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O censo demográfico e a educação brasileira

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Dados recentemente divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) são da maior importância para o Brasil e para o seu futuro e, no entanto, de modo geral, a relação entre crescimento demográfico e educação não é um tema que preocupe a comunidade acadêmica. Estou na universidade pública brasileira há 36 anos e nunca presenciei interesse sobre esse dado da realidade nacional.

A população brasileira, em 2022, segundo o IBGE, chegou a 203,1 milhões, com aumento de 6,5% frente ao Censo anterior (2010), o que representa acréscimo de 12,3 milhões de pessoas no período. De 2010 a 2022, a taxa de crescimento anual da nossa população foi de 0,5%, a menor desde o primeiro Censo do Brasil (1872).

Nos 150 anos que separam a primeira operação censitária da última, o Brasil aumentou a sua população em mais de 20 vezes: ao todo, um acréscimo de 193,1 milhões de habitantes. O maior crescimento, em números absolutos, foi registrado entre as décadas de 1970 e 1980, quando houve adição de 27,8 milhões de pessoas. Contudo, a série histórica mostra que a média anual de crescimento vem diminuindo desde a década de 1960.

“Em 2022, a taxa de crescimento anual foi reduzida para menos da metade do que era em 2010”, segundo o coordenador técnico do Censo, Luciano Duarte.

Esses dados, que afetam todas as esferas da vida em sociedade, são também emblemáticos da impressionante revolução silenciosa que o Brasil viveu desde a década de 1960, isto é, a concentração urbana em grandes cidades contrastando com cerca de 44% dos municípios com até 10 mil habitantes, aproximadamente 12,7 milhões de pessoas.

Outro dado decorrente dessa configuração espacial é a queda na média de moradores por domicílio: em 2010, era de 3,31, contrastando com 2,7 em 2022. Hoje, as famílias são bem menores, e os grandes centros urbanos estão abarrotados de automóveis.

O ingresso da mulher brasileira no mercado de trabalho ao lado da mudança radical que a revolução tecnológica vem operando no padrão das relações humanas também explicam a queda demográfica que o Brasil vem vivendo, o que afeta não apenas as expectativas, mas também as políticas de Estado.

Com relação às expectativas, o Censo mostra friamente que o nosso país continental poderá encolher e envelhecer antes de solucionar problemas estruturais. Contudo, sabemos que um país deve enriquecer antes de envelhecer. No nosso caso, estamos completando 40 anos da conquista da democracia (1985) ao lado da permanência de problemas estruturais que se arrastam. 

Esse panorama, acrescido da pandemia da Covid-19, vem mudando drasticamente a vida universitária, que, além de ser caudatária dessa nova realidade, vem mantendo problemas congênitos que, incrivelmente, não mereceram a devida atenção de seus Poderes constituídos, e entre os quais a evasão ocupa lugar central.

O problema se arrasta há anos sem que a própria universidade lhe dê a devida importância. Naturalizou-se o fato de que, nos cursos para formação de professores, nas áreas de Física, Química e Matemática, ingressam 50 e formam-se menos de 10.

Enquanto isso, dados do Inep mostram que, em 2022, apenas 60% dos professores que atuavam no Ensino Fundamental e no Ensino Médio tinham formação adequada, fato que evidencia o divórcio entre a necessidade de docentes para a escola básica e a quantidade formada anualmente nas universidades federais. A desconexão é impressionante. E, em 2024, a greve que durou três meses está gerando evasão maior ainda.

A vida sombria que vem marcando o ambiente acadêmico contrasta com as políticas de expansão implementadas nas últimas décadas. Entre 2005 e 2016, foram instituídas 422 unidades federais de Ensino Médio, e o governo atual já anunciou outras 100. As universidades federais são cerca de 70. Ao lado disso, o paradoxo é que o Ensino Médio vem se configurando como o grau com maior taxa de evasão da educação brasileira.

Depois da expansão física e das políticas de inclusão praticadas pelos governos Lula e Dilma, o cenário de salas de aulas vazias e prédios inabitados deveria ser o centro das preocupações de reitorias e direções dos institutos, pois, se por um lado foram atendidos pedidos de expansão, por outro, a evasão põe em risco a existência das universidades e dos institutos federais.

Menos nascimentos, menos jovens, menos ingressos na universidade. Deixaremos de ser “um país de jovens”, dado que sempre orgulhou o Brasil. Estamos em transição para sermos outra coisa, e, enquanto isso, não se sabe se por alienação ou por oportunismo político, continuam brotando reivindicações para a criação de mais universidades e institutos federais.
 

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EDITORIAL

O sistema de transporte faliu?

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem e devem agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público

15/12/2025 07h15

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A crise do transporte coletivo em Campo Grande chegou a um ponto que ultrapassa o desconforto cotidiano do usuário e passa a provocar perplexidade institucional. Um serviço essencial, que garante o direito de ir e vir, simplesmente ameaça parar, enquanto parte das instituições que deveriam atuar na defesa do interesse público assiste a tudo à distância, como se o problema fosse apenas administrativo ou financeiro.

