaço evidente para aprimoramentos. A ampliação do banco de dados com atualizações em tempo real, a integração mais ampla de museus, casas de leilão e colecionadores privados, além de protocolos obrigatórios de verificação de procedência, fortaleceriam significativamente o combate ao tráfico ilícito.

Do mesmo modo, penalidades mais rigorosas e treinamento especializado para forças policiais e autoridades alfandegárias são medidas indispensáveis para reduzir a atratividade econômica desse tipo de crime.

O episódio do Louvre serve como alerta. Proteger bens culturais não é capricho elitista nem pauta secundária: é defesa da memória, da identidade e do patrimônio comum da humanidade.

Quando uma obra é roubada, perde-se mais do que um objeto, perde-se um fragmento da história coletiva. A resposta, portanto, precisa ser global, coordenada e à altura desse valor.

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