Em 2024, o ministro Luiz Fux já deu parecer favorável, suspendendo pontos pedidos, mas o julgamento final foi paralisado por um pedido de vista de Flávio Dino
Uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) ingressada no ano passado por Mato Grosso do Sul e outros seis estados no Supremo Tribunal Federal (STF) tenta flexibilizar a Lei Federal nº 14.790, de 29 de dezembro de 2023, conhecida como Lei das Bets, que regulamentou a jogatina on-line no País. O processo teve parecer favorável do ministro do STF Luiz Fux, mas o julgamento em plenário está paralisado desde 2024 – e tudo isso em meio à licitação polêmica da Loteria Estadual de Mato Grosso do Sul (Lotesul).
No pedido feito por Mato Grosso do Sul, por São Paulo, pelo Rio de Janeiro, por Minas Gerais, pelo Paraná, pelo Acre e pelo Distrito Federal, os estados pedem que dois pontos sejam modificados da lei. O primeiro é referente à proibição de que um mesmo grupo econômico vença mais de uma licitação de loterias estaduais.
De acordo com os estados, essa restrição reduz a participação de empresas em licitações e favorece um ambiente de competição entre os estados, em que uns tendem a perder mais que outros.
“As restrições inconstitucionais impostas pelos parágrafos 2º e 4º do artigo 35-A da Lei Federal nº 13.756, de 2018, na redação dada pela Lei Federal nº 14.790, de 2023, impactam diretamente o projeto de delegação à iniciativa privada dos serviços públicos lotéricos dos estados e do Distrito Federal, uma vez que reduzem o número de potenciais licitantes àqueles que ainda não celebraram contratos para prestação de serviços lotéricos com outros estados ou com o DF. Tal redução representa evidente prejuízo à ampla competitividade da licitação”, alegam.
Eles também alegam que a medida “favorece um ambiente de competição predatória entre os estados e o DF, com o objetivo de disputar, entre si, as empresas com maior qualificação técnica e econômica para que participem de suas respectivas licitações”.
Ainda, “pode inviabilizar que os estados e o DF deleguem o serviço à iniciativa privada, os obrigando à exploração direta, em especial no que se refere à modalidade lotérica denominada aposta de quota fixa”.
O outro ponto abordado no pedido é referente à publicidade das loterias estaduais, que pela lei estaria restrita ao perímetro da unidade da Federação. Na visão dos estados, isso prejudica as unidades menores e a livre concorrência entre eles.
“A previsão viola a livre concorrência que deve imperar na prestação do serviço. Qualquer particular que detenha o direito de explorar o serviço (mediante concessão, permissão ou autorização) deve poder explorá-lo em igualdade de condições, podendo se utilizar do arsenal mercadológico existente para atrair potenciais usuários”, diz trecho do pedido dos estados, realizado em maio do ano passado.
Em outubro do mesmo ano, Fux concedeu decisão liminar que suspendeu os pontos solicitados pelos estados.
Porém, no mês seguinte, o ministro Flávio Dino interrompeu o julgamento no plenário do STF com um pedido de vista, e a confirmação da suspensão segue aguardando retomada.
Com isso, a decisão de Fux segue como sendo o entendimento da Corte. O ministro considerou que os pontos seriam inconstitucionais. “À luz da ideia de federalismo fiscal, não pode a União impor obstáculos ao pleno exercício de competências arrecadatórias dos estados, sobretudo à míngua de qualquer justificativa razoável, como no caso concreto”, afirma trecho da decisão de Fux.
“Entendo inconstitucional a vedação constante do parágrafo 4º do art. 35-A da Lei nº 13.756/2018, relativa à realização de publicidade dos serviços lotéricos estaduais além dos limites dos estados titulares. Isso porque a referida restrição retira dos estados, sem nenhuma justificativa razoável, a possibilidade de adotar estratégias publicitárias que melhor se adequem ao seu planejamento de negócio (e ao planejamento de negócio de suas concessionárias)”, complementou o ministro.
Em outro trecho, Fux disse que a restrição de que grupos econômicos comandem mais de uma loteria estadual “não encontra amparo na Constituição, seja porque não se encontra prevista no art. 175 da CF [Constituição Federal], seja porque acaba por impor aos estados de menor população a celebração de contratos de concessão com empresas tendencialmente menos qualificadas, violando claramente o pacto federativo”.
Antes do pedido de vista de Dino, apenas o relator da matéria, o ministro Luiz Fux, havia apresentado seu voto, o qual manteve os fundamentos descritos acima e proferidos na liminar. Ainda não há data prevista para que a pauta volte ao plenário do STF.
LICITAÇÃO
Em fevereiro, o governo de Mato Grosso do Sul lançou a licitação para encontrar empresa que comandará a Lotesul. O certame foi questionado por várias empresas, as quais alegaram que o edital seria tendencioso e que estaria favorecendo uma só empresa.
Foram dois pedidos de impugnação do edital e um de explicações. O pregão eletrônico estava marcado para ocorrer no dia 17 de março, porém, foi suspenso pouco tempo depois de ter sido iniciado, para atender a um “pedido de esclarecimento apresentado pelo sr. Rafael Willian de Melo, recebido em 15 de março”, como disse o texto do pregoeiro Bruno Pereira Coelho.
No momento em que o certame foi suspenso, três propostas haviam sido apresentadas. Entretanto, as empresas não foram qualificadas.
“FAVORITA”
A medida que foi aprovada por Fux facilita a participação de empresas que já comandam outras loterias estaduais no Brasil, como é o caso da Pay Brokers, empresa do Paraná que é a responsável pela loteria daquele estado e que, segundo fontes do Correio do Estado, seria a “favorita” para vencer também em Mato Grosso do Sul.
No Paraná, como mostrou reportagem do Correio do Estado, o edital de licitação chegou a ser questionado por técnicos do Tribunal de Contas paranaense, por direcionamento no certame e por falta de competitividade. O concelheiro responsável pela análise do relatório, contudo, manteve a validade da licitação.
No Estado, também houve denúncia sobre o edital da Lotesul ao Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE-MS). Porém, o caso ainda não foi julgado.
Saiba
Entre os pedidos de impugnação do edital da Lotesul está o de Jamil Name Filho, o Jamilzinho, que está preso na Penitenciária Federal de Mossoró (RN) cumprindo pena de 69 anos de prisão.
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