O transporte público não é um favor concedido por concessionários nem um serviço opcional do poder público. Trata-se de uma obrigação legal e constitucional, que deve ser prestada de forma contínua, adequada e eficiente.

Ainda assim, a combinação de atrasos no pagamento de subsídios por parte do Município e crises financeiras alegadas pela concessionária – que, diga-se, precisa ser muito mais transparente sobre sua real situação – resultou na convocação de uma paralisação marcada para hoje.

Esperamos, sinceramente, que ela não ocorra. Mas o simples fato de ser cogitada já é um sinal grave de falência do modelo atual.

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem – e devem – agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público. O silêncio do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública causa estranheza.

Estamos falando de um serviço que afeta diretamente milhares de trabalhadores, estudantes, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Não há como tratar esse impasse apenas como um conflito contratual entre prefeitura e concessionária.

Essas instituições existem justamente para atuar quando direitos coletivos são ameaçados. Têm instrumentos legais para exigir informações, fiscalizar contratos, mediar soluções e, se necessário, responsabilizar gestores e empresas.

A crise do transporte público é um típico caso em que a atuação preventiva e firme poderia evitar danos maiores à população.

Esperamos, portanto, uma atuação urgente dessas instituições na mediação do impasse, antes que a cidade seja penalizada com a interrupção de um serviço vital. E, se o conflito acabar inevitavelmente judicializado, que o Judiciário aja como deve agir: com celeridade, sensibilidade social e foco no interesse público, e não apenas na letra fria dos contratos.

Afinal, quando um sistema essencial entra em colapso e as instituições se omitem, a pergunta deixa de ser retórica e passa a ser inevitável: o sistema de transporte público faliu ou falharam as instituições que deveriam garantir o seu funcionamento? Instituições existem para funcionar – e precisam fazê-lo de fato, especialmente quando a cidade mais precisa.

ARTIGOS

Às portas do Judiciário - contratos bancários fraudulentos

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais

13/12/2025 07h45

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Após as fraudes praticadas contra aposentados, pensionistas e beneficiários do INSS terem vindo à tona, cresceu enormemente o número de demandas judiciais que visam ao cancelamento de contratos de empréstimos, principalmente os realizados de forma virtual.

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais, gerando contratos nulos por natureza, os quais acabam sendo invalidados judicialmente.

Tratando-se de situações que envolvem idosos, os atos abusivos praticados pelos bancos provocam, por força do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003), maior reprimenda judicial, sendo passível de apuração não só no âmbito cível, como também no criminal, tendo em vista a proteção especial em razão da vulnerabilidade presumida.

Contudo, embora a regra seja clara, temos nos deparado com situações em que vítimas de fraudes têm sofrido não só com os descontos promovidos a título de parcelas mensais não contratadas, como de serviços não autorizados, que torna indigno o valor líquido das aposentadorias, benefícios ou pensões a receber.

Em boa hora, felizmente, o Judiciário tem determinado o cancelamento desses contratos, condenando as instituições que assim atuam não só à restituição dos valores ilegalmente descontados, mas ao pagamento da devida indenização por danos morais, decorrente da lesão causada aos direitos de personalidade, amplamente consagrados na Constituição Federal.

O que atordoa é o percurso que a vítima dessas situações percorre até o momento em que se livra de vez do infortúnio das cobranças.

É que, embora seja cabível, juridicamente, um pedido antecipado de decisão que suspenda os descontos que vão incidindo sobre o já tão comprometido valor a receber, nem sempre esse pleito é concedido ou o é de forma tardia, o que vai pondo a vítima dessas fraudes em situação financeira mais delicada.

O ideal seria que a regra fosse no sentido de se determinar judicialmente a suspensão imediata dos descontos ilegais, já que a parte mais vulnerável (que é sempre o consumidor) não dispõe de meios econômicos para reverter uma situação de miserabilidade a que pode chegar, diferentemente dos afortunados bancos.

No entanto, para que as tutelas judiciais provisórias sejam concedidas, exige-se o preenchimento de requisitos legais mínimos, previstos na Lei Processual Civil, quais sejam: probabilidade do direito; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo; e reversibilidade dos efeitos da decisão.

Nos casos em que o banco não comprova a pactuação por contrato firmado ou quando a suposta contratação se deu de forma virtual, mas não se comprovou idoneidade da assinatura eletrônica, deve o negócio ser cancelado.

Caso haja comprovação de má-fé por parte do banco, impõe-se a restituição dos valores descontados em dobro. Não se comprovando, entretanto, o que é mais incomum, deve o valor ser restituído na modalidade simples, o que significa devolver somente o valor cobrado.

Para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, entretanto, não se exige nessas situações, por exemplo, que tenha havido negativação do nome da vítima nos serviços de proteção ao crédito, mas a própria má-fé já valida a condenação nesse sentido.

Ainda é árdua a luta dos que sofrem com esses abusos, todavia, a Defensoria Pública é uma forte aliada do consumidor, especialmente os mais vulneráveis.

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